OS ESTUDANTES ANGOLANOS SOFREM NO PAÍS E FORA DELE
Enquanto muitos estudantes angolanos que foram estudar para Portugal, por conta dos familiares em Angola, abandonaram os estudos para trabalhar, devido às “dificuldades no envio de dinheiro”. Por cá, o MPLA descobriu que Angola precisa de mais qualidade nas instituições universitárias. É obra!
“Não temos um número exacto, mas sabemos que são muitos”, diz Luís Victorino, presidente da Associação de Estudantes Angolanos (AEA), que justifica a interrupção dos estudos com “a demora das transferências de dinheiro efectuadas de Angola”.
Segundo Luís Victorino, a AEA “tem negociado com as universidades portuguesas e instituições de ensino para que haja mais flexibilidade nos pagamentos das propinas, de modo a que os estudantes angolanos tenham a possibilidade de pagar as dívidas ou propinas em atrasos em prestações, para que não sejam impedidos de realizar os exames ou inscrições ou matrículas em anos lectivos seguintes”.
Alguns estabelecimentos de ensino têm respondido “positivamente” às intervenções da AEA, como é o caso do Instituto Politécnico de Setúbal, por exemplo, afirma Luís Victorino.
Angola vive uma grave crise financeira e económica decorrente da quebra da cotação do petróleo no mercado internacional, que se reflecte ainda na falta de divisas no país.
Esta situação provoca várias restrições na gestão de divisas e, consequentemente, coloca dificuldades nas transferências de dinheiro para fora do país.
O presidente da AEA destaca ainda o apoio que o Alto Comissariado para as Migrações em Portugal tem dado àqueles estudantes na “questão da legalização”, porque muitos ficam impossibilitados de renovar o título de residência por falta de dinheiro.
Actualmente estudam em Portugal cerca de 4 mil angolanos, entre bolseiros, de instituições públicas e privadas, e não bolseiros.
O presidente da AEA acrescenta que, em média, chegam anualmente chegam a Portugal 500 estudantes angolanos e que as áreas profissionais em que mais se destacam são o Direito e as ciências empresariais.
No âmbito das celebrações do Dia de África, que se assinala na próxima quinta-feira, dia 25 de Maio, a AEA, em conjunto com as associações de estudantes moçambicanos e guineenses e a comissão instaladora do Núcleo de Estudantes Africanos do Instituto Politécnico de Setúbal, organiza um encontro em que debaterá o passado, o presente e o futuro de África e as celebrações incluem música, poesia, gastronomia e trajes.
E como vai o ensino por cá?
Recém-chegado ao poder (só lá está há quase… 42 anos) o MPLA descobriu agora (entre outras pérolas) que Angola precisa de mais qualidade nas instituições universitárias. Quem o diz é o vice-presidente do MPLA e cabeça-de-lista às eleições de 23 de Agosto, João Lourenço.
Segundo o boletim oficial do partido, Jornal de Angola (JA), João Lourenço fez este alerta na abertura da reunião com a comunidade académica de Luanda e Bengo, em Outubro do ano passado, lembrando que o país “continua a exportar as suas riquezas em estado bruto para o exterior” (exportar para o exterior não está mal, não senhor), para depois comprar de volta os produtos transformados a preços exorbitantes. Além disso, sublinhou, a atitude contribui para dar emprego aos operários de outros países em detrimento dos angolanos.
Diante de milhares de académicos, segundo as contas do JA, João Lourenço pediu atenção à qualidade do ensino superior, numa altura em que existem 24 instituições de ensino superior públicas e 40 privadas, surgidas num espaço de 14 anos. Até 2002, Angola tinha apenas uma única universidade pública, a Universidade Agostinho Neto, e duas privadas que, no total, formaram no mesmo período 62.407 quadros.
“Precisamos de encontrar o ponto de equilíbrio entre a necessidade da formação massiva de quadros que o país precisa e o rigor na qualidade desses mesmos quadros superiores”, disse João Lourenço, para acrescentar: “Devemos encorajar e promover a cultura de premiar o mérito no ensino, o mérito no trabalho e em tudo o que fazemos”.
Ou seja, João Lourenço disse que os angolanos devem olhar para o que o MPLA diz mas não, é claro, para o que faz. Isto porque se no regime existisse de facto a cultura do mérito, muitos dos seus quadros, ditos superiores, estariam a plantar couves.
O vice-presidente do MPLA disse, continuamos a citar o boletim oficial, que o crescimento que o país vive na construção de estradas, caminhos-de-ferro, barragens hidroeléctricas, fábricas, portos e aeroportos, hospitais e fazendas agrícolas, deve ser acompanhado de formação de quadros que possam garantir a continuidade e manutenção dos projectos. “Apesar da maior necessidade que o país tem na formação de quadros é necessário assegurar a sua qualidade a todos os níveis de ensino”, disse João Lourenço.
João Lourenço recordou (numa manifesta passagem de um atestado de matumbez aos angolanos) que o MPLA sempre estabeleceu como prioridade a educação e o ensino nos seus programas de governação, através de atribuição de bolsas de estudo para países como Cuba, Rússia, Portugal, França, Reino Unido, Itália, EUA, Nigéria e Marrocos.
“Foram milhares os quadros angolanos superiores formados em diferentes áreas do saber nesses países e que hoje contribuem para o desenvolvimento do nosso país”, disse.
Não se pode querer tudo
Por sua vez, o presidente da associação das universidades privadas de Angola, José Semedo, defendeu uma parceria estratégica entre o Executivo, instituições de ensino, empresas públicas e privadas, instituições financeiras, fundações, bancos e as famílias, para a elevação e a concretização da qualidade de ensino no país.
José Semedo lembrou que nenhuma instituição angolana consta da lista das 100 melhores universidades de África, ao passo que Moçambique e Cabo Verde, que têm a mesma idade política, aparecem entre as melhores do continente.
É verdade. Em contrapartida, Angola é um dos países mais corruptos do mundo, é um dos países com piores práticas democráticas, é um país com enormes assimetrias sociais, é o país com o maior índice de mortalidade infantil do mundo. Não se pode querer tudo, não é?
“A implementação de um quadro jurídico-legal e uma lei do mecenato para o ensino superior pode, a médio e longo prazo, modernizar e elevar a competência, a qualidade e excelência dos nossos quadros”, disse José Semedo, em representação das 40 instituições privadas do país. José Semedo reconheceu que a qualidade de ensino feito nas instituições nacionais é contestada na sociedade e uma grande parte dos licenciados formados não possui conhecimento científico, técnico e tecnológico que permite a sua inserção no mercado internacional.
Que a maior parte dos supostos quadros superiores são, afinal, quadros inferiores, todos sabemos. Tal como sabemos que são esses que o MPLA chama para funções públicas. E chama porque, sabendo eles que nada sabem, prestam-se a todos os fretes e fazem da fidelidade canina e do culto ao chefe o seu principal doutoramento.
Ingresso deficiente
Areitora da Universidade Agostinho Neto, afirma o boletim oficial, lamentou o facto de a admissão de alunos com notas inferiores a dez valores estar a aumentar de ano para ano. Maria Sambo revelou que, em 2015, o número de admitidos com notas inferiores a dez valores representou 53 por cento. Em 2016, a percentagem subiu para 58 por cento.
É tudo uma questão de perspectiva. Dez valores num aluno que seja militante do MPLA é, clara e inequivocamente, uma nota que equivale a 20 valores…
“A admissão de estudantes previsivelmente mal preparados, valorizando-se a classificação obtida no exame de acesso, como único critério de selecção, constitui uma garantia de deficiente prestação, salvo raras excepções”, disse a reitora, para quem o processo de aprendizagem dos estudantes que ingressam com notas negativas torna-se difícil, ainda porque muitos dos jovens têm condições económicas deficitárias e há falta de apoio social nas instituições de ensino superior.
Há falta de apoio social? A sério? Então o MPLA não é Angola e Angola não é o MPLA?
Maria Sambo destacou ainda outro aspecto: “Não há boa transição entre o ensino secundário e o ensino superior, não há agências que financiem a investigação científica, nem mecanismos de avaliação da qualidade do ensino superior”.
Não é bem assim, senhora reitora. A avaliação é feita, com qualidade divina – acrescente-se, pelo regime. E não há que estar preocupados. O guia supremo do país, José Eduardo dos Santos, está atento…
Por outro lado, disse a reitora, a docência é pouco atractiva, porque o estatuto remuneratório não condiz com o grau de exigência e qualificação e com a importância social do docente universitário. Maria Sambo falou ainda de outra dificuldade que a Universidade Agostinho Neto enfrenta.
“A prática da investigação científica é ainda muito débil, há insuficiência de estrutura de apoio e de recursos humanos para a investigação científica e não há editais, nem financiamento público sistemático para candidaturas do projectos de investigação”, disse.
A Universidade Agostinho Neto também tem carência de pessoal administrativo qualificado e técnicos diferenciados para a investigação. Além disso, existem docentes com dupla efectividade. “Tem sido impossível admitir novos docentes e a promoção de docentes está congelada. Estas dificuldades abrangem a carreira docente e de investigação, tornando-as pouco atractivas”, disse, acrescentando que desde 2014 não se realiza concurso público no ensino superior.
A visão… mesmo quando se é cego
Por sua vez, o secretário do MPLA para a política Económica e Social, Manuel Nunes Júnior, afirmou que Angola tem de vencer o atraso científico e tecnológico, sendo isso uma condição crucial para o progresso económico e social e que uma das principais implicações da globalização é a facilidade com que a tecnologia e as ideias fluam entre países.
Ao apresentar as principais orientações da Moção de Estratégia do presidente do MPLA, o guia supremo, querido líder, “escolhido de Deus”, José Eduardo dos Santos, para a formação de quadros, Manuel Nunes Júnior afirmou que a política do seu partido sobre o ensino superior assenta no conhecimento e na criação de novas ideias. A chave do crescimento e prosperidade das nações, disse o político e professor universitário, são as ideias e o conhecimento e não são os objectos. Os objectos, referiu, desgastam-se com o tempo e perdem o valor.
Lindo. Nem a princesa Isabel dos Santos, diria melhor…
O economista disse que a capacidade humana de produzir novas ideias e novos conhecimentos é infinita. “Muitos países não conseguiram tirar vantagem da revolução industrial e não prosperaram. Torna-se agora imprescindível tirar os benefícios da sociedade do conhecimento que caracteriza o presente processo de globalização”, disse.
Manuel Nunes Júnior lembrou que a diferença entre países ricos e pobres e em termos do desenvolvimento são fenómenos recentes. Os países que conseguiram tirar vantagens da revolução prosperaram e os outros ficaram para trás em termos de crescimento económico e de prosperidade.
“Estamos a viver uma nova revolução em que a sociedade industrial está a dar lugar à sociedade do conhecimento e Angola não pode ficar fora dessa sociedade do conhecimento. Deve dela tirar todas as vantagens”, disse este especialista.
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