O julgamento (ver-se-á se merece assim ser chamado) do jornalista angolano Rafael Marques, acusado dos “crimes de injúrias e ultraje a órgão de soberania”, foi reagendado para o dia 19 deste mês, disse hoje fonte ligada ao processo.

Ainformação foi avançada por Horácio Junjuvili, advogado de defesa de Rafael Marques, que deverá ser julgado (ou apenas vítima de mais uma palhaçada em cenário judicial) devido a um artigo publicado em Outubro de 2016, no seu portal de investigação jornalística “Maka Angola”, em que levanta suspeitas de corrupção contra o então Procurador-Geral da República, general João Maria de Sousa.
No artigo, o jornalista e activista denuncia o negócio ilícito, realizado pelo ex-PGR de Angola, envolvendo um terreno de três hectares em Porto Amboim, província do Cuanza Sul, para a construção de um condomínio residencial.
O jornalista disse à imprensa, após um primeiro adiamento do julgamento a pedido da acusação, que vai reafirmar em tribunal “a corrupção do ex-Procurador-Geral da República e provar em tribunal que é corrupto”.
“Como é que eu, tendo denunciado um caso de corrupção, sou acusado de cometer crimes contra a segurança do Estado? Isto é um abuso!”, considerou Rafael Marques. Seria de facto um abuso se, neste como noutros casos, estivessem a falar do verdadeiro Estado de Direito.
Na terça-feira, instado pela Lusa a comentar o processo, João Maria de Sousa disse que pretende ver em tribunal “até onde chega a coragem” do jornalista Rafael Marques, que o acusou de ser corrupto.
“Vamos ver até onde é que chega a coragem, até porque uma coisa são as convicções que determinada pessoa tem e outra coisa é a realidade factual e jurídica relacionada com a questão”, disse o general João Maria de Sousa.
Segundo João Maria de Sousa, o caso tem a ver com a sua intenção de adquirir os direitos de superfície de uma determinada parcela de terreno na província do Cuanza Sul, que “enquanto cidadão, como qualquer outro cidadão, tem direito”.
Não é verdade. Enquanto Procurador-Geral da República, João Maria de Sousa não é “como qualquer outro cidadão”. O PGR violou o “princípio da dedicação exclusiva” estabelecido pela Constituição angolana e que impediria (de estivéssemos no tal Estado de Direito) que os magistrados judiciais e do MP exerçam outras funções públicas ou privadas, excepto as de docência e de investigação científica de natureza jurídica.
Diz o Artigo 187 (Estatuto) da Constituição no seu ponto 4: “Os magistrados do Ministério Público estão sujeitos às mesmas incompatibilidades e impedimentos dos magistrados judiciais de grau 67 correspondente, usufruindo de estatuto remuneratório adequado à função e à exclusividade do seu exercício.”
A acusação não consegue desmentir que João Maria de Sousa não comprou o tal terreno. O que dizem agora é que ele não pagou os emolumentos e portanto o terreno já não é dele. Esta explicação, constatação ou tese de defesa não altera o âmago do problema. O problema não é se o ex-PGR continuava com o terreno ou não, o problema é que adquiriu o terreno de forma ilegal.
João Maria de Sousa questionou a razão de o jornalista “de repente” lhe atribuir o “título de corrupto, pelo facto de ter requerido aquele espaço”.
O magistrado afirmou que neste processo, que envolve ainda um outro jornalista angolano, Mariano Brás, por ter republicado o mesmo artigo no seu jornal “O Crime”, está apenas a defender o seu bom nome, a sua honra e dignidade.