A 6 de Janeiro de 2012 apresentei, junto da Procuradoria-Geral da República (PGR), uma
queixa-crime, por suspeita de enriquecimento ilícito e abuso de poder, contra o triunvirato presidencial constituído pelo actual vice-presidente Manuel Vicente, o ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança do Presidente da República, Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”, e o principal consultor do referido ministro, o general Leopoldino Fragoso do Nascimento “Dino”.
Em reacção, a Procuradoria-Geral da República instaurou um inquérito preliminar, sob processo nº 06-A/2012-INQ, para averiguação da queixa sobre o envolvimento do trio em negócios que o autor expôs na sua investigação
“Presidência da República: O Epicentro da Corrupção em Angola”.
Como conclusão do inquérito, a PGR reconheceu que os três homens eram accionistas do Grupo Aquattro, que, por sua vez, em menos de três anos, passou a dominar a economia política angolana, sendo o maior grupo empresarial do país com participações desde o sector do petróleo ao comércio retalhista, através da rede de supermercados Kero.
Obviamente, a decisão da PGR foi favorável aos dirigentes ─ não podia ser de outra maneira.
Há, no entanto, um detalhe que espelha uma mentira grosseira da PGR, lavrada e assinada pelo magistrado instrutor e adjunto do procurador geral da República, Domingos Salvador André Baxe, e confirmada pelo vice-procurador geral adjunto da República, Henrique dos Santos, na decisão de arquivamento do processo datada de 7 de Fevereiro de 2013.
Trata-se, especificamente, da participação accionista do grupo na Biocom – Companhia de Bioenergia de Angola, em parceria com a Sonangol e a multinacional brasileira Odebrecht.
Segundo o despacho de arquivamento: “Do exposto resulta que os denunciados Eng. Manuel Domingos Vicente, General Manuel Hélder Vieira Dias Júnior e general Leopoldino Fragoso do Nascimento não são nem nunca foram sócios da referida sociedade [Biocom], não integram nem nunca integraram os seus órgãos sociais nem nunca exerceram nela funções executivas, pelo que não poderiam ter praticado – como não praticaram – actos de improbidade conducentes ao enriquecimento ilícito, nem se verifica a alegada conflitualidade de interesses privados com a sua qualidade de servidores públicos, como denunciado por Rafael Marques de Morais.”
Recentemente, a empresa Cochan, parte do império de negócios do trio, lançou o seu website (
www.cochan.com), no qual revela ter na Biocom um dos seus principais investimentos, conjuntamente com o Kero, a UNITEL, O DT Group e a Puma Energy, detentora da rede dos postos de abastecimento de combustível Pumangol.
O website revela apenas um nome, em toda a sua cadeia de negócios, o do general Leopoldino Fragoso do Nascimento, actual consultor principal do ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança do Presidente da República, na
qualidade de fundador e presidente da Cochan. Desde 10 de Maio de 2010, o general Leopoldino Fragoso do Nascimento tem exercido funções de administração da Cochan, a partir de Singapura. Quatro meses depois, o presidente da República, José Eduardo dos Santos, através do Decreto Presidencial nº 216/10, nomeou o referido general para o cargo de consultor do ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança do Presidente da República.
O Estatuto Orgânico da Casa de Segurança estabelece que os consultores do ministro de Estado e o chefe da Casa de Segurança “são oficiais generais das Forças Armadas Angolanos, nomeados em comissão de serviço (…)”. Entre as suas atribuições, o consultor realiza “estudos, análises e pareceres pontuais sobre assuntos de segurança nacional”.
Todavia, desde a sua nomeação, o general tem acumulado o exercício de cargos públicos e privados, em flagrante violação da Lei da Probidade, em vigor desde Junho de 2010. Segundo a referida lei, é um acto de improbidade, conducente ao enriquecimento ilícito, “aceitar emprego ou exercer actividade de consultoria para pessoa física ou jurídica que tenha interesse susceptível de ser atingido ou amparado por acção ou por omissão decorrente das atribuições do agente público, durante a actividade”.
Como pode o general Leopoldino Fragoso do Nascimento ser, ao mesmo tempo, servidor público e presidente de um grupo de empresas privadas que estão associadas à Sonangol? A Cochan também é sócia da Sonangol na UNITEL, na DT Group e na Puma Energy.
A resposta é óbvia. O general é um protegido do presidente José Eduardo dos Santos. Está acima da lei. Na verdade, a Procuradoria-Geral da República não desvirtuou o sistema de justiça ao encobrir a verdade sobre a participação do referido general na Biocom. É que a justiça é a vontade do presidente, e a PGR é apenas uma agência do seu capricho.