Já ouvi várias opiniões sobre a telenovela de produção nacional Windeck que o canal 2 da TPA está a passar, todas elas por sinal bastante desfavoráveis em relação ao seu conteúdo.
Reparei, entretanto, que uma boa parte destas opiniões menos simpáticas é justificada pela introdução/abordagem do tema da homossexualidade que é um dos casos mais escaldantes/fracturantes que Windeck nos dá conta no âmbito da sua trama geral.
Antes de mais devo confessar que não vejo com regularidade a referida história, o que me impede de possuir a necessária/suficiente informação para poder ter uma ideia de conjunto e assim estar em condições de emitir uma opinião crítica mais fundamentada sobre a sua qualidade.
Não vou por isso, fazer qualquer apreciação mais abrangente do mencionado produto mediático que o Canal 2 tem actualmente na sua grelha de atracções, tendo como público-alvo as camadas jovens mais crescidinhas da nossa sociedade, onde todos estamos incluídos, se não andarmos armados já em muito kotas.
Sendo, contudo, a TPA2 um canal que transmite em sinal aberto, é muito difícil criar qualquer controlo sobre as audiências mais acriançadas, que sempre é possível os pais estabelecerem quando se trata dos programas transmitidos no cabo, com a utilização do mecanismo do “parental control/censura”.
Como é evidente, mesmo nas famílias mais estruturadas, já ninguém liga a isto, sendo “normal” as crianças hoje verem tudo e mais alguma coisa, para além do Panda e quantas vezes em companhia dos próprios pais que nestas lides nunca foram tão liberais como agora.
No que toca a opinião publicada, o tema Windeck ganhou nos últimos dias uma maior visibilidade depois da Igreja Católica ter sido confrontada com o conteúdo da referida novela no decorrer da conferência de imprensa que marcou o encerramento da 2ª Assembleia Anual da CEAST.
O porta-voz da reunião disse que em concreto não se iria pronunciar porque não via a telenovela, mas logo de seguida referiu-se a importação de “lixos culturais”, numa alusão aos conteúdos mais polêmicos que as nossas televisões têm transmitido.
Em abono da verdade e depois dos satélites terem quebrado as fronteiras convencionais, já não há mais televisões nacionais como no passado pois agora é possível ter-se acesso a tudo feito fora de Angola e a preços cada vez mais acessíveis.
De nada adianta pois pensar-se que gerindo melhor do ponto de vista cultural os canais públicos nacionais é possível evitar-se a “contaminação” que nos chega do exterior pela via das telenovelas, mas não só.
O denominado “tele-lixo” entrou definitivamente para o quotidiano das grelhas de diversão que as televisões têm para oferecer aos seus consumidores.
Tal impossibilidade não nos deve, entretanto, aconselhar enquanto gestores públicos de televisão, a competir ao mesmo nível com o tal “lixo”, baixando sempre que necessário a qualidade do nosso produto cultural para podermos ganhar a batalha das audiências.
Em Angola e por força do oligopólio, ainda nem sequer existe esta guerra ao nível das televisões, que como sabemos têm outras fontes de financiamento muito mais importantes que aquela que é proveniente dos investidores publicitários.
No caso do “filme” Windeck que tem estado a provocar a celeuma que anda por aí a saltitar nas redes sociais em apaixonados, prolongados e acalorados debates a volta da questão da homossexualidade, uma das questões que se tem colocado tem a ver com a alegada influência perniciosa que tal abordagem pode ter com a própria orientação sexual dos jovens angolanos e não só.
Importa referir que, de uma forma geral, a homossexualidade em Angola ainda é vista como um comportamento aberrante e condenável, pelo que qualquer debate à sua volta está à partida condenado a ser um exercício muito sensível.
Quem gere um canal público de televisão não pode ignorar esta realidade, sob pena de se expor aos ataques cerrados da opinião pública e publicada, como é o que está a acontecer.
Sendo a homossexualidade em Angola um tema absolutamente fracturante, com características que chegam mesmo a ser explosivas, introduzir o assunto num programa tão popular como é uma novela, implica uma séria reflexão, antes de se tomar a melhor e mais ponderada decisão.
Até que ponto esta reflexão foi tida pelos autores da novela é algo que não nos é possível saber, mas acreditamos que tenha sido sua intenção provocar no melhor sentido a sociedade angolana. As provocações não são necessariamente negativas.
Certo mesmo é que o assunto está “a bater” com alguma força, não acreditando nós que o debate em curso possa de momento alterar as arreigadas convicções da sociedade angolana em relação a questão da homossexualidade.
Defensores incondicionais que somos da liberdade de expressão, também não queremos, nem estamos aqui a condenar ninguém, por mais ousado que ele seja para a época, como parece ser o caso do Windeck, na vertente da homossexualidade, não obstante ter sido garantido o contraditório na forma como o tema está a ser abordado.
NA-Texto publicado na Revista Vida/O País (30-11-12)