Será Angola a tábua de salvação para a actual crise portuguesa? Serão os angolanos os grandes investidores em Portugal? É o que parece à primeira vista. Mas será realmente assim?
Nos últimos meses de 2012 e no início de 2013 muitos são os comentários que se têm ouvido, quer em Angola, quer em Portugal, principalmente nas ruas e nas redes sociais sobre a “nova colónia da ex-colónia”.
Paira no ar um sentimento de insegurança e incerteza por parte do povo português no sentido de perceber o que se passa. Será que Portugal vai beber do próprio veneno que espalhou noutros tempos? Quem pode garantir que assim será? Ou não?
A actual crise financeira, sobretudo enraizada na Europa, e pela qual Portugal atravessa como um dos piores momentos da sua história está a provocar profundas oscilações e mudanças políticas, organizacionais e, principalmente, empresarias.
As grandes empresas e os grandes impérios económicos portugueses, nomeadamente no sector bancário, da construção civil e das telecomunicações têm sofrido um forte abalo devido à sua incapacidade de fazer frente à falta de liquidez.
Com o desemprego a aumentar a um ritmo frenético, as empresas e grupos económicos têm procurado nos empresários angolanos, brasileiros, chineses, e não só, uma fuga à insolvência ou à banca rota.
A encabeçar a lista de maiores accionistas na criação de parcerias e na compra de empresas, está a engenheira Isabel dos Santos. Esta mulher de negócios, de apenas 40 anos, é filha do Presidente da República de Angola, José Eduardo dos Santos e é vista por uns como uma solução para os problemas financeiros em Portugal e por outros como um perigo eminente que, em representação da sua família, tenta “colonizar” a antiga colónia.
Exemplos disso são as mais recentes aquisições de acções, em grande parte, da maioridade da ZON TV Cabo, Banco Espirito Santo e marca Sonae, com o Continente e a Optimus.
Para além das “compras”, Angola tem apostado nas parcerias e na tomada de decisão de levar para Angola as grandes empresas portuguesas, principalmente na área da construção civil, banca, indústria alimentar, tais como a Caixa Geral de Depósitos, Banco Santander Totta, BFA, em representação do BPI, Millennium Angola, Mota-Engil, Teixeira Duarte, Soares da Costa, a Portugal Telecom, a Zon (Tv Cabo), a Galp, o Jornal Sol e, mais recentemente, os supermercados Continente.
Este é o reverso da medalha com o total aproveitamento das capacidades económicas que Angola apresenta neste momento, face ao período conturbado para as empresas portuguesas que sobrevivem, dia a dia aos aumentos de impostos e de imposições por parte do governo português, condicionados pelas exigências da Troika.
Portugal está à venda? Esta é uma das perguntas que paira no ar. Vão respondendo alguns países em ascensão económica. Um deles é Angola. Curiosamente, Angola, uma ex-colónia portuguesa que conquistou a sua independência em 1975. Desde essa altura e, principalmente a partir do momento em que estabilizou, após a assinatura da paz em 2002, este país da África Sub-Sahariana está a crescer, a procurar a sua reconstrução nacional, baseada no desenvolvimento político e económico em que os investimentos fora de portas conferem-lhe, cada vez mais, um estatuto de novos patrões africanos e atentos aos grandes e milionários negócios um pouco por todo o Mundo.
NEGÓCIOS AO PREÇO DA UVA - Para além de Angola, também o Brasil e a China são duas potências em franco desenvolvimento e crescimento económico. As suas apostas não se observam apenas em Portugal, mas sim um pouco por toda a Europa. No entanto, a afinidade com o país à beira mar plantado tem cativado a sua atenção.
À parte do comércio e do turismo, Portugal representa para estas novas potências emergentes economicamente uma “apetecível” ocasião para fechar bons negócios, a preços bastante convidativos.
A crise em Portugal não é desejável pelos países ditos irmãos mas tem sido muito “agradável” adquirir acções de várias empresas em diferentes sectores. Empresas com história no mundo dos negócios, com credibilidade e mercado a nível internacional.
Casos gritantes como os da privatização da EDP, RTP, TAP ou, mesmo, a CIMPOR suscitaram o interesse a estes países que estão a atravessar uma fase economicamente positiva e que têm poder de compra. Para Portugal é favorável, na medida em que precisa de capital que possa fazer face à dívida ao FMI.
Economicamente, esta movimentação pode ser muito interessante; no entanto, em praça pública, a população lusa teme não só que Portugal perca as suas grandes empresas e que a privatização das mesmas seja um “mau negócio”, como teme por uma “vingançazinha” do passado, ainda muito recente. As opiniões dividem-se. Muitos questionam: de onde vem tanto dinheiro? Quem nunca jogou ao Monopólio. É isso mesmo! O mercado e os grandes accionistas angolanos observam as oportunidades. Vão comprando pequenas percentagens. Sempre que têm uma oportunidade avançam. Porque dinheiro abunda. Fruto da indústria diamantífera e do petróleo, os empresários vão conseguindo aos poucos ganhar terreno no capital das empresas que procuram soluções rápidas e a todo o custo.
Os negócios mais sonantes e que têm o “dedo e os dólares angolanos” já existem no mercado, quer português, quer angolano com bastante expressividade.
Os números são variáveis e sempre mantidos debaixo de grande secretismo. Para os portugueses, valores aceites, muito abaixo do mercado real, para os angolanos com mais um excelente investimento para proporcionar ao seu país o acesso a melhores serviços.
Investimento esse que se estima já ultrapassar os 200 milhões de Euros, com participações da Sonangol no BCP, na Galp, na compra da ESCOM ao grupo Espírito Santo, na participação das acções na Amorim Energia, Banco BIC, o BPI que representa o BFA e a Zon TV Cabo que deu origem à ZAP, tal como a Portugal Telecom deu origem à Unitel e agora mais recentemente a entrada da Sonae em Angola, não só pelos hipermercados Continente como também pela compra (ainda em negociação) da Operadora móvel Optimus.
Este sucesso nos mercados internacionais deve-se a uma frescura que Angola consegue manter desde o início desta crise financeira global. O PIB angolano continua a crescer anualmente três vezes mais do que o resto do mundo. Algo que continua a surpreender e a tornar este país cada vez mais atrativo para investir e emigrar.
Para além de todo este investimento, reconhecido a nível internacional e que vai sendo publicado pela comunicação social, há um outro tipo de investimentos que chama à atenção e atrai as mais variadas opiniões. As compras. O comércio. As visitas, cada vez mais frequentes, o luxo procurado nos hotéis, nos restaurantes, nas lojas, nas discotecas.
Um mundo verdadeiramente à parte e invejado por quem anda a contar os trocos para poder comer.
“É um pouco estranho ver esta nova sociedade angolana que vem para Lisboa e que gasta numa loja de roupa ou numa discoteca cerca de 1000 Euros numa única peça de roupa ou numa garrafa de champanhe. Para quem está a passar por apertos para poder colocar comida no prato, acho que nós, os portugueses, nunca estivemos habituados a ver um luxo destes vindo de um país que sempre foi falado pela guerra e pelo que se ouve. Mas alguém tem que investir em Portugal, se tiverem que ser os angolanos, pois que seja”, disse Vanessa Soares.
É notório, entre as conversas que se ouvem nos cafés, nas lojas e até falando com alguns empresários, é percetível o gosto e a procura dos angolanos pelos produtos portugueses.
“Como luso-angolano, prefiro que as empresas portuguesas sejam vendidas a empresários Angolanos do que a chineses ou outro qualquer país, não só pela ligação umbilical que os dois países têm, como por ser neste momento de grande importância para a exportação de mão-de-obra e bens de consumo. As grandes empresas portuguesas sempre foram geridas na base do compadrio e chulagem, com cargos importantes para familiares e amigos. Trabalhei numa grande empresa durante 13 anos e constatei esse facto. Actualmente uma das maiores empresas portuguesas foi adquirida na sua totalidade por capital brasileiro e em poucos dias alteraram tudo o que tinha a ver com comportamentos burgueses e mordomias de parte das chefias. Por estes e outros motivos, sou a favor de mudança de mentalidades e claro, a entrada de dinheiro fresco”, contou à Figuras & Negócios, Wilson Lima, angolano naturalizado português que vive entre Angola e Portugal à procura de melhores oportunidades de vida.
“Este é daqueles tópicos que vão dar que falar...do que me tenho apercebido, o principal objetivo é conseguir implementar o negócio dessas empresas em Angola ao mais baixo custo possível. É mais barato comprar a empresa e assim trazer a tecnologia know-how e profissionais para cá (Luanda) do que pagar pelos serviços e patentes. Penso que não será por uma questão de investimento em Portugal... não trás grande lucro, pelo menos atualmente”, expressou Tito Martins, mais um português que encontrou em Angola a escapatória para a crise e para o desemprego.
PORTUGUESES EM ANGOLA NÃO PARAM DE CRESCER
A crise, o desemprego e a sombra da Troika têm “empurrado” os portugueses, cada vez mais para a saída do país e Angola, como um novo mundo de oportunidades, tem sido um dos destinos mais procurados.
Desde 2003, os serviços de emigração estimam que de 21 mil tenham passado a residir e trabalhar em Angola, mais de 100 mil portugueses. Já a circulação de angolanos passou a fazer-se no sentido contrário. Desde 2009, o número de angolanos ou com dupla nacionalidade a chegar ou a regressar a Angola aproximou-se dos 30 mil.
Portugal está em crise. À beira da banca rota. Já partiram para Angola quatro vezes mais portugueses do que angolanos chegaram a Portugal.
As oportunidades crescem e quem está com a corda no pescoço tem que pensar rápido e partir. Na mala vão as esperanças e o desejo de que a crise acabe rapidamente. O que parece ainda estar apenas sob uma miragem. Especialmente numa fase de reconstrução nacional e ascensão que vão permitindo abertura ao mercado internacional de trabalho.
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