segunda-feira, 1 de agosto de 2016

LUANDA: A Batota das Próximas Eleições Está na Inconstitucionalidade da Lei do Registo Eleitoral

Batota: A Inconstitucionalidade da Lei do Registo Eleitoral

Fonte: Makaangola/Rui Verde1 de Agosto de 2016
Depois de algum tempo no poder, os ditadores convencem-se de que são muito inteligentes e inexpugnáveis.
É nessa altura que começam a repetir os erros que os conduzirão à queda.
Os últimos tempos têm sido profícuos em asneiras. Desde as danças com o FMI, à ineptidão a lidar com o processo dos 15+2+1, até à descredibilização da Sonangol. Em todas as frentes, sucedem-se as asneiras da ditadura plebiscitada angolana.
Mesmo assim, o ditador não percebe que chegou a hora de abandonar o cargo de modo razoavelmente pacífico, preferindo insistir em “ganhar” as eleições de 2017.
Para “ganhar” essas eleições, lançou um vasto plano, de que faz parte a nova Lei do Registo Eleitoral.
Esta lei, ao arrepio do que está escrito na Constituição de Angola (repito, na Constituição Angolana, não na do Burkina Faso ou do Burundi), atribui ao presidente da República a organização do registo eleitoral.
Isto quer dizer que são os serviços auxiliares do presidente, neste caso o Ministério da Administração do Território (MAT), quem define o universo dos votantes. Assim, na prática, será o presidente-ditador (através dos serviços auxiliares) quem vai controlar se os “mortos” votam, se alguém vota duas vezes ou se, pelo contrário, é impedido de votar. O corpo eleitoral é definido pelo MAT.
Naturalmente, tal arranjo viola directamente o artigo 107.º, n.º 1, da Constituição (CRA). Dispõe este artigo que:
“Os processos eleitorais são organizados por órgãos de administração eleitoral independentes, cuja estrutura, funcionamento, composição e competências são definidos por lei.”
Em Angola, este órgão é a Comissão Nacional Eleitoral (CNE).
Por este motivo, estiveram muito bem os mais de 600 comissários eleitorais que subscreveram uma petição dirigida à Assembleia Nacional com referência a dúvidas que a lei levanta.
Não entrando aqui em muitos detalhes jurídicos, o ponto essencial é o seguinte: a CRA confere explicitamente à CNE — órgão eleitoral independente — a organização do processo eleitoral.
É ponto assente na literatura científica internacional que o processo eleitoral engloba o registo eleitoral. Da Nova Zelândia à África do Sul, o processo eleitoral engloba, sem excepções, o registo eleitoral. No fim de contas, é este que define aquele, porque é a população votante quem define as eleições. Em rigor, ao controlarmos a população votante, controlamos as eleições, sobretudo em países grandes e com deficientes sistemas de registos civis e de informações, como é caso de Angola. Utilizando a terminologia académica:
“Os cadernos eleitorais são um componente fundamental de qualquer sistema de votação. Os registos constituem a lista oficial de eleitores e são uma evidência prima facie do direito dos eleitores a votar. Portanto, é necessário encontrar o equilíbrio certo nos procedimentos de registo: é preciso rigor, para garantir a integridade das listas de pessoas, e ao mesmo tempo é preciso flexibilidade, para garantir que os direitos das populações a se inscreverem e votarem são protegidos."
Bem se vê a importância do registo eleitoral no conjunto do processo eleitoral e a necessidade de o manter fiável e transparente.
Não havendo dúvidas sobre a competência da CNE nessa matéria, nem sobre o facto de o momento do registo pertencer ao processo eleitoral, é imperativo concluir que tem de ser a CNE a organizá-lo.
Ao retirar à CNE a responsabilidade do registo, a Lei comete uma “batota” política e legal. Política, porque tenta atribuir ao governo o poder de definir o universo eleitoral. Legal, porque não cumpre a Constituição.
Este ponto é muito importante, pois não basta ganhar eleições. É necessário ganhá-las com legitimidade e transparência.
Realizar eleições que depois são contestadas por deficiência dos procedimentos constitucionais, é extremamente negativo. Mais uma vez, José Eduardo dos Santos quer legitimar-se ganhando as eleições por via da batota, como diz o povo.
Assim, antes que seja tarde, há que devolver a organização das eleições ao órgão competente, anulando a usurpação de funções constitucionais que foi levada a cabo pelo presidente da República.

domingo, 31 de julho de 2016

LUANDA: Suicídio ou Grito de Liberdade?


Suicídio ou grito de Liberdade?

Fonte: Folha8

Suicídio ou grito de Liberdade?
O ex-seminarista católico, Walter Filipe Silva, cuja subida meteórica na vida política se deveu a troca dos preceitos bíblicos pela abjecta “pregação-bajulante”, a sua majestade José Eduardo dos Santos, parece querer soltar-se das amarras presidenciais e ganhar independência.
Walter Filipe Silva enquanto “líder” dos destinos do BNA (Banco Nacional de Angola), como governador, não se coibiu de enfrentar a empresária Isabel dos Santos, detentora de dois bancos comerciais privados.
“Estimados senhores, vamos todos orar, para agradecer o dom divino do camarada presidente, sua excelência eng. José Eduardo dos Santos, por ter interpretado a vontade de Deus em me nomear governador do Banco Nacional de Angola”, assim, mais coisa, menos coisa, começou o discurso na reunião de apresentação, no BNA, Walter Filipe.
Um dos membros, alertou-o para o facto (irrelevante, como sabemos) de sendo o Estado laico não ser de bom tom (embora seja bajuladoramente eficaz), estas rezas, para além de as mesmas (orações), por si só, não serem bastante para retirarem o país da lama. Mas, é claro, louvados sejam os pobres de espírito – todos nós, segundo eles.
Mas o “bajú” sabe que idolatrando, em doses quilométricas o chefe, mesmo sendo, profissional e academicamente, incompetente, ser meio caminho andado para “trepar” os degraus das instituições públicas.
É o caso de Walter Filipe Silva, antigo “comenta(dor)-bajú” sofrível da TV Zimbo, mas pelo facto, sendo jurista de formação foi, (ir)responsavelmente, nomeado para exercer, em fase de crise, o governo do banco central: BNA, quando se impunha um quadro bancário ou economista de reputada competência. Impunha-se caso Angola fosse o que não é, um Estado de Direito Democrático.
Desde a sua nomeação, faz cerca de seis meses, ainda não tomou disposições blindadas para, como órgão regulador, impulsionar a banca nacional e estimular o relançamento da economia. Também não terá sido para isso que ele lá foi colocado. Pelo contrário, tem estado a tomar medidas que colocam em causa a actividade produtiva e de prestação de serviços de muitas pequenas e médias empresas, geradoras de milhares e milhares de empregos, por tendo kwanzas cativos nos bancos comerciais, não conseguem a obtenção de divisas, em tempo útil, para pagamentos aos fornecedores no exterior.
Para além disso, instalou o mau-estar na banca nacional, com medidas e posições infantis, como as acusações de boicote dos bancos com capitais portugueses, mas sem apresentar prova das práticas ilícitas. Neste caso, também não são necessárias provas. Basta a divina palavra que quem não sabe o que faz e muito menos o que diz. Tudo na normalidade o reino, portanto.
Ter-se-á, na certa, esquecido que um tal ataque, pode ter sido um primeiro tiro no pé, pois atacou, acusando de “candongueira”, precisamente a princesa Isabel dos Santos, filha primogénita, com bastante influência e poder, junto de quem o nomeou, pois esta é detentora dos dois principais bancos de capitais portugueses, nomeadamente, o BFA e BIC. “Lapsus linguae”? Na melhor das hipóteses. Na mais modesta e real, ignorância própria que quem confunde a o corredor de fundo com o fundo do corredor.
“Angola é uma porta frágil onde entra todo o tipo de risco financeiro”, acusou na ousada cruzada o novel governador do BNA, pondo em cheque os Serviços de Segurança de Estado, a Polícia Nacional, etc..
Uma fonte de F8 confidenciou, em função do quadro sombrio, dos seus dois bancos, ter Isabel dos Santos abordado o governador do Banco Nacional, para saber como poderia ajudar a desbloquear algumas situações, mas este não se fez rogado, destratando a princesa, numa sub-reptícia responsabilização pelo desvario em que se encontra a banca e a crise do país.
“Nunca vi coisa igual. A eng.ª Isabel limitou-se a ouvir e ir-se embora. Ela estava muda e queda, talvez não estivesse a acreditar, por atitude semelhante, habituada a que todos a prestem incontida vassalagem, quebrada por Walter Filipe. Mas não tenho dúvidas estar ela a preparar o troco a esta afronta”, assegurou a fonte que temos estado a citar.
Recorde-se que na altura, o ex-seminarista queixava-se da falta de condições para o cabal desempenho das suas funções, responsabilizando a marginalização do sistema financeiro internacional, aos “grupos empresariais estrangeiros e aos bancos de matriz portuguesa”, a operar em Angola, como forças de bloqueio e promotores da colocação de divisas no mercado paralelo, abastecendo as lavandarias de dinheiro e subindo o preço da nota, situada, actualmente, na casa dos USD 100,00 (cem dólares), a valer entre 54 a 55.000,00.
“Sendo isso verdade, ao ponto do governador falar em público, quer dizer que os Serviços de Inspecção do BNA, do Ministério das Finanças, da Polícia e do Ministério Público, já estão na posse de provas contundentes e irrefutáveis, sob pena de serem irresponsáveis as suas afirmações, lançando a suspeição num sector sensível, mas descredibilizando, também a instituição BNA”, explicou ao F8, o economista Nzola Matumona acrescentando ainda que, ao ser chamado à atenção, por quadros seniores antigos, em claro sinal de retaliação, “num dia exonerou todos os directores e chefes de departamento do Banco Nacional, substituindo-os, na maioria, por gente nova, sem experiência e vinda do exterior da banca”.
Importante recordar ainda as acusações proferidas há cerca de três meses, por Walter Filipe Silva, contra alegadas acções ilegais de alguns bancos e que o BNA vetaria o acesso às operações cambiais de empresas que estivessem na sua “lista branca” pelo cometimento de ilícitos financeiros.
E, nos últimos dias, consumou a promessa de forma contundente, procedendo ao desvio administrativo e sob coacção de grandes e médios clientes, dos bancos da princesa herdeira Isabel dos Santos: BFA e BIC, para outros, como única forma destes realizarem operações cambiais com o exterior.
“Isso é uma incongruência e grave violação as regras bancárias e legais em vigor, porquanto tendo um cliente, por vários meses, os kwanzas cativos, a espera da realização no seu banco da operação cambial, ao tomar conhecimento da autorização, por parte do BNA, três ou seis meses depois é confrontado, com a obrigatoriedade de ter de mudar de banco comercial, onde nem sequer tem conta bancária”.
Assim um grande operador económico, com conta num dos bancos onde Isabel dos Santos é accionista, pode, por vezes, ver gorada, por orientação expressa do banco central, a sua fidelidade e obrigado a abrir conta noutro banco
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sábado, 30 de julho de 2016

LUANDA: Brincadeiras no Tribunal Supremo: O Caso da Libertada Detida

Brincadeiras no Tribunal Supremo: O Caso da Libertada Detida

Fonte: Makaangola/Rui Verde 30 de Julho de 2016

Lídia Amões.
No dia 19 de Julho de 2016, o Tribunal Supremo publicou, na Tabela de Autos, a decisão referente ao julgamento do Habeas Corpus n.º 648 requerido por Lídia Amões há uns meses atrás, que já tinha obtido uma espécie de concordância tímida por parte do Ministério Público.
Nessa Tabela, pode ler-se em letra cursiva do secretário da câmara criminal do Tribunal Supremo o seguinte:
“Defere Dando provimento ao pedido de H.C. [Habeas Corpus] devendo o requerente ser restituído à liberdade provisória mediante Termo de Identidade e Residência.”
Simples e claro. O Tribunal Supremo decidiu e anunciou publicamente a sua decisão: Lídia Amões devia ser libertada.
Contudo, hoje, dia 30 de Julho de 2016, decorridos onze dias, Lídia Amões continua presa.
Que se saiba, o mandado de soltura não foi emitido. Não se conhece o acórdão que decidiu o Habeas Corpus. É como se a Tabela não tivesse sido publicada e os juízes não tivessem decidido.
Este processo de Lídia Amões servirá de exemplo literário da bizarria judicial. Primeiro, citou-se um morto, o seu irmão Azeres Amões, para ser preso. Agora prende-se uma libertada.
Entretanto, têm surgido comentários nas redes sociais segundo os quais o conselheiro-relator Martinho Nunes, do Tribunal Supremo, não terá concordado com a decisão, razão pela qual não terá escrito o acórdão, tentando em vez disso fazer com que os colegas voltassem atrás e mantivessem Lídia Amões detida. Outros afirmam que estava em preparação uma segunda decisão revogando a primeira.
Em termos legais, nada disto é possível. O poder jurisdicional do tribunal, de qualquer tribunal, esgota-se com a decisão. Tomada a decisão, acabou o poder.
Quer isto dizer que, salvo nos casos em que a lei prevê a possibilidade de o juiz rectificar a sentença, o seu poder jurisdicional esgota-se por imperativo jurídico. Por exemplo, um juiz não tem poder legal para anular uma sentença por si proferida, pois o seu poder esgotou-se nessa própria sentença.
Essa ausência de poder de jurisdição, por se tratar de vício essencial da sentença ou despacho, determina a invalidade do acto (da segunda decisão). Não constitui uma nulidade stricto sensu, mas sim uma inexistência jurídica da decisão. Quer isto dizer que qualquer segunda decisão que venha a ser proferida pelos mesmos juízes é inexistente.
A actividade jurisdicional é diferente da actividade administrativa. Nesta última, pode haver decisão seguida de revogação ou modificação.
Nos tribunais, toma-se a decisão, e esta só pode ser “mexida” por efeito de recurso a outro tribunal. Não pode existir recurso no Habeas Corpus, sob pena de se esvaziar o sentido e alcance desse mecanismo jurídico.
Obviamente, os colendos conselheiros, do Tribunal Supremo, sabem isto bem melhor do que nós no Maka Angola. Portanto, vamos assumir que Lídia ainda está presa porque os senhores juízes tomaram uma decisão sem terem escrito o acórdão, e agora não se entendem sobre quem deve escrevê-lo. Sendo grave, esta decisão não é inédita nos sistemas judiciais de influência portuguesa, e apenas exige trabalho.
A alternativa para explicar esta trapalhice é de âmbito político, e resume-se em poucas palavras. O poder político deu ordens para mudar a decisão, e agora os juízes têm de dar uma cambalhota enorme. Nesse caso, estaríamos perante uma situação de enorme gravidade, que implicaria a reacção veemente das opiniões públicas nacionais e internacionais.
Aquilo que este caso de Lídia demonstra para além de qualquer dúvida é que a justiça em Angola continua a ser uma farsa, não se podendo confiar nela.

sexta-feira, 29 de julho de 2016

LUANDA: Preço da Gasolina: Mais Uma História de Corrupção em Vista?

Preço da Gasolina: Mais Uma História de Corrupção?

Fonte: Makaangola/Rui Verde27 de Julho de 2016
O posto de combustivel da Sonangol indica o preço actual dos combustíveis.
Entre 2014 e 2016, o preço/litro da gasolina em Angola medido em euros (moeda não atingida pela inflação) aumentou, em termos reais, de € 0,40 para € 1,00.
O preço de 2014 era um valor baixo na tabela dos preços mundiais, equivalendo ao que se pratica nos Emirados Árabes Unidos ou na Nigéria. O preço actual já não o é, correspondendo ao nível da Índia, China ou Austrália.
A verdade é que em apenas dois anos o preço da gasolina mais do que duplicou.
A justificação oficial para estes aumentos é a de que se tem procurado cumprir as recomendações do FMI contidas no seu relatório sobre os combustíveis em Angola.
Como é habitual, esta justificação pretende escamotear parte da realidade e da verdade. O Relatório do FMI recomenda a redução dos subsídios ao preço dos combustíveis para aliviar o orçamento, ou seja, para reduzir a despesa pública, em tempos de queda das receitas do petróleo. O FMI também considera que a existência dos subsídios ao preço do petróleo promove a ineficiência da economia, além de impedir que o Estado invista em educação e saúde.
Assim, segundo o Relatório do FMI, o aumento dos preços dos combustíveis teria dois objectivos essenciais: diminuir a despesa pública como um todo e permitir o aumento da despesa em educação e saúde.
Na prática, nenhum destes objectivos foi alcançado (ou sequer tentado) através do aumento dos preços dos combustíveis e da eliminação gradual dos subsídios.
O problema essencial subjacente ao valor elevado dos subsídios e à presente subida abrupta dos preços dos combustíveis está nas margens fixadas para os importadores e distribuidores de combustíveis (o chamado sector downstream do petróleo).
O próprio FMI chama a atenção para o facto de as margens serem excessivas, por comparação internacional. São precisamente estas margens que contribuem para um elevado nível de subsídios. Diz o FMI:
“Para produtos refinados internamente, em vez do preço de mercado internacional, as autoridades usam um preço de referência que corresponde ao preço orçado para o petróleo bruto aumentado por uma margem de refinação fixada por decreto (12,5 por cento em 2014). O total das margens é de cerca de 43 Kwanzas (ou US $ 0,44) por litro, em média, em 2014, o que parece ser elevado para os padrões internacionais (Banco Mundial, 2005; FMI, 2013)." [sublinhado nosso].
As margens são, em termos simples, os lucros que as companhias que importam e distribuem petróleo obtêm. Isto quer dizer que, quando havia subsídios integrais, uma boa parte deles servia para sobrevalorizar as margens dos intermediários (em artigos anteriores no Maka Angola, vimos que esses intermediários são, essencialmente, uma associação entre o general Leopoldino Fragoso do Nascimento, companheiros palacianos e a multinacional Trafigura), para o seu lucro artificial. Assim, os lucros que obtinham não eram frutos da capacidade de negócios do general, mas do seu poder político e da capacidade de fixar administrativamente os preços acima dos valores de mercado.
Agora, provavelmente, uma boa parte do aumento do preço continua a servir para beneficiar as margens do general e seus amigos.
Portanto, estamos perante um problema de margens artificiais, de lucros artificiais. Só a concorrência efectiva poderá levar ao estabelecimento de preços de gasolina simultaneamente justos e eficientes. Na actual estrutura de mercado, estamos apenas a garantir lucros artificiais para os negócios do Palácio Presidencial. E quem paga é sempre o povo. Antes pagava através das receitas do Orçamento do Estado, agora paga através da compra de gasolina na bomba.
É esta opacidade do mercado em Angola que torna a economia pouco dinâmica e diversa e que levou o presidente a recusar a intervenção do FMI neste ano. Segundo várias fontes de Washington, o FMI queria executar um amplo programa de reformas que tinha dois objectivos: criar transparência nas contas públicas e liberalizar os mercados. Ora, isso seria a morte dos “artistas”.
Basta ler as declarações do representante do FMI em 14 de Junho de 2016 para compreender os objectivos definidos para Angola:
“Olhando para o futuro, é importante permitir que o sector privado lidere o crescimento económico. A promoção de um sector financeiro forte e de um ambiente propício para os negócios é, portanto, fundamental para incentivar a poupança e o investimento privados, que formarão a base para a diversificação económica. Também é fundamental melhorar a eficiência e a transparência das despesas públicas, uma vez que o sector público terá de fazer mais com menos recursos ".
Terão sido estes dois objectivos — mercado interno livre favorecendo a iniciativa privada, transparência e controlo dos gastos públicos — que assustaram José Eduardo dos Santos.

terça-feira, 26 de julho de 2016

LUANDA: Punir os Carrascos ao Serviço da Tirania de José Eduardo dos Santos, filhas & filhos Lda

Punir os Carrascos

Fonte: Makaangola/Rui Verde26 de Julho de 2016
Posto Policial de Ndala Mulemba, em Cacuaco, onde Flávio Carizo também foi torturado.
O polícia ata uma corda nos testículos de Flávio Carizo e puxa-a, apertando e espremendo os órgãos genitais do homem. Isabel dos Santos posa para a fotografia envergando um vestido vaporoso numa cerimónia de homenagem à actriz Sophia Loren em Nápoles, Itália. O polícia pega na muleta do perneta Bernardo Gaspar e utiliza-a para lhe bater sincopadamente, de forma selvagem. Isabel dos Santos surge airosa e colorida no Mar Mediterrâneo, perto de Barcelona, onde foi visitar o papá.
Todas estas imagens percorrem a minha mente como retratos alucinogénios de um Fellini angolano que um dia há-de surgir.
Flávio morreu da tortura. Bernardo acabou na prisão de Viana.
Isabel dos Santos brinda todos os dias a plebe com as suas fotos de alta-roda, acompanhadas por textos que parecem citações de um duvidoso livro de auto-ajuda.
De um lado, temos o trabalho árduo de alguns cidadãos angolanos, que denunciam constantemente as omissões e os atropelos da ditadura angolana.
Do outro, temos o trabalho de um marqueteiro português qualquer que acha que basta criar uma imagem de glamour, com fotografias de viagens acompanhadas de uns textos pirosos, para que Isabel dos Santos seja definitivamente considerada uma vencedora pelos seus conterrâneos. Se não fosse trágico, seria ridículo.
Bem pode a Constituição estabelecer que Angola é um Estado de Direito e proibir a tortura. Bem podem mil professores ensinar à exaustão que Angola é um Estado de Direito onde se proíbe a tortura; bem podem mil políticos discursar e afirmar que Angola é um Estado de Direito onde se proíbe a tortura.
Mas basta um texto como a Tortura e homicídio: sofrer e morrer às mãos da Polícia Nacional para desacreditar as mil e uma fotos e textos de propaganda sobre o sucesso de Isabel.
O ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Rui Mangueira, pode defender que o caso de tortura e assassinato de Flávio Carizo é apenas uma maçã podre que não contagia as outras, querendo com isso evocar a inefável metáfora do ex-presidente Bush a propósito da falência da Enron e das fraudes do seu amigo Kenneth Lay.
Não é esse o caso, mas se o ministro quiser provar o contrário, pode recorrer aos instrumentos jurídicos que estão à sua disposição.
A Constituição de Angola estipula, no seu artigo 36.º, a proibição absoluta da tortura. Este artigo é de aplicação directa e imediata, nos termos do artigo 28.º, n.º 1, da mesma Constituição.
Quer isto dizer que não são necessárias quaisquer outras normas, nem quaisquer conversas, para se tomar medidas. Todos os agentes do Estado têm a obrigação de investigar e punir actos de tortura.
Ao ministro não resta senão ordenar um inquérito criminal e disciplinar sobre os perpetradores dos actos de tortura e sobre os seus superiores hierárquicos.
Segundo a jurisprudência internacional, tanto é responsável pela tortura aquele que pratica os actos, como o que os ordena, ou os tolera.
A este propósito, vejam-se as condenações decretadas pelo juiz chileno Leopoldo Llanos, relativas a actos cometidos durante a ditadura de Pinochet. Diversas condenações aplicam-se àqueles que realizaram materialmente as torturas, e todas se aplicam ao seu general Manuel Contreras, chefe dos Serviços de Informação chilenos DINA. Em todos os casos julgados, Contreras foi considerado como responsável último, ou porque mandou, ou porque sabia, ou porque não fez nada para evitar os crimes dos seus subordinados, alimentando práticas recorrentes e quotidianas de tortura.
Em Angola, face ao exposto, deve ser aplicada a jurisprudência: instaurar um processo-crime e disciplinar aos agentes que praticaram os actos de tortura e o homicídio (e que estão identificados no texto acima referido), bem como aos seus superiores: o comissário Ângelo de Barros Veiga Tavares, o ministro do Interior; o comissário-chefe Ambrósio de Lemos, comandante-geral, e o comissário Eugénio Pedro Alexandre, director do SIC.
Todos eles são responsáveis pelos actos bárbaros que relatámos, e devem ser alvo de devido inquérito, para que, no mínimo, este tipo de vandalismo policial não se repita.
Não é com campanhas fotográficas no Instagram que se resolvem os problemas de Angola.
É com medidas reais, de pessoas reais, para pessoas reais.

segunda-feira, 25 de julho de 2016

LUANDA: A Farsa da Amnistia a Lá MPLA/JES

A Farsa da Amnistia

Fonte: Makaangola/Rui Verde 23 de Julho de 2016
O chefe da Bancada Parlamentar do MPLA, Virgílio de Fontes Pereira.
Parece que Virgílio de Fontes Pereira - antigo ministro de várias pastas do governo e actual líder do grupo parlamentar do MPLA - é jurista e tem um mestrado em Ciências Político-Jurídicas.
Foi este suposto mestre jurista quem proferiu a seguinte inaudita afirmação: “A concessão de amnistia a todos os crimes comuns, puníveis com pena de prisão até 12 anos, representa um acto de magnanimidade de Sua Excelência o Presidente da República.”
Falamos de Virgílio de Fontes Pereira como hipotético mestre jurista porque custa a crer que um verdadeiro jurista dissesse tamanho disparate, a não ser que pretendesse reconhecer que Angola é uma ditadura unipessoal, onde todo o poder provém do presidente da República. A não ser que quisesse assumir que as formulações constitucionais angolanas não passam de meros adornos da farda ditatorial de José Eduardo dos Santos, e que a Assembleia Nacional serve apenas de palco a actores bem remunerados cujo papel é aplaudir o ditador-presidente.
Como saberá qualquer jurista que se preze, a Constituição angolana não confere qualquer poder ao presidente da República para conceder amnistias, apenas indultos e comutações de penas. As amnistias são forçosamente concedidas pela Assembleia Nacional. Portanto, a magnanimidade coube à Assembleia Nacional, e não ao presidente. Aparentemente, trata-se de um mero detalhe jurídico, mas na verdade é um dos muitos indicadores da irrelevância prática da Assembleia Nacional e do poder presidencial absoluto. O presidente tomou a iniciativa, mas a decisão é da Assembleia. Há que repor a ordem jurídica das coisas.
Foi esta a primeira farsa da amnistia.
Para além de servir o propósito de endeusar o presidente em pré-eleições gerais de 2017, a amnistia é também uma solução hábil para duas trapalhadas na área da justiça: a questão dos 15+2 e a degradação do sistema judicial. Quem está preso? Que sentença cumpre? Por que está preso? Em Angola, muitas vezes não há resposta para este tipo de perguntas.
A verdade é que os casos 15+2 e Marcos Mavungo e as campanhas e reportagens sobre os presos políticos e as prisões puseram a nu um universo gulaguiano tropical, em que muitos juízes de primeira instância actuam de forma arbitrária e desconhecedora da lei, a polícia prende sem razão, as prisões têm condições desumanas, e muitos detidos ficam por lá a apodrecer sem razão.
Perante este quadro desolador da justiça, não havia dinheiro, nem força política para encontrar uma solução digna de um Estado de Direito, pelo que se optou pela amnistia. A amnistia é uma lavagem de face para a degradada justiça angolana.
Foi esta a segunda farsa da amnistia.
A terceira farsa da amnistia é a que tem consequências mais graves para o futuro do país. Sabe-se que estão em curso vários processos e queixas nacionais e investigações internacionais sobre os desmandos financeiros de altos dirigentes angolanos, a começar pelo presidente, seus filhos e generais associados. Ora, esta amnistia “limpa” todas as queixas existentes em território nacional e permite utilizar no estrangeiro um argumento já usado pelos tribunais portugueses em casos de alegados crimes de branqueamento de capitais: se o crime original não foi considerado crime, então a lavagem de dinheiro também não o é.
Aliás, o ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Rui Mangueira, tem tanta consciência deste facto que já veio muito habilmente dizer que, mesmo que os crimes sejam abrangidos pela amnistia, nos termos da Lei do Combate ao Branqueamento de Capitais e do Financiamento ao Terrorismo, as pessoas que tenham desviado dinheiros públicos têm de os devolver. Com a devida vénia, o senhor ministro deve estar a gozar. Como é possível provar que alguém desviou dinheiro sem uma investigação criminal? E como é que se pode instaurar uma investigação criminal sobre casos amnistiados?
A verdade é que, face a esta amnistia, a maior parte dos crimes económico-financeiros cometidos até 2015 deixam de existir, desaparecem para todos os efeitos. Ninguém os vai investigar. Podemos dizer que a lavagem de dinheiro foi lavada pela amnistia.
Contudo, a história pode não acabar aqui. Segundo a jurisprudência, qualquer amnistia que atente contra os direitos humanos fundamentais de um povo é considerada nula. E por isso, se um dia se comprovar que os desvios de dinheiro do Estado foram de tal monta que impediram o cumprimento da tarefa estatal de promover o direito à educação e à saúde, pode-se pensar em declarar nula a amnistia para esses casos de grande apropriação de dinheiros públicos. Portanto, no fim, a amnistia não salvará os corruptos.
A História terá a última palavra.





sexta-feira, 22 de julho de 2016

LUANDA: O Golpe da Sonangol e a Crise dos Combustíveis á Vista

O Golpe da Sonangol e a Crise dos Combustíveis à Vista

Fonte: Makaangola/Rafael Marques de Morais18 de Julho de 2016
Posto de abastecimento de combustíveis da Sonangol em Luanda.
A Sonangol deve US $1 bilião à Trafigura pela importação de combustíveis, e a situação poderá gerar mais uma crise no país.
Há já vários anos, a importação de combustíveis, nomeadamente gasóleo e gasolina, é praticamente dominada pela Trafigura, uma multinacional suíça. Através da sua subsidiária Puma Energy, que actua em Angola, a Trafigura é sócia do trio presidencial composto pelos generais Manuel Hélder Vieira Dias “Kopelipa”, Leopoldino Fragoso do Nascimento e Manuel Vicente, bem como da própria Sonangol.
Recentemente, a Sonangol tentou obter um financiamento de US $800 milhões junto de um banco sedeado no Egipto, propondo como garantia as suas acções no banco Millennium BCP em Portugal, para pagamento da referida dívida. O general Leopoldino Fragoso do Nascimento, que actualmente dirige os negócios da Trafigura em Angola, assim como do trio presidencial, tem sido o grande elemento de pressão para que a Sonangol pague a dívida.
Com a mudança de administração, as negociações finais para a concretização do empréstimo foram transferidas para a gestão de Isabel dos Santos. Das cinco prioridades da petrolífera nacional constam a resolução da dívida à Trafigura [e ao trio presidencial], bem como o pagamento da compra das operações da Cobalt International em Angola, que se tinha associado à empresa Nazaki Oil & Gas, do trio presidencial.
O general Leopoldino Fragoso do Nascimento é o testa-de-ferro dos grandes negócios do presidente José Eduardo dos Santos que não estão em nome da sua filha Isabel.  
A Sonangol gasta, mensalmente, entre US $150 e US $170 milhões com a importação de derivados de petróleo, e não tem quaisquer perspectivas de diminuição deste dispêndio a médio ou longo prazo. A situação é tanto mais grave quanto Angola se constitui como o segundo maior produtor africano de petróleo, ao mesmo tempo que se revela incapaz de construir uma refinaria, devido aos interesses privados de alguns dirigentes, que lucram com a importação de combustíveis.
De certo modo, a própria presidência tem impedido que se encontrem soluções e não tem procurado parcerias que lhe permitam reduzir a importação de combustíveis, o que passa, sem dúvida, pela construção de uma refinaria no país.
A futura refinaria do Lobito, cujas infraestruturas estavam em construção, teve inicialmente uma previsão de custos de US $5 biliões. Actualmente, a estimativa ascendeu a US $14 biliões, devido a factores de corrupção, obstrução política e criação de obstáculos à entrada de parceiros idóneos no projecto, conforme citam fontes do Maka Angola dentro da Sonangol.
Outra das soluções que a anterior administração da Sonangol tinha ponderado passava pela entrega de petróleo a uma refinaria sul-africana. Essa refinaria ficaria com uma parte do carregamento do petróleo e, em contrapartida, abasteceria o mercado angolano com refinados a um valor mais baixo que os impostos pela Trafigura e os seus associados da presidência da República.
No entanto, esta ideia foi abandonada porque Angola tem compromissos de pagamento do serviço da dívida, com carregamentos de petróleo, até 2026. Não há muito mais. Parte dos carregamentos são destinados à China, onde a Sonangol contraiu dívidas no valor US $15 biliões. No mercado europeu, através de financiamentos agenciados pelo Standard Chartered Bank, a Sonangol soma mais uma dívida  que ultrapassa os US $13 biliões. Ou seja, a petrolífera nacional deve mais de US $28 biliões.
Com o golpe à Sonangol, que levou a família presidencial e seus associados externos a controlar directamente a petrolífera, as operações ficam mais facilitadas. Este golpe vem na sequência de um primeiro em que, por indicação do general Leopoldino Fragoso dos Nascimento, o presidente nomeou o inexperiente jovem Valter Filipe para o cargo de governador do Banco Nacional de Angola.
Assim, o controlo da economia política do país passou para as mãos discretas do general Leopoldino Fragoso do Nascimento, que passou a ser – efectivamente e à sombra – a segunda figura mais poderosa do país.
Todavia, os graves problemas de tesouraria da Sonangol e a falta de divisas não poderão sustentar os gastos actuais de importação de combustíveis a médio prazo. Caso as rezas do poder para a subida do preço do petróleo não sejam ouvidas em breve, a crise dos combustíveis será outra realidade.