domingo, 21 de agosto de 2016

LUANDA: Kennedy e as Vozes da Diferença no MPLA: O que é que Podemos Fazer por Angola?

Kennedy e as vozes da diferença no MPLA: O que é que podemos fazer por Angola?

  • Kennedy e as vozes da diferença no MPLA: O que é que podemos fazer por Angola?

O que é que podem fazer pelo MPLA? A esta pergunta, extrapolada do célebre desafio lançado aos americanos por John F. Kennedy, muitos angolanos anónimos, há mais de 60 anos, responderam “com sangue, suor e lágrimas”, entregando-se, desinteressadamente, à nobre causa que nos conduziu à Independência. 
Fonte: NJ/Gustavo Costa
Ao longo dos 40 anos que se seguiram à gesta de 11 de Novembro de 1975, inscreveram-se na História do MPLA, estórias que, ao serem este ano comemorados os 60 anos da sua existência, não podem deixar de ser assinaladas como marcos de referência na sua atribulada coabitação com o direito à diferença e à indignação ou à rejeição do conformismo ou de um cínico e falso unanimismo.   
Entre as várias histórias, há uma, já lá vão mais de 30 anos, que acabada em morte trágica, a maioria dos delegados ao congresso do MPLA, dela provavelmente nunca ouviu falar.   
Dela, mesmo entre gente mais velha, já pouca gente se lembra. Dela, foi protagonista Carlos Rocha “Dilolwa”, a quem, num assomo de delírio revolucionário, Agostinho Neto atribuíra qualidades e experiência técnicas que não possuía, chegando a qualificá-lo, a 21 de Maio de 1977, no Pavilhão da Cidadela Desportiva, como um dos grandes economistas de África...  
Nela, “Dilolwa” surge a opor-se à nomeação do então cunhado de Agostinho Neto, Jorge Morais, “Monty”, para o cargo de Ministro dos Petróleos. 
Convidado a repensar na sua discordância, “Dilolwa” manteve-se fiel à sua “tese” mas, não resistindo à aversão visceral encarnada por Agostinho Neto a qualquer tipo de contestação à sua liderança, acabou por abandonar a reunião. 
Não se lhe caindo nem o Carmo, nem a Trindade, “o Diamantino”, como era conhecido em criança, continuou a fazer a sua vida, dando aulas na Universidade Agostinho Neto e trabalhando na ENSA, até ao dia em que o desencanto, e outras frustrações pelo meio, o conduziriam, no Bairro do Alvalade, ao suicídio...   
Em 2013, noutra estória, Lopo do Nascimento - o homem que, antes de ser o empresário que hoje é, num comício, em 1976, no Porto de Luanda, mandara “partir os dentes da pequena-burguesia” –  decidiu reformar-se da vida política. 
Dizendo sempre o que pensava pela própria cabeça, abandonou a arena política pelos seus próprios pés, depois de reconhecer que era incompatível ser simultaneamente político e homem de negócios.  
Vergado ao peso do tempo, concluiu ter então chegado o momento de dar espaço e voz a uma mudança geracional na liderança política do país. 
Há uma semana, num estrondoso, mas eloquente e sustentado protesto, nascia uma nova estória, cujas sementes Ambrósio Lukoki, seu artífice, lançara à terra há já algum tempo, em diversas reuniões cimeiras do MPLA. 
Figuras com percursos diferentes – se “Dilolwa” e Lukoki pertencem à legião dos “maquisards” com passagem pelas antigas RDA e Jugoslávia, já Lopo do Nascimento palmilhou o pedregoso caminho da luta clandestina – há, porém, na estória de cada um destes três homens, um denominador comum: foram vozes que, em circunstâncias diferentes e por diferentes motivações, clamaram sempre, neste nosso deserto de ideias, por convicções, que se opuseram a que a política tratasse os cidadãos como uma “manada” de idiotas. 
Perante “uma geração de políticos que perdeu a visão do destino comum”, como alerta o Padre Pio, não espanta que agora tenha chegado o momento de Ambrósio Lukoki, cansado de habitar a liderança de um partido mergulhado “no bailado de egos”, também dar o seu murro na mesa! 
Porquê? 
Porque os “Lukokis” não se revêem num partido que, tendo feito as pazes com os seus antigos adversários – UNITA e FNLA – estabelecendo com eles uma saudável coabitação democrática, dentro de casa, continue a votar ao ostracismo os seus próprios filhos, recusando atribuir um papel charneira na saga nacionalista a figuras como Viriato da Cruz, Mário Pinto de Andrade, Manuel dos Santos Lima, Matias Migueis, Adolfo Maria, Monstro Imortal e tantos outros ignorados por uma História que está por reescrever.  
Porque os “Lukokis” não se reconhecem num partido que, dominado por mudanças de cosmética, se ajoelha perante uma geração da “terceira idade”, cuja utilidade suprema é a inevitável falta de lucidez e a aspiração política máxima é morrer no comité central do MPLA... 
Porque os “Lukokis” não podem sentir-se orgulhosos ao ver o seu partido vergado a um processo de recrutamento, na rua, de militantes sem quaisquer critérios, embalados no slogan comercial “compre 2, leve 3”... 
Porque os “Lukokis”, perante este expediente, não podem deixar de se sentir desencantados ao verem as fileiras do seu partido infestadas de gente sem princípios e sem nível...    
Porque os “Lukokis” não se podem congratular com um partido, em cuja elite dirigente perfilam empresários de probidade “infecciosa” e outras “proeminências” que chafurdam os seus negócios particulares com o poder que detêm na banca... 
Porque os “Lukokis” não podem bater palmas a um poder político que, legitimamente sufragado nas urnas, subordina ao poder uma guarnição militar, que impede o Provedor da Justiça de fazer o seu trabalho como auscultador das preocupações dos cidadãos. 
Porque os “Lukokis” não podem senão esperar que, perante a desautorização pública de que foi vítima, o Provedor da Justiça faça uma participação da ocorrência à Procuradoria Geral da República e que, na ausência de uma tomada de decisão deste órgão, em defesa da sua honra, apresente a demissão... 
Chegados aqui, os “Lukokis”, na sua análise crítica ao estado de hibernação do MPLA, não constatam apenas o baixo nível do debate; vão mais longe e concluem que não há debate! 
Concluem, desta forma, que a (des)governação não passa de um mero exercício de navegação à vista num país que se move em “ponto-morto”. 
Quarenta anos depois da Independência, a frustração não pode senão invadir o sentimento daqueles que, como Ambrósio Lukoki, vêem o futuro inseguro. 
Aqueles que, vistoriando o passado e olhando para o presente, reparam que as suas crescentes inquietações têm sido, afinal, desviadas sucessivamente para uma direcção: 
O que é que o MPLA pode fazer pelos nossos bolsos? 
É, pois, natural, que indo nesta direcção, a “Renúncia Im)possível” de Lukoki tenha agora explodido. É bom meditar nela porque outras renúncias poderão vir a surgir. 
Porque os ”Lukokis”, que os há encubados e que estiveram no congresso, por enquanto ainda sem coragem para dizer o que Ambrósio pensa e disse em voz alta, um dia poderão vir a fazer o mesmo. Porque é preciso que os políticos e governantes angolanos respondam à pergunta de John F. Kennedy adaptada à nossa realidade: o que é que podemos fazer por Angola? E não o que Angola pode azer por nós...
 

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