terça-feira, 3 de maio de 2016

LISBOA: A Falácia sobre os Investimentos de Isabel dos Santos em Portugal

A Falácia sobre os Investimentos de Isabel dos Santos em Portugal

Fonte: Makaangola/Rui Verde 2 de Maio de 2016
Alguns supostos sábios portugueses, daqueles que terão inspirado os "Relógios Falantes" de Francisco Manuel de Melo, gostam de abrir as suas bocas pomposas para falar dos “grandes investimentos da engenheira Isabel dos Santos em Portugal” e da sua enorme importância para a economia nacional. Ora, importância para a economia portuguesa tiveram ou têm António Champalimaud, Belmiro de Azevedo, ou o Orlando, o Esteves, o Amílcar e muitos outros pequenos e médios empresários que labutam no dia-a-dia, produzem e fazem com que as coisas aconteçam.
Quanto a Isabel dos Santos, analisemos somente um dos seus investimentos em Portugal, de modo a apreciarmos o estilo que a caracteriza e o impacto das suas iniciativas, apenas para concluirmos que estamos perante mais uma falácia, isto é, um “sofisma ou engano que se faz com razões falsas ou mal deduzidas” (cf. Dicionário Priberam da Língua Portuguesa).
O investimento em análise é a participação financeira de Isabel dos Santos no BPI (Banco Português de Investimento).
Esta participação começou em 2008, através da compra pela Santoro (empresa detida por Isabel dos Santos, sem movimento nem capital social significativo) das acções que o banco BCP (em Portugal) detinha no BPI, e que correspondiam a 9,7% do capital.
O Banco Comercial Português (Millenium BCP) atravessava uma crise de governação, e pouco antes da operação de compra e venda das suas acções no BPI, a Sonangol tinha-se tornado o seu maior accionista. Portanto, a operação BPI resulta de um acordo entre Isabel dos Santos, através de uma empresa oca, e a Sonangol (empresa dos petróleos angolanos). Não se conhecem os meios de pagamento usados nessa transacção. Mas, para todos os efeitos, tratou-se de uma transacção entre particulares que não beneficiou nem deixou de beneficiar a economia. Contudo, o valor do negócio é público. Rondou os 164 milhões de euros. Note-se que este valor é superior às cotações da altura em cerca de 30%, mas impôs uma menos-valia ao BCP de cerca de 300 milhões de euros, pois no momento em que o BCP tinha consolidado a sua posição no BPI esta valia 481 milhões de euros. Dependendo da perspectiva, o BCP, grosso modo, ganhou 30 milhões de euros ou perdeu 300 milhões de euros. Seja como for, começa por ser uma operação pouco clara, até porque simultaneamente, em Angola, Isabel dos Santos, através da Unitel, tomava conta de parte do capital do BFA. Seria interessante perceber os fluxos financeiros que ligam estas operações, bem como os efeitos colaterais e os empréstimos concedidos.
Talvez as únicas pessoas a ganhar com este negócio tenham sido os advogados que redigiram os contratos. É uma hipótese.
Mais tarde, em 2010, houve um reforço de capital no valor de 800 mil euros comprado em bolsa. Constituiu uma operação simples, sem relevo especial.
Foi somente em meados de 2012 que a Santoro (propriedade de Isabel dos Santos) comprou mais 9,4% do capital social, atingindo a posição de quase 20% que hoje detém. Esta compra, ironicamente, foi feita à CaixaBank (aquela que hoje “luta” com a Santoro), e permitiu a Isabel dos Santos duplicar a sua posição.
Mais uma vez, estamos diante de uma transacção financeira entre particulares. Novamente, para o retrato ficar completo, seria interessante saber-se quem a financiou e quais foram os efeitos colaterais.
No BPI, Isabel dos Santos não realizou qualquer investimento em termos económicos e nenhuma despesa em equipamentos de capital ou em meios de produção para o aumento da capacidade produtiva (instalações, máquinas, transporte, infra-estrutura). Limitou-se a firmar contratos de compra e venda cuja mais-valia agregada é igual a zero. Zero porquê? Porque não contribuiu para o aumento geral do stock de capital.
Ou seja, com a entrada da Santoro, a gestão do BPI não se tornou mais eficiente ou melhor.
O BPI não obteve qualquer “dinheiro fresco” aquando da entrada da Santoro. Não foi esse dinheiro que comprou mais máquinas, que contratou mais pessoal ou que internacionalizou a instituição financeira. Na realidade, o dinheiro de Isabel dos Santos (ou o dinheiro que esta utilizou) não trouxe qualquer benefício ao BPI – os benefícios foram apenas da LaCaixa e talvez (ou não) do BCP. Tratou-se de uma mera mudança de mãos de activos.
Este tipo de aplicação financeira é positivo para Isabel dos Santos se lhe der lucro, e é mau se lhe der prejuízo. Do ponto de vista do BPI, é tecnicamente indiferente, uma vez que se trata de uma mera troca de accionistas. Para Portugal, a operação só tem relevo se a Santoro obtiver alguma mais-valia e pagar impostos sobre a mesma, o que provavelmente, através da utilização da Santoro e de mecanismos com offshores, não acontecerá.
Portanto, quando no BPI se fala de “investimento” angolano, fala-se disto: de compra e venda de acções entre particulares sem efeitos significativos na economia. Nada mais, e com muitas pontas soltas em termos da origem dos fundos e eventuais efeitos colaterais.
Note-se, e aqui entramos no cerne da questão, que a compra da parcela do BPI ocorreu em 2008 e foi realizada ao Millennium BCP, que vivia na época uma crise suscitada em parte por interesses angolanos, que na mesma altura, através da Sonangol, totalizavam 10% de participação, tornando-se os maiores accionistas do próprio BCP. Repito: em 2008, Isabel dos Santos compra a parte do BCP no BPI, após a Sonangol se ter tornado a maior accionista do BCP. Refira-se também que o valor pago por Isabel dos Santos (embora acima do valor momentâneo de mercado) se traduziu numa menos-valia para o BCP. Outro facto: o primeiro-ministro de Portugal era José Sócrates.
Então, em 2008, o banco que acabava por estar controlado pelo pai, José Eduardo dos Santos, através da Sonangol (BCP), vende à filha (com uma menos-valia) as acções que detinha no banco BPI (aquele que domina o BFA em Angola), estando José Sócrates no poder. Este é o retrato da operação, e não outro.
Coloca-se então a pergunta: de onde veio o dinheiro da filha-princesa? Não foi certamente das actividades das Santoro 1 e 2, que constituem meras sociedades de participação e não tinham operações em curso de onde resultassem rendimentos regulares. Aliás, as Santoro foram criadas na mesma época, precisamente para servirem como veículos de aquisição.

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