sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

DURBAN: Mandela: O prisioneiro que derrubou o apartheid

Mandela: O prisioneiro que derrubou o apartheid

Antigo presidente sul-africano tomou unilateralmente a decisão que conduziu o ANC a negociar o fim da política de segregação racial com o regime do apartheid.
TAMANHO DAS LETRAS 
Fonte: Redação VOA
Divulgação: Planalto De Malanje Rio capôpa
O regime sul-africano do apartheid terminou de uma forma surpreendente: não com o tipo de violencia que distinguiu o sistema opressivo, mas através de compromisso e negociação.

Dois proeminentes sul-africanos que estiveram a frente das discussões – e em lados opostos – dizem que foi a acção corajosa de um homem – Nelson Mandela – que tornou possível.

Tudo começou com conversas informais secretas na década de 1980 entre Nelson Mandela, na altura prisioneiro na Robben Island – e membros dos serviços secretos da Africa do Sul.

Mandela mais tarde escreveu que tomou uma decisão unilateral ao relacionar-se com o governo do apartheid que passou a maior parte de sua vida a lutar contra. Esta terá sido uma das mais astutas decisões políticas de sua vida que fez com que fosse galardoado com o Prémio Nobel da Paz em 1993, e mais tarde, eleito como o primeiro presidente negro do país.

Dave Steward, director executivo da Fundação Frederik De Klerk, disse que a decisão de Mandela não foi bem vista pela maioria dos seus colegas do Congresso Nacional Africano, mas a mais certa de todas. Além de pôr fim ao sistema racista, a decisão mostrou também que o ANC era uma força política madura com a qual se podia relacionar com seriedade.

Steward era na altura chefe de gabinete de De Klerk, o presidente sul-africano que viria a participar nas conversações de paz e com quem Mandela partilhou o prémio Nobel.

“Penso que o papel desempenhado por Mandela naquela conjuntura foi extremamente importante. Sentado na Prisão de Pollsmoor, ele chegou a conclusão, por si só e as vezes contra o conselho e vontade dos seus colegas, que não iria haver uma saída armada ou militar ao conflito na Africa do Sul, e que tinha que haver uma solução negociada. Penso que foi muita coragem da parte de Mandela em tomar uma tal decisão. Os resultados, penso, falam por si. Ele esteve, julgo eu, um passo a frente do resto do ANC ao perceber e aceitar de que só poderia haver uma solução negociada.”

O activista anti-apartheid Jay Naidoo disse que apenas Mandela tinha credenciais proceder uma tão impopular mudança no ANC. Naidoo era na altura presidente da maior coligação de sindicatos dos comerciantes.

“O regime do apartheid não conseguia nos derrotar e nós igualmente não conseguíamos a ele. Estivemos em bloqueio. A alternativa foi uma política de terra-queimada. Por isso nesse contexto, os lideres levantaram-se de ambos lados do conflito para dizer, ‘como podemos lançar as bases de uma solução pacífica?’ E não houve melhor pessoa para liderar o nosso lado do que Nelson Mandela, alguém que passou 27 anos em prisão por nossa liberdade.”

Jay Naidoo acrescentou que enquanto a participação de Mandela era importante, o movimento foi ajudado por muitos negociadores vedetas vindos do movimento da união dos comerciantes. Entre eles se incluía o sucessor de Mandela, Thabo Mbeki, e o vice-presidente do ANC, Cyril Ramaphosa.

Dave Steward que dirigiu o gabinete do presidente De Klerk  disse que uma vez que as negociações tiveram o inicio, Nelson Mandela começou a apertar – uma táctica que podia até ter falhado se tivesse um adversário diferente  pela frente. Steward considerou de brutal, alguns ataques de Mandela contra De Klerk, e afirma que se tivesse sido Peter Botha o líder na altura do Partido Nacional, as negociações poderiam ter acabado. Para ele, De Klerk teve mais uma visão de longo prazo e manteve as negociações, embora com as acusações do adversário.

Ambos os entrevistados apontam um outro factor que as vezes dominou as discussões em torno de Mandela: o seu imenso carisma e humildade. Foi uma rara combinação que permitiu a esse excepcional homem que foi Mandela dar um ousado passo que mudou o mundo a sua volta.

LUANDA: A União Europeia e o Caso Nito Alves Por Rafael Marques

A União Europeia e o Caso Nito Alves
Fonte Maka Angola
 Escrito por: Rafael Marques de Morais 
Divulgação: Planalto De Malanje Rio Capôpa
Reedição: Radz Balumuka
 04 de Dezembro, 2013
Recentemente, a 19 de Novembro, o presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, encarregou a Alta Representante da União Europeia e vice-presidente da Comissão, Baronesa Catherine Ashton, a responder, em seu nome, sobre questões relacionadas com a detenção e as acusações contra o activista angolano Manuel Chivonde Baptista Nito Alves.
 
Durão Barroso é bastante uma figura bastante conhecida e controversa em Angola, pelo seu papel na promoção do primeiro acordo de paz no país, em 1991, ratificado pelo presidente José Eduardo dos Santos e o malogrado líder rebelde Jonas Savimbi. Nessa altura Durão Barroso era o Secretário de Estado para os Negócios Estrangeiros e Cooperação. Desde então tem cultivado uma estreita relação de amizade com o presidente Dos Santos e tem-no favorecido na arena internacional.
 
O presidente Dos Santos tem alistado, também, outros políticos portugueses de relevo para o ajudarem a encobrir os actos de corrupção e de violação dos direitos humanos do seu governo. Em troca, o presidente angolano apoia a economia portuguesa.
 
A família Dos Santos, os seus acólitos e a Sonangol são os maiores investidores externos, por país, em empresas listadas na Bolsa de Valores em Portugal, nas quais têm investido mais de € 2,86 biliões nos últimos anos. Em salários e honorários, os portugueses residentes em Angola enviaram mais de € 270,6 milhões de Angola para Portugal.
 
Estas considerações podem ser a única explicação para o facto da carta de Durão Barroso nunca ter mencionado a causa real da detenção de Nito Alves: o presidente José Eduardo dos Santos.
 
A Carta
 
Em resposta às questões levantadas pela eurodeputada portuguesa, Ana Gomes, a Alta Representante referiu que os seus serviços estavam a seguir o caso de perto. “Fui informada que a acusação inicial contra ele [Nito Alves], de injúria ao abrigo da Lei dos Crimes contra a Segurança de Estado, foi alterada para uma acusação menor de ‘incitação à desordem pública’”, disse.
 
Na correspondência, a Baronesa Ashton explicou ainda que a delegação da União Europeia, em Luanda, tem estado em contacto com a família do activista, com o seu advogado e com a Associação Mãos Livres, que patrocina a sua defesa.
 
A monitoria do caso pela delegação da União Europeia foi uma iniciativa louvável. Por conseguinte, Durão Barroso devia estar melhor informado.
 
Contudo, a correspondência do presidente da Comissão Europeia, endereçada através da Baronesa Ashton, distorceu os factos, fez comentários políticos desnecessários e, de forma grave, omitiu a causa da detenção, da prisão e das acusações contra Nito Alves, um menor.
 
Durão Barroso declarou, na sua correspondência, que a situação do Nito Alves estava, de algum modo, relacionada com um assunto que nunca foi levantado pelas autoridades angolanas.
 
“Como provavelmente deve saber, as t-shirts produzidas por Nito Alvez (sic) tinham impressas, nas costas, a seguinte expressão: “Povo angolano, quando a Guerra é necessária e urgente”. Este slogan é, com certeza, bastante sensível num país que teve uma longa história de guerra civil”, argumentou Lady Ashton.
 
Tal comentário político é flagrantemente distorcido, como os factos demonstram.
 
Nito Alves foi raptado a 12 de Setembro, por 15 agentes armados e não identificados, em trajes civis. Os agentes não tinham um mandado de captura e levaram o prisioneiro para as instalações de uma unidade policial desactivada, onde o sujeitaram a ameaças de morte por causa do slogan impresso na parte frontal das 20 camisolas: “Zé-Dú/Fora/Nojento Ditador”.
 
O rapto de Nito Alves apenas se tornou publico porque uma testemunha alertou imediatamente a Rádio Despertar. A referida rádio divulgou de imediato o sucedido. A exposição pública forçou os agentes envolvidos na operação a transferir Nito Alves para a esquadra policial do Capalanca, em Viana.
 
No ano passado, um operação similar, levada a cabo por agentes policiais e de segurança, resultou na execução dos activistas Alves Kamulingue e Isaías Cassule.
 
Sobre a expressão “Povo angolano, quando a guerra é necessária e urgente”, impressa nas costas das camisolas, a explicação é simples. Esta expressão é o título de um artigo publicado a 8 de Agosto de 2009, no Folha 8, pelo jornalista e docente universitário Domingos da Cruz. Um ano mais tarde, a 20 de Agosto de 2010, o referido autor publicou um livro, no Brasil, com o mesmo título.
 
O livro é uma colecção de ensaios sobre uma variedade de assuntos, incluindo pornografia, sexualidade, desobediência civil, catolicismo, paz, pensadores africanos, a morte na cultura Bantu, Barack Obama, e a fome no mundo. No baralho de temas, Domingos da Cruz apelou à juventude para o uso do direito constitucional de manifestação para a defesa dos direitos humanos e da justiça.
 
A Procuradoria-Geral da República acusou Domingos da Cruz de ter cometido o “crime de incitação à desobediência colectiva”. Contudo, a Lei dos Crimes contra a Segurança de Estado (Lei n° 7/78), que tipificava o referido crime, já havia sido revogada. Por essa razão, a 6 de Setembro de 2013, O Tribunal Provincial de Luanda absolveu Domingos da Cruz, por inexistência do crime de que era acusado, na legislação nacional.
 
Entre Junho e Setembro, quando Domingos da Cruz foi notificado, pela primeira vez, para comparecer em tribunal, que jovens activistas adoptaram o título do seu livro como um slogan, como forma de lhe prestar solidariedade.
 
Apesar disso, na noite do rapto de Nito Alves, a Televisão Pública de Angola (TPA) desencadeou uma campanha de propaganda de tom apocalíptico. A TPA concentrou-se exclusivamente no título do livro de Domingos da Cruz, impresso nas costas das camisolas, para desviar as atenções da operação de rapto mal-sucedida, e da inscrição na parte frontal das camisolas “nojento ditador”. Aparentemente, a delegação da União Europeia, em Luanda , baseou o relatório, que entregou a Durão Barroso, na propaganda da TPA, uma vez que não há qualquer referência a esta informação nas acusações contra Nito Alves.
 
As Acusações Contra Nito Alves
 
Apresentem-se os factos.
 
O Ministério Público tomou a liberdade de mudar, quatro vezes, as acusações contra Nito Alves. No primeiro processo Nito Alves não era acusado de nenhum crime específico, enquanto nos processos seguintes foi acusado de insultar o presidente, embora com base em argumentações legais diferentes.
 
Finalmente, a 8 de Novembro, de forma contenciosa, a Procuradoria-Geral da República recorreu à revogada Lei dos Crimes contra a Segurança de Estado (Lei nº 7/78) para formular a acusação final contra o jovem activista. A Procuradoria citou o artigo referente ao Atentado contra o Chefe de Estado (Art. 16º, 3º). A Lei nº 7/78 é a mesma que foi usada contra Domingos da Cruz.
 
O Ministério Público acusou Nito Alves do “crime de injúrias contra titular de órgão de soberania”. Esta acusação foi feita no mesmo dia em que o jovem foi libertado sob termo de identidade e residência.
 
Os argumentos do Ministério Público são bastante claros. Na acusação explica que, durante o interrogatório, Nito Alves reiterou que “não retira a palavra ‘nojento’, [que havia mandado estampar nas camisolas] e que ‘se o presidente se sentir ofendido com isto é porque presume cometer tais erros’ ”.
 
De acordo com a PGR, “as referidas palavras visaram insultar e ofender moralmente o Presidente da República de Angola, José Eduardo dos Santos, popularmente conhecido por Zé Dú, órgão de soberania que deve ser tratado com todo o respeito e reverência”.
 
Não há acusações contra Nito Alves por “incitação à desordem pública”, como afirma a Baronesa Ashton. Essa afirmação é simplesmente falsa. Falei com o advogado Salvador Freire, da Associação Mãos Livres, que se encontrou com a delegação da União Europeia em Angola. Negou ter prestado tal informação.
 
Oh, Durão Barroso!
 
Se Durão Barroso e os seus serviços estão a acompanhar o caso de perto, então, estão a enganar a Comissão Europeia e o Parlamento Europeu.
 
O Parlamento Europeu deve instar Durão Barroso e a Baronesa Ashton a corrigirem este baixo acto de diplomacia e a apresentarem a verdade dos factos.
 
Há um ditador em Angola que encarcerou um menor por ter mandado imprimir 20 camisolas nas quais é descrito como “nojento”. O mesmo ditador está a julgar um menor através de uma lei, dos Crimes contra a Segurança de Estado, revogada há três anos. O menor é obrigado a apresentar-se, quinzenalmente, numa esquadra policial. Estes são os factos.

LISBOA: Morreu o politico global, estamos todos orfãos

Morreu Nelson Mandela, o político global

Morte de Nelson Mandela foi anunciada há momentos pelo presidente sul-africano Jacob Zuma.
Cristina Peres
Planalto De Malanje Rio Capôpa
 
Nelson Mandela (1918-2013)
Nelson Mandela (1918-2013)

Morreu Madiba. Morreu Nelson Mandela. Homem de Estado, Presidente da África do Sul (1994-1999),
 o mais conhecido presidiário do mundo, defensor da liberdade e dos direitos dos desfavorecidos, paladino da igualdade 
de oportunidades e do fim de todas as formas de opressão, Nelson Mandela morreu hoje em casa em Joanesburgo. 
Tinha 95 anos de idade.

A nação sul-africana chora o nonagenário que se encontrava fragilizado pela persistência de uma infeção pulmonar. 
Mandela tinha passado por um internamento hospitalar rápido, em 10 de março, para revisão do estado da infeção, 
que o mantivera internado 18 dias em dezembro de 2012. Ainda que ninguém possa estranhar que o fim chegue em idade avançada, 
Madiba tornou-se no símbolo universal que ninguém vê partir sem desgosto.
A morte de Mandela foi anunciada esta noite pelo presidente da África do Sul, Jacob Zuma, em conferência de imprensa.

Legado político


O seu legado político ficou claramente expresso na frase que dirigiu aos milhares de pessoas que se juntaram em Hyde Park, Londres, 
em Junho de 2008, para comemorar os seus 90 anos: "Onde quer que haja pobreza e doença, onde quer
 que os seres humanos estejam a ser oprimidos, há trabalho a fazer. Após 90 anos de vida, é tempo de novas mãos empreenderem 
a tarefa. Agora, está nas vossas mãos".

A vida de Nelson Mandela personifica a ideia de que uma pessoa tem o poder de fazer a diferença e de deixar a sua impressão 
digital única no mundo. Nasceu Rolihlahla Mandela em 18 de Julho de 1918, na pequena vila de Mvezo, na província do Transkei, 
na África do Sul rural. Mandela é filho da segunda de quatro mulheres de um conselheiro Xhosa que estava destinado a ser chefe, mas que acabou por perder o título e a fortuna, morrendo quando Rolihlahla tinha apenas nove anos. A mudança de estatuto forçou a mãe a mudar-se com a família para Qunu, uma aldeia ainda menor a norte de Mvezo, e, por sugestão de um amigo do seu falecido pai, Rolihlahla foi batizado pela Igreja Metodista, foi o primeiro da família a frequentar a escola onde o professor lhe anunciou que passaria a chamar-se Nelson.

Da aldeia ao ANC


Tinha sido adotado pelo chefe Jongintaba Dalindyebo, o regente do povo Thembu, mudou-se para a capital de Thembuland para a
 residência real do chefe onde ouviu pela primeira vez falar de como África tinha vivido em paz relativa até à chegada dos brancos.
 Em 1939, entrou para a única universidade que podia ser frequentada por negros na África do Sul, a University College de Fort Hare, 
o equivalente no país a Oxford ou Harvard e foi ali que foi eleito para o Conselho de Representação dos Estudantes onde os seus atos, 
considerados de insubordinação, lhe valeram ser suspenso até ao final daquele ano letivo.

Ao voltar a casa, Mandela viu-se confrontado com o facto de lhe ter sido escolhida uma mulher para casar e fugiu para Joanesburgo, 
onde trabalhou numa série de funções enquanto terminava o seu bacharelato por correspondência. Entrou na Universidade de
 Witwatersrand para estudar direito e envolveu-se ativamente no movimento anti-apartheid inscrevendo-se no 
ANC (Congresso Nacional Africano) em 1942. Sete anos mais tarde, o ANC adotou oficialmente os métodos de boicote, greve, 
desobediência civil e não-cooperação, tendo como objetivos a plena cidadania, a redistribuição da terra, direitos sindicais e educação 
gratuita e obrigatória para todas as crianças.

Militância e prisão


Durante 20 anos, Nelson Mandela liderou uma campanha pacífica e não violenta contra o Governo e as suas políticas racistas e fundou
 um escritório de advocacia com Oliver Tambo que dava aconselhamento a negros que não dispunham de representação. Mandela e mais

 150 pessoas foram presas em 1956 acusadas de traição pela sua prática política embora tenham acabado por ser ilibados. Já menos 
convencido da eficácia dos métodos pacifistas que defendia, Mandela organizou uma greve nacional dos trabalhadores de três dias em
 1961 pela qual foi preso no ano seguinte. Em 1963, foi levado a tribunal e condenado, com outras dez pessoas, a prisão perpétua por o
fensas políticas, incluindo sabotagem.

Nelson Mandela foi detido em Robben Island 18 dos 27 anos de pena que cumpriu. Após 27 anos como o prisioneiro nº 46664 sob o 
regime de apartheid na África do Sul, Mandela emergiu como cabeça do ANC (Congresso Nacional Africano) para fazer a reconciliação
 com os seus opressores e conduzir o país pacificamente na sua transição após a era de 46 anos de segregação racial. Quando 
foi libertado, apelou de imediato às potências estrangeiras para que não reduzissem a sua pressão sobre o regime de Pretória com vista 
a uma reforma constitucional.

Legado


Mandela ganhou o Prémio Nobel da Paz em 1993, quando era Presidente Frederik de Klerk e, em 1994, foi eleito o primeiro Presidente
 da África do Sul democrática. Cumpriu um único mandato, de 1994 a 1999, tendo sido sucedido pelo seu vice-presidente, Thabo Mbeki.

Mandela foi casado três vezes: com Evelyn Ntoko Mase (1944-1957) com quem teve quatro filhos; com
 Winnie Madikizela-Mandela (1958-1996) com quem teve duas filhas e com Graça Machel (1998).

O Dia Nelson Mandela foi instituído em 2009 para celebrar a sua vida e a chamada à ação que fez ao longo da sua 
vida. Celebra-se a 18 de Julho e, propositadamente, não é um feriado para que inspire todas as pessoas em todo o mundo
 a trabalharem pelos valores que Nelson Mandela defendeu ao longo de toda a sua vida
.


LISBOA: Morreu Nelson Mandela "Madiba": A liberdade como obra

Morreu Nelson Mandela: A liberdade como obra

O primeiro Presidente negro da África do Sul morreu nesta quinta-feira, anunciou Jacob Zuma, Presidente sul-africano. O líder da luta anti-apartheid tinha 95 anos.
Nelson Mandela foi um homem de gestos. Como este: apenas aceitou sair da prisão quando recebeu garantias de que todos os outros prisioneiros políticos seriam libertados como ele. O advogado e activista acreditou na luta pela libertação de todo um povo. Depois de 27 anos preso, foi eleito o primeiro Presidente negro na África do Sul. O seu legado vai muito além do seu país e do tempo em que viveu. Morreu nesta quinta-feira, com 95 anos, na sua casa em Joanesburgo.Quando anunciou que deixava a política, Nelson Mandela fê-lo com a mesma naturalidade com que dizia: “Toda a gente morre.” Escolheu deixar a presidência da África do Sul no fim do primeiro mandato dois anos depois de decidir abandonar a liderança do Congresso Nacional Africano (ANC), que transformou num farol da luta de libertação do seu país. Na sombra, manteve uma actividade pública, por vezes próxima da política. Estávamos em 1999.
Cinco anos depois, com 86 anos, anunciou brincando que ia “reformar-se da reforma”. Era a sua maneira de dizer que desta vez era mesmo de verdade. “Não me telefonem, eu telefono-vos”, disse na altura num encontro com jornalistas. “Não lhe telefonámos”, escreveu o jornalista Ido Lekota em 2010 no jornal The Sowetan, “mas a sua figura ‘maior do que a vida’ continua a pairar sobre a nossa democracia e o panorama político” da África do Sul, acrescentou.
Hoje, três anos depois, Ido Lekota continuaria provavelmente a escrever o mesmo do líder da luta anti-apartheid, preso durante 27 anos por lutar contra o regime segregacionista da África do Sul, que foi Prémio Nobel da Paz (com Frederik de Klerk) em 1993 e primeiro Presidente negro da África do Sul eleito um ano depois. “O estadista mais amado” do mundo, como se lhe referiu em tempos o New York Times, esteve internado este ano, com uma infecção pulmonar, como o foi várias vezes nos últimos dois anos. Deixa uma obra completa: um país que imaginou e criou a partir de um ideal.
Advogado, líder da luta anti-apartheid, defensor do uso de armas em nome de uma luta igual com o opressor, Nelson Rolihlahla Mandela conseguiu ter do seu lado pacifistas como o arcebispo Desmond Tutu, que foi Nobel da Paz antes dele, em 1984, e que, quando Mandela esteve internado, rezou pelo “conforto e dignidade” daquele que considera ser “o ícone mundial da reconciliação”. Também foi o arcebispo Desmond Tutu quem disse, num dos últimos aniversários de Mandela, a 18 de Julho, que a melhor prenda que ele podia receber era saber que as pessoas seguiriam o seu exemplo, fossem como ele.
De pessoa revoltada a magnânima
Tutu previu ser este um momento “traumático” para a África do Sul, o da perda de Mandela, figura que descreveu como “um ser humano fantástico”, numa entrevista em Junho de 2012 ao PÚBLICO, em Lisboa.
“Quando vai para a prisão, é uma pessoa zangada, revoltada, que acredita na violência como meio de conquistar a liberdade. E quando sai, emerge como uma pessoa extraordinariamente magnânima. O sofrimento por que passou ajudou-o a suavizar a sua posição. (…) Ele acreditava convictamente que se é líder pelas pessoas que são lideradas e não em benefício próprio. Fomos incrivelmente abençoados por termos Madiba [Mandela] aos comandos, num momento histórico para o nosso país. (…).”
Pelo menos até ao fim de 2010, o ex-Presidente sul-africano continuava, todos os meses, a receber quatro mil mensagens do mundo inteiro. Algumas com uma homenagem, outras a desejarem-lhe uma reforma tranquila e feliz, segundo a Fundação Nelson Mandela em Dezembro de 2010 que, na declaração também recebida pelo PÚBLICO, juntou um pedido a todos para se coibirem de pedir autógrafos, declarações, entrevistas ou aparições públicas em apoio a algum evento, de forma a “ajudar a tornar a reforma de Madiba um período de paz e tranquilidade”.
Seguiram-se meses e anos difíceis em que a sua saúde se deteriorou. E durante esta última permanência no hospital, à porta da sua casa em Joanesburgo e do hospital em Pretória, muitas flores foram deixadas com mensagens a desejar as melhoras ou a dizer: “Tata Madiba: Graças a ti, temos orgulho em ser sul-africanos.” Ou com promessas: “Prometemos viver em paz e harmonia.”
Descendente do rei thembu
O desejo de Mandela, expresso na autobiografia Longo Caminho para a Liberdade, era ser enterrado junto dos seus antepassados em Qunu, no Transkei, província do Cabo Oriental, onde nasceu em 1918, e foi educado para ser, como o pai falecido, conselheiro do rei thembu, Jongintaba Dalindyebo.
Era descendente de Ngubengcuka, que tinha antes sido o rei dos thembu, incluídos no mais vasto grupo linguístico dos xhosa. Mandela descreve o rei, que foi seu pai adoptivo e do qual teria sido conselheiro se não tivesse partido para Joanesburgo, como “um homem tolerante e esclarecido que tinha alcançado o objectivo [que caracteriza] todos os grandes líderes: manter o seu povo unido”.
Este “grande líder” acolhera Mandela com nove anos, após a morte do pai que, anos antes, ficara desapossado de tudo por desafiar um representante da administração britânica. A mãe, sem condições para o criar, entregou-o ao rei. Mandela aprendeu a escutar os anciãos. 
Os vários nomes de Mandela 
Mandela é muitas vezes chamado, na África do Sul, por ‘Tata’, que significa ‘pai’, ou por ‘khulu’ que é ‘grandioso’ – ambos na língua xhosa. Mas Mandela é sobretudo referido, em sinal de respeito, por Madiba – nome de um chefe thembu que reinou no Transkei no século XVIII, o nome do clã de Mandela que é mais importante do que o apelido.
Na clandestinidade, a partir de 1961, vestiu a pele de um David Motsamayi; disfarçou-se várias vezes de motorista, cozinheiro, jardineiro.
Não foi conselheiro, nem rei, mas a sua educação de aristocrata, os estudos de advocacia, o carisma e dedicação à luta anti-apartheid fizeram dele o líder inquestionável do ANC e principal ícone da libertação da África do Sul. Não aceitou ser libertado da prisão enquanto não fossem instituídos o fim doapartheid e o fim da proibição do ANC, o levantamento do estado de emergência e a libertação dos outros presos políticos.
“Eu prezo muito a minha liberdade mas prezo ainda mais a vossa”, escreveu num discurso lido pela filha Zindzi, num comício no Soweto, em 1985, dirigido aos africanos e membros do ANC. 
Recolhimento nacional
Também por isso, a morte de Mandela é “uma perda tremenda para o país”, disse Ray Hartley, director do jornal sul-africano The Times numa entrevista ao PÚBLICO. “A África do Sul perderá aquele sentimento reconfortante de que existia este grande unificador”, disse, embora prevendo que "os processos políticos não serão afectados pelo seu desaparecimento.”
Também em entrevista, Thierry Vircoulon, investigador associado do Institut Français des Relations Internationales e co-autor de L’ Afrique du Sud de Jacob Zuma (L’Harmattan) considerou que “a África do Sul vai entrar num momento de recolhimento nacional”. E realçou: “A nova África do Sul não vai desaparecer com ele, precisamente porque ele fez um excelente trabalho enquanto pai fundador dessa nova África do Sul”.
Os seus actos são frequentemente lembrados como exemplo para outros. As suas palavras ressoarão durante muito tempo como lições de vida.
Frederik W. de Klerk, ex-líder do Partido Nacional, fala do líder que confrontou em duras negociações e com quem partilhou o prémio Nobel da Paz 1993, numa entrevista a propósito do livro Conversations with Myself , também lançado em Portugal, em 2010, com o título Nelson Mandela – Arquivo Íntimo (Editora Objectiva) e que junta notas pessoais, cartas e diários de Mandela escritos antes e depois da saída da prisão: “Independentemente de qualquer crítica que possamos fazer, o homem que emerge deConversations with Myself é uma eminente figura, não só na história da África do Sul mas na história do século XX. Ele foi Presidente para desempenhar um papel exemplar na unificação e reconciliação do povo profundamente dividido da África do Sul”, disse aquele que foi o último Presidente branco da África do Sul (1989-1994).
Muitas vezes, admite na autobiografia Um longo caminho para a liberdade, Mandela se questionou sobre o sofrimento que infligira à família durante a clandestinidade e nos anos na prisão de onde só saiu com 72 anos.
Já em liberdade, numa entrevista à revista norte-americana Time em Fevereiro de 1990, disse acreditar no valor da dedicação quase exclusiva à luta: “Sim, valeu a pena. Ser preso por causa das nossas convicções e estar preparado para sofrer por aquilo em que se acredita vale a pena. É uma conquista para um homem cumprir o seu dever na terra independentemente das consequências”, considerou.
O difícil equilíbrio, nunca alcançado, entre a dedicação à família, por um lado, e à causa política da libertação, por outro, acompanhou-o durante a vida e é algo presente nas suas memórias do Arquivo Íntimo. Porém aceitou-o da mesma forma que se aceitou defender o recurso às armas como imprescindível para o sucesso da luta.
Em defesa das armas
“Nunca irei lamentar a decisão que tomei em 1961, mas gostaria que um dia a minha consciência estivesse tranquila”, disse referindo-se à decisão tomada nesse ano de passar à clandestinidade e formar o MK (Umkhonto we Sizwe – A lança da nação) de que foi primeiro comandante-chefe e que se tornou a ala militar do ANC. Viria a ser condenado a prisão perpétua em 1964 por sabotagem e conspiração.
Passou 18 anos na prisão de alta segurança de Robben Island. Esteve depois na prisão de Pollsmoor, e já no final foi transferido para a cadeia de Victor Verster perto da Cidade do Cabo. 
Nos 23 anos que viveu depois de libertado, concluiu a missão, iniciada ainda na cadeia, de negociar o fim do apartheid com o Governo do Partido Nacionalista e foi eleito primeiro Presidente negro da África do Sul. Depois de terminado o mandato de cinco anos, retirou-se da política e passou a dedicar-se, através da Fundação com o seu nome, a uma nova causa – o combate e a prevenção da sida – à qual se sentia especialmente ligado.
Em 2005, a morte do filho Makgatho, vítima de sida, levou Mandela a uma rara intervenção pública desde que deixara a vida política em 1999. Lançou um apelo ao fim do tabu, para que se falasse desta como de qualquer outra doença, por considerar que só assim a sida deixaria de ser fatal. 
Já antes, quando estava preso, tinha perdido o filho mais velho Thembekile, num desastre de automóvel, em 1969, e uma filha pequena ainda bebé Makawize, ambos do primeiro casamento com Evelyn Mase, de quem se divorciou em 1957.
Um ano depois conheceu e casou-se com Winnie Mandela, de quem teve duas filhas. Quando a viu pela primeira vez, “soube que a ia amar”, escreve na autobiografia. Durante os anos em que esteve preso, é a sua confidente e, durante muito tempo, quem melhor o compreende. A política, os métodos utilizados ou o rumo defendido para a luta acabam por separá-los. Mandela opta pelo divórcio em 1996.
Dos seis filhos que teve, acompanharam-no até ao fim as três filhas: Zindzi, Zenani e Makawize. E Graça Machel, com quem casou dois anos depois do divórcio com Winnie, a 18 de Julho de 1998, no dia do 80º aniversário.
Quando Mandela esteve esta última vez no hospital, Graça Machel agradeceu emocionada as muitas mensagens a desejar as melhoras do ex-Presidente vindas da África do Sul, do continente e do resto do mundo. Nessa mensagem pública e universal, Graça Machel dizia estar reconhecida a todos os que tinham, com isso, “feito uma diferença, na recuperação” de Mandela numa alusão às palavras do próprio: “O que conta na vida não é o facto de termos vivido. É a diferença que fizemos para a vida dos outros”.