Não existe
dúvida alguma que o regime sustentado pelo MPLA fulminou com um tiro certeiro o
âmago sensorial da igreja, com o único objectivo de enfraquecê-la e torná-la
vulnerável para impedi-la de movimentar-se em múltiplos apoios que
eventualmente pudessem ser contrários a criação do regime
expansionista idealizado pelo ditador José Eduardo dos Santos, há 38
ininterruptos anos no poder. Fonte: Planalto de Malanje Rio Capopa/Raul Diniz 06/05/2017
A igreja
apesar subserviente e fortemente debilitada, mesmo ferida de morte e ter
perdido a sua sabedoria milenar, ela pôde e fará com toda certeza a diferença.
A igreja pôde até ter perdido a direcção certa e habitar na temporariamente na
escuridão, ela vai com toda certeza despertar do sono do tempo e fazer a
diferença no xadrez político-social angolano.
O despertar da igreja é inevitável, está
escrito que tudo o que vem de Deus a Deus pertence, quero afirmar que a igreja
angolana jamais terá como deus um simples e mero ditador mortalmente atingido
pelo câncer da vida terrena. A natureza da igreja de Deus é pendor divino e
está contaminada pela essência purificante do sobrenatural. Só quem vem de Deus
e está com Deus entende que o autor e consumador da nossa fé é o senhor Jesus
que nos transformou na sua morada enquanto igreja somos na terra. Pretendo
aclarar que existe um consenso é hermenêutico, que a salvação vem pela fé e por sua
vez a fé provem do ouvir a palavra de Deus. igreja é de Cristo Jesus, e sem Ele
não há salvação para nenhum mortal.
Por outro lado, a igreja mesmo cega, fraca,
frágil e pecadora já percebeu que Angola é considerada pela militância dos CAPs
como o seu olimpo e que o seu deus se chama José Eduardo dos Santos, esse não é
o Deus abençoador e pai de Cristo Jesus, ademais nós os cristãos não cremos que
o (VERMELHO DA BANDEIRA DO MPLA) significa o sangue de Cristo vertido na cruz
no monte das caveiras, somente um tolo doente feito reverendo mentiroso
bajulador pensa e fala tais bojardas tagareladas.
É sim
verdade que a igreja de hoje foi transformada numa igreja antropocêntrica, de
igual modo é também verdade que ela colocou no seu centro o homem, afastou-se
extemporaneamente de Deus e distorceu os fundamentos teológicos expressos nos
evangelhos, constituindo-se numa organização condescendente e obediente aos
epítetos do regime. Não se pôde com rigor anular o ilustrativo exacerbo neopentecostal
da igreja evangélica, nem tão pouco ignorar a existencial intempestividade
autoral dos arautos propagadores da teologia Arminiana e/ou Calvinista, que
defendem com elevado espírito determinista a teologia da predestinação.
O clero nas suas preleções tem um discurso
afinado, e estritamente dinheírista. Não é exagero nenhum afirmar sem medo de
errar que o sacerdócio eclesiástico está de cócoras e de mãos estendida em
direcção a cidade alta como faria um pedinte qualquer que suplica e busca por facilitadas
benesses.
Mesmo com um
acordo de silencio consertado entre o MPLA e a igreja, esse perigoso pacto
ajuda de sobremaneira a desvendar o perigo que a igreja corre caso prolongue
essa aliança nociva de compadrio indecente e se mantenha fiel ao regime obsoleto
do ditador despótico angolano. JES pôde até sair da presidência da república,
mas o regime criado por ele vai permanecer, e com total certeza esse regime
anacrónico seguramente ruirá, e com grande estrondo despedaçar-se-á.
É vergonhosa
a parceria que a igreja mantém com o regime mais vil e corrupto de África. Essa
mesma África, que em tempo de recuperação da sua imagem e dignidade, busca a
modernidade corporativa empreendedora para solidificar nas suas
politicas-publicas de integração social. A igreja através dos seus altos
dirigentes adotou o estilizado modus operandi caótico de subordinação ao poder
para em troca obter os favores que o grande capital lhe proporciona para
deleite dos dirigentes e subordinados comprometidos.
Infelizmente temos uma igreja que se encontra
totalmente de cócoras, miserável, fraca, fragilizada e pecaminosa, que de mãos
estendidas para a cidade alta, suplica por quaisquer 30 moedas ao seu novo
deus, o ditador José Eduardo dos Santos. Mesmo havendo diferenciações nos dogmas
e ritos das igrejas, elas deveriam no mínimo assumir teologicamente um
conceito hermenêutico único aceitável.
Um tribunal francês agendou para 6 de Junho a leitura da sentença do caso envolvendo André Rodrigues Mingas, que reivindicou para a Frente de Libertação do Estado de Cabinda (FLEC) a autoria do atentado os militares angolanos que faziam a escolta à selecção de futebol togolesa.
Ainformação, relativa a um ataque ocorrido naquele enclave a 8 de Janeiro de 2010 e que então provocou dois mortos, foi divulgada hoje pela embaixada de Angola em Paris. O incidente aconteceu à entrada naquele território e envolveu disparos de metralhadora contra a coluna militar que fazia a escolta ao autocarro da comitiva togolesa.
A FLEC luta pela independência de Cabinda, enclave de onde provém a maior parte do petróleo angolano, e considera que o enclave é um protectorado português, tal como ficou estabelecido no Tratado de Simulambuco, assinado em 1885.
A informação da embaixada angolana acrescenta que o julgamento de André Rodrigues Mingas, natural de Cabinda e com nacionalidade francesa – à data auto-intitulado Chefe do Estado-Maior da FLEC Posição Militar (PM) -, está a ser acompanhado, na 16.ª Câmara Correccional do Tribunal de Grande Instância de Paris, pelo vice-procurador-geral da República de Angola, Domingos André Baxe, e pelo embaixador de Angola em França, Miguel da Costa.
No documento não é pormenorizada a acusação que recai sobre André Rodrigues Mingas, que a partir de França, onde reside, terá reivindicado para a FLEC a autoria deste ataque.
O atentando ocorreu naquele enclave durante a Taça das Nações Africanas em futebol, provocando então a morte a dois togoleses, além de 13 feridos, incluindo elementos da polícia angolana que escoltavam a caravana da selecção do Togo.
Entre 2011 e 2012, Rodrigues Mingas esteve detido em França, cerca de um ano, à conta desta investigação, mas as autoridades francesas libertaram-no por falta de elementos que justificassem a continuação da detenção, indicou na altura a sua advogada, Solenn le Tutour.
Na nota da embaixada é referido ainda que o antigo guarda-redes da selecção do Togo, Kodjovi Dodji Obilalé, gravemente ferido durante o ataque, testemunhou em tribunal.
Em Fevereiro de 2016, e após um período de acalmia, a FLEC anunciou a retoma da “via militar” até à disponibilidade “séria e concreta” do Governo angolano para o diálogo sobre a autonomia de Cabinda.
Deste então, o braço armado da FLEC, as Forças Armadas Cabindesas (FAC) já reclamaram a autoria de dezenas de vítimas mortais entre elementos das Forças Armadas Angolanas.
Em Janeiro de 2011 dizia o órgão oficial do regime angolano, o Jornal de Angola (JA), que “o embaixador angolano em França, Miguel da Costa, recordou, em Paris, aos diplomatas, que o Governo angolano mantém vivas as expectativas de ser feita justiça às vítimas do atentado de Massabi (Cabinda), perpetrado a 8 de Janeiro de 2010 contra a selecção de futebol do Togo, que iria participar no CAN 2010.
O JA, como manda a cartilha do MPLA (em muitos aspectos ainda é a mesma do tempo do partido único), mistura meias verdades e mentiras para tentar dar credibilidade a quem a não tem.
É admissível que o regime louve todos aquele que lhe vão comer à mão (incluindo supostos jornalistas) e que ataquem os seus adversários. Esquece-se, no entanto, de dizer que o ataque não foi feito contra a selecção do Togo mas, isso sim, contra a escolta militar e policial angolana à comitiva togolesa.
Além disso, importa não esquecer, as autoridades angolanas aproveitaram o incidente com a equipa de futebol do Togo para tentar arrasar, de uma vez por todas, todos aqueles que em Cabinda (e não só) entendem que devem lutar pacificamente pela sua causa. Falharam mas continuam a tentar.
Relembre-se ainda que, apesar de Cabinda ter quase tantos militares das FAA como população, Angola vangloriou-se antes do CAN 2010, que tinha blindado o território e que nada iria acontecer.
José Eduardo dos Santos, presidente do MPLA (partido que governa Angola desde 1975) e da República há 38 anos sem ter sido nominalmente eleito, mandou para Cabinda todos os meios militares considerados suficientes para que nem uma mosca perturbasse o êxito do CAN 2010.
Luanda, segundo o JA, ficou por isso satisfeita com a prisão do cidadão francês de origem cabinda, Rodrigues Mingas, que reivindicou o ataque em nome da FLEC-PM.
“De facto, uma decisão do Tribunal de Apelação de Paris ordenou a colocação de Rodrigues Mingas sob prisão preventiva, até ao julgamento final. Tanto o Procurador-Geral da República quanto o juiz de instrução concordam que há matéria criminal bastante que indicia a sua ligação ao terrorismo”, escreveu o JA.
Terrorismo mau, acrescente-se. Isto porque há terrorismo bom, que é – por exemplo – aquele que Angola pratica em Cabinda, onde pensar de forma diferente do regime ocupante é à partida um crime contra a segurança do Estado.
Aliás, tal como em Angola, quem em Cabinda não for do MPLA é considerado criminoso até prova em contrário. Que o digam, entre outros, Francisco Luemba, Raúl Tati, Marcos Mavungo ou Casimiro Congo.
Escreveu na altura o JA que “o assumido mentor do atentado (…) tinha sido indiciado em Dezembro passado pela justiça francesa por associação de malfeitores com relação a uma organização terrorista e encontrava-se em regime de supervisão judiciária”.
Assim, a FLEC é uma organização terrorista tal como, durante muito tempo, durante a guerra colonial, foi considerado o MPLA. Não está mal.
“A justiça francesa está, neste caso concreto, a colaborar na procura da aplicação do direito aos factos decorrentes dos crimes cometidos no dia 8 de Janeiro em Cabinda”, concluiu Miguel da Costa.
Ou seja, porque a comunidade internacional (Portugal, CPLP, ONU etc.) atribui mais valor à razão da força do que à força da razão, a FLEC teve de mostrar (embora de forma débil) que também sabe usar a força pura e dura.
Se, como acontece no caso de Cabinda, o regime angolano só aceita dialogar com aqueles que estão de acordo, que outra solução haverá que não passe pela linguagem das armas?
Haver eleições num país não significa que esse país seja democrático. Actualmente, quase todos os países mais ou menos ditatoriais, brutais ou autoritários procedem a eleições. Na República Islâmica do Irão, um regime denominado teocrático, há eleições para vários órgãos, como a presidência da República ou o Parlamento, embora o poder final e soberano não resida neles. A China também se orgulha do seu processo democrático de base. As eleições tornaram-se um adereço de qualquer governo. Contudo, muitas vezes não servem para nada, a não ser frustrar os desejos da população e acelerar uma revolução política por outros meios.
Angola está a atravessar um momento desta natureza. Tem eleições marcadas, as pessoas desejam mudança. Oxigénio real e não oxigénio saído das botijas do poder. E, contudo, poucos acreditam que essa mudança provenha das eleições. Será outro evento que, um dia, promoverá a mudança.
Não devia ser assim. A teoria da representação política democrática cria um vínculo forte entre poder e eleições. A votação deveria determinar a vontade, organização e actividade do poder político.
Por isso, os cidadãos angolanos não só têm o direito de participar nas eleições, como também deveriam ter o direito de saber por si próprios se o processo eleitoral é válido. É a validade do processo eleitoral que garante a legitimidade necessária para o exercício do poder político.
Para que as eleições respeitem os seus objectivos democráticos e sejam válidas, devem ser autênticas.
É justamente a autenticidade das eleições que está em causa neste Agosto de 2017 que se aproxima. A autenticidade das eleições baseia-se em dois princípios essenciais:
i) Integridade;
ii) Credibilidade.
Integridade implica que todos os votos são contados para o cálculo dos resultados e que o partido que cada eleitor escolheu é o que aparece no seu voto e na tabulação final. Não pode haver distorção entre o momento da escolha e o resultado. Trata-se de um princípio vinculado à estrutura interna do processo eleitoral, que procura garantir que cada voto vale e corresponde ao que foi emitido.
A credibilidade assume uma expressão externa e está ligada à necessidade de a comunidade política ao redor se sentir confiante no processo eleitoral. A credibilidade é baseada na percepção pública de que o processo eleitoral não tem interferência externa, e de que os resultados são verdadeiros.
Saber que o processo eleitoral decorre de forma autêntica é a base para a confiança da população nas eleições e nos seus governos. Em suma, não basta haver eleições, é necessário que os seus resultados sejam confiáveis.
O que foi descrito acima como fundamental para o processo eleitoral não está, contudo, a acontecer em Angola.
Hoje Angola é formalmente uma democracia, mas a realidade é que se trata de uma democracia “falsa”, com um partido quase único que dominou o Estado e um presidente no poder durante os últimos 37 anos. As características democráticas básicas da independência judicial, do Estado de Direito ou dos direitos das minorias não são respeitadas. Os direitos humanos são muitas vezes violados. E os resultados das eleições correspondem sempre ao esperado, e atribuem consecutivamente uma confortável maioria ao partido presidencial.
Acontece que o país está num beco sem saída devido a pressões económicas e sociais. Para evitar uma revolução ou a renovação de um confronto intenso, as eleições devem ser uma resposta e não uma parte do problema.
É por estas razões que o processo eleitoral em curso tem que ser revisto do ponto de vista da credibilidade.
Deve ser autorizada a participação de instituições plurais e de controlos variados, por exemplo:
– Contagem local e imediata dos votos, com anúncio dos resultados, excepto nos sítios onde haja perigo de ataque de leões ou outras feras.
– Participação de organizações civis, como a Igreja, os jornais e portais livres, enquanto partes integrantes do processo de certificação do registo eleitoral, de contagem de votos e de publicação dos resultados.
– Existência de vários órgãos e agentes eleitorais, e não apenas a CNE ou o MAT.
Um sistema caracterizado pela espontaneidade, pelo pluralismo na certificação dos resultados e com uma alargada participação e deliberação de pessoas de diferentes sectores da sociedade é a única forma de garantir credibilidade às eleições. Caso contrário, estas não servem para nada, e a mudança acontecerá por outros meios.
A 24 de Abril passado, José Eduardo dos Santos exarou o Decreto Presidencial n.º 78/17, que permite aos trabalhadores estrangeiros não-residentes serem remunerados em moeda estrangeira. No dia seguinte, teve início a greve geral dos professores do ensino primário e secundário. Ao terceiro dia, 26 de Abril, o presidente anunciou a realização das eleições a 23 de Agosto de 2017.
Por Rafael Marques de Morais (*)
Temos aqui três questões interligadas, em termos de prioridades do regime e de valorização dos angolanos.
Em Março passado, José Eduardo dos Santos – qual patriota – exarou o Decreto Presidencial n.º 43/17, que anulava os pagamentos em moeda estrangeira para os estrangeiros não-residentes, de modo a garantir “um tratamento mais equilibrado” entre estes e a população nacional. Passado apenas um mês, deu-se conta de que não há qualquer necessidade de equilíbrio entre nacionais e estrangeiros. A prioridade são os estrangeiros.
Por sua vez, o Sindicato dos Professores (Sinprof) entregou um caderno reivindicativo ao executivo de José Eduardo dos Santos, em Agosto de 2013, com cinco pontos básicos. A poucos meses das eleições, os professores observaram duas greves gerais intercaladas, para que o governo se disponha a responder apenas, e à sua maneira, a duas dessas cinco reivindicações. Os professores exigem a actualização das categorias profissionais; o pagamento de subsídios; o reajuste salarial face à depreciação do kwanza; a transição do regime probatório a efectivo, nos termos da lei; e, finalmente, a melhoria de condições de docência.
Aquando do anúncio da primeira greve dos professores (agendada para 5 a 7 de Abril), o regime reagiu com brutalidade e aparato através de uma federação sindical ligada ao MPLA. Os órgãos da comunicação social do Estado publicaram então as seguintes declarações: “Tal comportamento só revela o comprometimento desse sindicato com forças ocultas, que pretendem criar um clima de perturbação do processo democrático e de paz que o país conhece.” A reivindicação do Sinprof foi catalogada como “execrável”.
Portanto, para o MPLA, a exigência de dignificação dos professores é produto de forças ocultas, um atentado à democracia e à paz. É um acto execrável.
Para o governo angolano, manter a paz e a democracia significa aceitar a subjugação, a inferiorização e a humilhação da maioria dos angolanos. É o neocolonialismo sem máscaras.
Qual é a ligação entre a reposição dos “direitos” dos estrangeiros não-residentes e os professores? Sem professores satisfeitos não há educação, e sem educação não há progresso, mantendo-se a dependência em relação aos estrangeiros. Esta tem sido a principal estratégia do MPLA para manter o poder sobre todos os angolanos: roubar-lhes sempre a soberania e a dignidade.
Um dos líderes do Sinprof, João Francisco, argumenta que “Angola tem bons quadros. O problema maior é a sua valorização pelo governo. O Ministério da Educação nunca se preocupou com a valorização dos professores”.
Estamos perante um círculo vicioso que tem de ser quebrado. Por isso, para garantir o desenvolvimento sustentável de Angola, é muito mais importante pagar aos professores do que aos estrangeiros. Qualquer outra opção política é pura falácia.
A coragem do Sinprof ao relevar as ameaças do regime e prosseguir com a sua demanda obrigou o governo do MPLA a entrar em diálogo. A sua contraproposta cinge-se apenas à promoção dos professores, contrariamente à exigência do Sinprof sobre a actualização de carreiras. João Francisco dá um exemplo sobre o que está em jogo nesta questão: “Há professores licenciados, com 25 a 30 anos de carreira e outros à beira da reforma, que ganham como professores auxiliares (no escalão seis, o mais baixo da categoria)”. Num caso deste tipo, segundo a contraproposta do governo, a promoção do professor faria com que subisse apenas um escalão e não a assumir a categoria/escalão compatível com a sua experiência e os seus anos de serviço.
Sobre a exigência de pagamento de subsídios, o Ministério da Educação reconhece que o Decreto Executivo Conjunto n.º12/96 prevê o pagamento aos professores de subsídios de atavio (3%), risco (4%), transporte (5%), alimentação (5%), exposição indirecta a agentes biológicos, químicos e físicos (5%) dedicação exclusiva (7%) e docência (8%).
“Todavia, pelo histórico de processamento de salários na função pública, não foram implementados os subsídios de atavio, transporte e docência”, justifica o Ministério das Finanças no seu relatório sobre as exigências dos grevistas, aprovado pelo presidente.
O ministro das Finanças, Archer Mangueira, invoca a aprovação do Estatuto Orgânico da Carreira dos Docentes do Ensino Primário e Secundário, Técnicos Pedagógicos e Especialistas de Administração da Educação para concluir que “ocorreu uma revogação tácita do Decreto 12/96, não sendo por isso justificável o pagamento dos subsídios reclamados”.
“É óbvio que não há revogação nenhuma expressa ou tácita na legislação em vigor sobre subsídios. O que a lei determina é que se faça uma lei própria sobre o tema. Enquanto não for feita essa nova legislação, é aplicada a que está em vigor, designadamente o Decreto Executivo Conjunto 12/96 de 8 de Março”, nota o analista jurídico Rui Verde.
“Isto quer dizer que o parecer enviado ao presidente da República pelo ministro das Finanças está errado no seu ponto 12 [referente aos subsídios]. O artigo 42.º, ao contrário do que se diz no parecer, salvaguarda a situação jurídica dos subsídios, explicitando que esta terá de ser objecto de legislação futura própria. Não tendo havido essa legislação depois de 4 de Março de 2008, é aplicado tudo o que seja anterior e estivesse em vigor”, remata o jurista.
Portanto, há 21 anos que o governo não paga subsídios por si aprovados para os professores. Agora, o mesmo governo diz que os seus decretos estão tacitamente revogados, e o presidente aprova a mentira do ministro das Finanças. O mesmo presidente que, no espaço de um mês, revoga um decreto que afecta trabalhadores estrangeiros.
Como nota o jornalista Manuel Luamba, “a ideia de se pagar ao estrangeiro não-residente em moeda estrangeira é boa. Vai fazer com que os mesmos consigam enviar dinheiro para as suas famílias. Mas, se há dinheiro para pagar aos estrangeiros, porque não pagam também em dólares ou euros aos nacionais que trabalham para as empresas estrangeiras e instituições internacionais?”
A estudante de Direito Samanta Ribeiro refere que o pagamento em moeda estrangeira “é a única forma de governo e empresas manterem em Angola os estrangeiros que asseguram o funcionamento de áreas vitais do país, para as quais os angolanos não têm competência ou são em número insuficiente”.
“Mas só os estrangeiros terão direito aos dólares? E os angolanos não? A medida do presidente é discriminatória”, argumenta.
“Será que não é possível termos um governo que se preocupe de facto com o País e com o povo? A mentalidade da própria sociedade, que não reage, assusta. Ou mudamos de mentalidade ou isto será sempre um círculo vicioso.”
E assim chegamos às eleições, para relegitimar o neocolonialismo. Reclamar a dignidade da maioria dos angolanos, sobretudo dos educadores, é, na óptica do regime, contra a paz que amordaça os angolanos e os despoja das suas riquezas. Afinal, a outra opção, na lógica do MPLA, é a bala.
O antigo vigário-geral da diocese de Cabinda, Raul Tati, vai liderar a campanha eleitoral da UNITA em Cabinda e será assim, como estatuto de independente, o cabeça-de-lista do Gala Negro por aquele círculo. É fortíssima esta aposta de Isaías Samakuva. Para os cabindas será, talvez, o mal menor.
Por Orlando Castro
Sabemos que Raul Tati tem boa memória. Terá Isaías Samakuva também essa característica? Ou esta aposta é uma mera estratégia eleitoral da UNITA? “O estado que temos idealizado nas nossas mentes é o país de todos, de Cabinda ao Cunene e do Moxico ao mar, não queremos um país que discrimina as pessoas na base da sua região ou camisola política”, disse em tempos o líder da UNITA.
Barbaridades destas já foram ditas por muitos supostos dignitários dos putrefactos areópagos da política Portuguesa (sendo que Portugal tem o ónus de ainda hoje ser a potência protectora de Cabinda). De Cavaco Silva a José Sócrates, de Passos Coelho a Paulo Portas, todos disseram, ou dizem, o que o dono de Angola manda dizer sobre a colónia angolana de Cabinda. António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa ainda não disseram o mesmo apenas porque ainda não vieram ao beija-mão.
Importa por isso que os cabindas, tal como os angolanos, não se esqueçam desta esclarecedora afirmação de Isaías Samakuva. Não creio que Raul Tati a tenha esquecido. Penso, aliás, que a ideia é, nesta fase, pedir a ajuda da hiena para derrotar o leão. Depois? Depois se verá se a seguir à derrota da hiena não vai o leão comer quem lhe pediu ajuda.
Por muito que custe à actual UNITA, importa recordar que o seu fundador e primeiro presidente, morto em combate pelo MPLA em Fevereiro de 2002, Jonas Savimbi, reconheceu em várias intervenções públicas que Cabinda nunca fez parte integrante de Angola, nem antes, nem durante, nem depois da retirada do colonizador português.
Recorde-se que o então Presidente da República portuguesa, Cavaco Silva, ouviu no dia 20 de Julho de 2010, em Luanda, as preocupações do líder da UNITA, Isaías Samakuva, relativas ao processo de democratização de Angola, à situação na “província” angolana de Cabinda, bem como um apelo às responsabilidades históricas de Portugal.
Afinal, em que é que ficamos? Se Cabinda é – como diz Samakuva – parte de Angola, porque razão o líder da UNITA falou a Cavaco Silva da situação e apelou às responsabilidade históricas de Portugal?
Nessa altura, a UNITA aproveitou o quase monólogo que manteve com Cavaco Silva para dizer ao presidente português o que ele não queria ouvir, sobretudo porque no que a Angola respeita a visão portuguesa era (como continua hoje a ser) obrigatoriamente coincidente com a do MPLA.
Seja como for, Cavaco Silva – que nunca se enganava e poucas vezes tinha dúvidas – continuou a dizer o que mandava a cartilha oficial do MPLA, esquecendo que as relações entre os dois países, bem como com Cabinda, começaram bem antes de 1974.
Mas da mesma forma que Cavaco Silva dizia que as últimas eleições foram livres e justas, e que Angola vai de Cabinda ao Cunene, vamos continuar a assistir ao mesmo discurso em relação às eleições de Agosto. Aliás, em Belém e em São Bento, o discurso apologético já deve estar escrito.
“Falamos ainda sobre o caso de Cabinda, em que Portugal também tem responsabilidades históricas e o governo português pode desempenhar um papel na pacificação porque, com os contactos privilegiados que Portugal tem com o governo angolano e com a sociedade de Cabinda, pode-se encontrar uma forma de fazer com que o diálogo surta efeitos”, disse então o líder da UNITA.
Se Cabinda, como disse Samakuva, faz parte de Angola, não se percebe o que levou o líder da UNITA, da actual UNITA, a pedir apoio específico para este caso.
Pelo que a seguir se passou é de crer que Cavaco Silva não tenha registado uma única ideia das que foram apresentadas pela UNITA. Para Portugal, de Cavaco Silva como de Marcelo Rebelo de Sousa, a democracia em Angola esgota-se no MPLA. Para Portugal, Angola é o MPLA e o MPLA é Angola. O resto é paisagem.
Se a UNITA, tal como os cabindas, acredita mesmo em Portugal, o melhor é ir pensando muito bem porque «sekulu wafa, kalye wendi k’ondalatu! v’ukanoli o café k’imbo lyamale!» (morreu o mais velho, agora ireis apanhar café em terras do norte como contratados).
A autonomia para a “província” de Cabinda foi, aliás, uma das propostas do anteprojecto de Constituição da UNITA, apresentado em Maio de 2009 em Luanda pelo seu líder, Isaías Samakuva.
Seria meio caminho andado… se os donos do poder da potência ocupante, Angola, a isso estivessem receptivos. Mas não estiveram nem estarão, tal é a ambição desmedida pelo poder e pelas enormes riquezas naturais de Cabinda. E se calhar o MPLA até tem razão.
Para quê dar autonomia se, como diz o presidente da actual UNITA, Angola vai de Cabinda ao Cunene?
A UNITA no seu anteprojecto de Constituição elegeu a descentralização político-administrativa de Cabinda, por entender que é, era, seria, a via para a resolução da “complexidade dos problemas históricos” do que chama enclave.
A proposta referia que só essa “descentralização” permitiria “maior agilidade, participação democrática e eficiência” na administração territorial e “consolidação da paz política e social” em Cabinda.
Talvez por ter sido escrita em português, a proposta da UNITA não conseguiu ser digerida pelos donos do poder que, diga-se, só falam uma língua: o “mplaês”. Vê-se agora que também não foi entendida pelo próprio presidente do Galo Negro.
Mas, como dizia Jonas Savimbi, ainda é a dor que nos faz andar, ainda é a angústia que nos faz correr, ainda são as lamúrias e as lamentações, que de vários cantos do país nos chegam, que nos fazem trabalhar; ainda é a razão dos mais fracos contra os mais fortes que nos faz marchar.
E eu penso, desde há muito tempo, que Cabinda não faz parte de Angola e que, por isso, deve ser um país independente. Dir-me-ão alguns, sobretudo os que se julgam donos de uma verdade adquirida nos areópagos da baixa política angolana (MPLA e UNITA) ou portuguesa (PSD, CDS e PS), que isso é uma utopia.
Mais coisa menos coisa, são os mesmos que há umas dezenas de anos diziam o mesmo a propósito da independência de Angola, de Moçambique, da Guiné-Bissau, de Cabo Verde, de Timor-Leste. São os mesmos que há pouco tempo diziam algo semelhante a propósito do Kosovo. São os mesmos que nesta altura dizem o mesmo quanto ao País Basco.
Mas, tal como se disse em relação a Angola e ao Kosovo, um dia destes estará por aqui alguém a falar da efectiva independência de Cabinda.
Até que esse dia chegue, continuará a indiferença (comprada com o petróleo de Cabinda), seja de Portugal, da Comunidade de Países de Língua Portuguesa ou até mesmo da comunidade internacional.
Embora, nesta questão, não acredite na sinceridade da UNITA, acredito nos nobres objectivos de Raul Tati. Veremos.
O cidadão quando ouve falar de fiscal, em Luanda (capital de Angola), associa (por longa e dolorosa experiência) sem pestanejar a actividade deste agente público, à de um reles bandido ou delinquente comum, com a diferença do primeiro portar um colete, com insígnias Fiscalização, cartão de identificação e andar numa carrinha oficial.
Por Sílvio Van Dúnem e Victória Balundo
Tirando estes elementos de identificação do Estado, a prática quotidiana é de autênticos bandoleiros que actual num não-Estado, como se fizessem parte de uma ampla organização mafiosa de malandros da ladroagem pública e do público. E, se calhar, eles até pensam isso mesmo.
Na realidade eles parecem os “tentáculos militaris” do roubo organizado para favorecer a raia intermédia, instalada nos órgãos dos governos provinciais e municipais, ou uma força de reserva, para qualquer eventualidade de provocação, junto dos populares, numa guerra, eles são mais um exército disfarçado, pago pelos contribuintes que são as suas vítimas.
O fiscal & gatuno do governador unidos
Ofiscal deveria, num governo democrático e responsável, comprometido com a cidadania, ser um agente de autoridade pública que a lei municipal ou provincial incumbe de fiscalizar ou harmonizar a actividade dos cidadãos, no perímetro das cidades, cabendo-lhe fiscalizar, orientar, prevenir e aplicar coimas ou multas a todos quantos estiverem a prevaricar. Em Luanda e em Angola não é isso que acontece, para além de serem analfabetos, são gatunos e assassinos.
Os fiscais ROUBAM a mando do governador provincial, que numa situação normal deve ser responsabilizado, como mandante. No entanto, os executores e mandantes sabem que a situação não seria normal se Angola fosse aquilo que não é – um Estado de Direito. Mas como não, fazem da anormalidade a sua normalidade.
Um fiscal digno desse nome, tem a sua acção quotidiana, dominada pela ética, moral, respeito e conhecimento mínimo da lei, pelo que deve, didacticamente repreender a conduta ou prática menos correcta ou desordeira do munícipe para que as liberdades e os direitos individuais, em especial o de propriedade tanto a pública quanto a particular, consignados na Constituição de Angola, sejam exercidos em ambiente de transparência e leal concorrência.
Mas, fundamentalmente, o trabalho dos fiscais, não deve descurar os momentos dos países e Angola vive, um momento crítico, principalmente, face à desmobilização de milhares de militares, sem pensão de reforma, reservistas, desempregados, por encerramento diário de empresas, constituindo as mulheres a única fonte de receitas para manter o lar e as crianças na escola.
Quando um governo manda fiscais, ou agentes policiais, para o terreno, não pode deixar de ter em linha de conta pormenores importantes como a salvaguarda da sua imagem e seriedade, para não cavar recalcamento nos cidadãos. Infelizmente, quando se esperava outra postura, com a subida do general Higino Carneiro, como governador de Luanda, os seus agentes, parecem a sua “mão militar”, numa espécie de quadrilha qualificada de delinquentes e de gatunos, que roubam os pobres, como se para beneficiar o chefe, a quem as autoridades policiais ou do Ministério Público já deveriam abrir processos criminais.
A acção de um verdadeiro fiscal, num governo responsável e de cidadãos, centra-se na prática de exames, vistorias, perícias, verificações, avaliações, denúncias e a regular a actividade comercial ambulante dos cidadãos.
Nestes actos em repetidas resistências, podem contar com a colaboração da Polícia, nos casos de apreensão ou interdição de venda permanente, numa dada zona da cidade.
“Roubam-nos e ainda nos fo….”
“Eles são brutos. Batem-nos, arrastam-nos, roubam-nos, ´dormem´ connosco e até já mataram duas amigas minhas por causa de negócio. Esses fiscais do governo do MPLA são matadores”, denuncia a zungueira Maria Kambila.
Vendedora nas artérias principais e secundárias no eixo Luanda, Viana, ele levanta-se às 4h30 minutos da manhã e vem para a estrada acompanhada pelo marido ou um irmão até à estrada, onde espera pelas suas amigas: “A Tucha que vende sandes, ovo e às vezes fruta e a Rosa, que zunga, produtos de limpeza. Assim mesmo que nos juntamos já são 5 ou 5 h15 minutos e começamos a descer, chamando os clientes”.
Ela veio do Bié, onde o marido foi incorporado, com 15 anos no serviço militar obrigatório, “apanharam-no por ser já grande e julgaram que era mais velho. Assim mesmo, agarraram-no, foi para o Kuando Kubango e parou na 4 classe, portanto a sua vida foi só mesmo a tropa, não aprendeu lá mais nada”.
Os anos de vivência marital fê-la mãe, também, muito cedo; 16 anos e de lá para cá, não mais parou, “pois eu gosto de ter filhos e do meu marido”, diz com um brilho de alegria no rosto.
Apesar de ser uma mulher sofrida, pobre e batalhadora, considera-se feliz e aos 28 anos de idade, é mãe de oito (8) filhos. “Parecem muitos, mas se temos um bocado de pirão (funje) e conduto (acompanhante, pode ser ervas – lombi-, peixe ou carne), comemos uma vez por dia e quando não chega, tomamos pão com chá, mas eles estão na escola, com o bocado que fizemos.”
Ao falar no plural, questionámos se, afinal o parceiro trabalhava, ao que respondeu afirmativamente. “Ele vende um pouco de kapuka (bebida espirituosa caseira), para não ficar sem fazer nada e cigarros também”, esclarece.
Esta mulher batalhadora, que acorda todos os dias de madrugada, considera ser feliz, apesar e tudo… Fica triste, “quando nós, o povo que nos sacrificamos, para não estarmos todas na vida da p…, quando os fiscais nos rusgam, nos roubarem mesmo as coisas. Se não nos querem porquê que o governo não arranja serviço para os nossos maridos ou mesmo para nós? Isso um dia vai dar muito problema, pois o meu filho mais velho um dia já quis dar uma pancada num fiscal kapiqueno, li (lhe) salvou o outro que tinha arma”, recorda.
Maria Kambila, conta ainda que todo este seu sofrimento se deve ao facto de que “o marido era das FAPLA e foi desmobilizado em 1992, mas não ganha e não consegue trabalho, assim o pouco que ele arranja compramos negócio que eu tenho de zungar na cidade ou parar numa praça de rua”, justifica, esclarecendo, ter sido assaltada, pelos fiscais de Viana, do Cazenga e Ingombotas, por seis vezes e nunca conseguiu recuperar os seus produtos, “porque estes fiscais não prendem as coisas, não passam papel de multa. Eles roubam-nos e batem-nos”, lagrimeja, quando avança: “Uma minha amiga, depois de a roubarem, arrastaram-na num dos carros e foram dormir com ela numa geral. São mesmo porcos, mas um dia, esses fiscais da merda, vão pagar, por isso que estão a fazer às mulheres dos outros, por sermos povo e ninguém nos defender”.
“Até na rua pagamos taxa, mas ainda nos correm”
As mulheres, melhor, estas mulheres zungueiras ou vendedoras, como se quiser chamar, são mesmo uma espécie batalhadora e sofrida, que pelos filhos, marido e família, fazem de tudo, arriscam a vida, para com a sua actividade levarem um pequeno lucro que lhes permita transformar em pão. Diariamente pagam aos fiscais da administração uma taxa entre 50 e 100,00, que não sabem para o que servem, já que não arranjam a rua, nem colocam urinóis.
Quando se depara, com elas, nas bermas das estradas, estendendo um pano ou colocando a bacia ou balde, para, independentemente, dos riscos montarem bancada, como o fazem, na rua conhecida como das Pedrinhas, na Terra Nova. Elas sabem, que os fiscais do Governo, não são sensíveis ao drama das populações e que o governo não elabora estudos sociológicos para interpretar esse fenómeno, pese as informações de violações e mortes causados pelos seus agentes no desempenho (musculado) das acções quotidianas de fiscalização.
Joana Maria há 16 anos marca de forma aleatória a bancada nesta via e fá-lo num exercício de senta/levanta, seguido de frenética correria de 100 ou 600 metros para salvar, não à pele, qual atleta, mas o produto do lucro, qual “Bíblia Familiar”, quando chegam os fiscais e “sem nos perguntar começam só a correr connosco, “atoamente”, para nos roubar os produtos, porque não podemos ficar aqui, mas então se no mercado não tem lugar, vamos mais aonde, meu Deus”, lamenta.
Ela tem quatro (4) filhos para alimentar, como mãe e pai, “pois o meu marido fugiu e esse é o meu refúgio. Tenho todos os dias de lutar para pagar as propinas da escola dos meus filhos, para pôr comida na mesa, mas passamos por muita coisa neste mercado da pista, que só Deus sabe”, asseverou.
Mas nessa luta desigual, nem sempre escapam as garras dos fiscais, pois quando nos apanham ou nos batem, roubando o produto ou levam-nos com os produtos e nos fecham lá, no serviço deles, às vezes mesmo, por três dias, ficamos presas a fazer serviço de limpeza, até nas celas e às vezes de noite uns mais bandidos nos obrigam a se dormir, para nos fazer soltar e como temos filhos, às vezes caímos mesmo em meio campo”, conta, desesperada Domingas Ngola.
Pese estas dificuldades de terem de “rivalizar” com o lixo dos moradores, dos armazéns e delas, não desistem de arriscar a vida e estão sempre preparadas, nesses frenético “senta e corre”, para receber os fiscais e agentes policiais da Administração do Rangel, “que não querem saber se temos ou não emprego, se os nossos maridos recebem pensão ou estão connosco. É só chegar e nos recebem os negócios, muitas vezes jogando-os fora ou levam em suas casas para o sustento dos filhos deles, prejudicando os nossos. É só Deus”, concluiu.
“Exploram-nos mesmo, porque são corruptos”
As zungueiras/vendedoras da rua dos Lotes do Caputo, contígua ao Mercado dos Congolenses, são ainda mais ousadas, no sofrimento e no enfrentamento do perigo, pois não tendo espaço no interior da praça, nem no largo frontal, decidiram montar barricada, nas vias laterais e circunvizinhas, num desafio à sobrevivência.
Estas mulheres, verdadeiras heroínas, batem-se em nome do estômago e da dignidade humana, ao resistirem ao alistamento, no cada vez mais numeroso exército “forçado” da prostituição, servindo ainda de tampão, para os filhos não se alistarem nas milícias da delinquência e droga, que controlam os bairros pobres da periferia e das zonas urbanas.
Domingas António tem noção de correr riscos, do local não ser apropriado, para a venda, que deveria ter uma bancada num mercado público, mas tem a realidade na frente. Os mercados escasseiam, os empregos também e a fome aperta. A FOME é o grande obstáculo a transpor, daí constituir a divisa do risco consciente.
A zungueira não está aqui, por querer desafiar os homens, mas por necessidade de trabalhar para ter um bocado para comprar comida e roupa de fardo para os filhos, “mas os fiscais não nos entendem, eles querem as estradas bonitas, sem se importarem se as pessoas estão feias devido à fome”.
Domingas adianta ainda que, “quando nos agarram, somos obrigadas a pagar para não ficarmos detidas ou para termos de volta os nossos negócios”, esclareceu, adiantando que “na semana passada, agarraram uma zungueira que o próprio comandante queria violar. A mesma foi até ao Comando Provincial de Luanda, mas ninguém a ajudou a resolver a situação”.
O país enfrenta uma forte crise económica, um desemprego galopante, que não pode deixar os actuais governantes insensíveis, uma vez exigirem medidas realistas, ligadas fundamentalmente, a sobrevivência condigna dos mais pobres, face a sua própria má política económica. A violência e as medidas administrativas paliativas, não resolvem os problemas, pelo contrário, podem agravá-los, com a criação de “crateras” no interior das pessoas. “Os fiscais devem parar de dar corrida as zungueiras porque, aqui encontram-se mães que são ao mesmo tempo pais, que sustentam as famílias”, apelou.
E olhando para o futuro, mesmo sabendo não haver oportunidades iguais, mostrou porque está na rua. “Os nossos filhos não têm empregos, assim como os nossos maridos. Como é que vamos sobreviver com essa crise? São muitos maus-tratos que nós enfrentamos todos os dias nessa via, que montamos a praça”, justifica Domingas António, com os olhos esbugalhados.
É verdade que todos, absolutamente, todos gostaríamos que a realidade fosse diferente, nas grandes cidades, principalmente, na cosmopolita Luanda, com uma população aproximada de 7,1 milhões de habitantes, mas entre a beleza do betão e a delinquência e prostituição ostensiva, face à falta de empregos quer oficiais como privados, preferimos as zungueiras e ambulantes a interpelarem do que um delinquente em cada semáforo ou esquina à luz do dia.