REPESCAGEM: O CHEIRO PODRE DO NOVO GOVERNO DE ANGOLA
Aqueles que queriam ver mudança no novo governo anunciado por João Lourenço devem estar muito desiludidos. Se há histórias em que um sapo se transforma num belo príncipe, na nossa História são os velhos e irrevogáveis sapos que vêm formar o governo apresentado pelo novo presidente.
Comecemos pela análise da estrutura do executivo recém-formado. Se é verdade que houve uma ou outra fusão de ministérios, a disfuncionalidade orgânica continua, quer a nível político, quer a nível técnico.
As pastas políticas de apoio ao presidente foram insufladas. Há um director de gabinete com categoria de ministro e há um ministro de Estado e chefe da Casa Civil do Presidente da República. Não se percebe bem a diferença. Depois, temos um ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança do Presidente da República e um ministro de Estado do Desenvolvimento Económico e Social. Se considerarmos que estes quatro representam o topo político do Governo, temos ministros a mais, o que originará confusão e exercício paralelo de poderes.
Por sua vez, a nível técnico o emaranhado é ainda maior. Vejamos apenas a área económica, onde Lourenço afirma querer deixar marca. Temos um ministro de Estado do Desenvolvimento Económico e Social, um ministro da Agricultura e Florestas, uma ministra da Indústria, um ministro da Energia e da Água, um ministro dos Recursos Minerais e Petróleos, uma ministra das Pescas e do Mar, uma ministra da Hotelaria e Turismo, um ministro do Comércio e, surpreendentemente, um ministro da Economia e Planeamento. Desde logo se percebe que estamos perante uma concepção soviética da economia segundo a qual cada parte da economia tem de ter um ministro para a dirigir. Errado. Uma economia competitiva e de mercado necessita apenas de dois ou três ministros para enquadrarem e estimularem a actividade económica, não precisa de ministros para tudo. Além do erro ideológico, temos também um erro funcional. Vê-se logo que o ministro para o Desenvolvimento Económico e o ministro da Economia e Planeamento são uma e a mesma coisa. Para quê dois ministérios? Só vamos ter atropelos.
Se a estrutura governamental é pesada, ideologicamente conotada com a burocracia soviética e convidativa à atrapalhação, o elenco não anima.
Dediquemo-nos apenas a quatro cargos importantes:
– ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança do Presidente da República;
– ministro de Estado e chefe da Casa Civil do Presidente da República;
– ministro do Interior;
– ministro das Finanças.
Dediquemo-nos apenas a quatro cargos importantes:
– ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança do Presidente da República;
– ministro de Estado e chefe da Casa Civil do Presidente da República;
– ministro do Interior;
– ministro das Finanças.
Sobre os ministros das Finanças e do Interior, não há nada a dizer. São os mesmos do executivo anterior, pelo que não há relativamente a estas pastas um simulacro sequer de renovação.
Uma das poucas mudanças significativas foi a saída de Kopelipa da Casa de Segurança. A substituí-lo, entrou o general Pedro Sebastião. Mas Sebastião é um reconhecido passarão. No passado, foi ministro da Defesa e ganhou fama pela sua mão dura, estando ligado à famosa Escom e aos negócios dos Espírito Santo em Angola (antigos donos do BESA). Conforme publicámos na altura:
“Um caso paradigmático de profunda infiltração nas estruturas do poder em Angola é o Grupo Espírito Santo. Através da sua subsidiária em Angola, a Escom, tem parcerias com o governador do Zaire, general Pedro Sebastião, para beneficiar do projecto bilionário de gás liquefeito natural (LNG-Angola). O general detém 52,5 por cento da quota em cada uma das empresas criadas em parceria com a Escom, nomeadamente a Soyo Investimentos, a Imozaire e a Turisoyo.”
Fica assim reapresentado o general Pedro Sebastião, de quem se espera obviamente todo o empenho no combate à corrupção…
Como ministro de Estado e chefe da Casa Civil do Presidente da República, foi nomeado Frederico Manuel dos Santos e Silva Cardoso. Cardoso já ocupou a chefia da Casa Civil de JES entre 2008 e 2010. Nesse cargo, foi-lhe reconhecida tanta (in)competência, que rapidamente o alcandoraram para outros voos. Frederico Cardoso esteve ainda recentemente envolvido na polémica da sondagem brasileira da Sensus. Escrevemos recentemente a esse propósito no Maka Angola, num artigo que deixa clara a postura política de Cardoso:
“Entre 2003 e 2008, Frederico Cardoso exerceu as funções de director do Gabinete de Coordenação de Estudos e Análises do Comité Central do MPLA, e, de 2004 a 2008, foi, cumulativamente, chefe de gabinete do vice-presidente do MPLA, Pitra Neto.
Em 2008, então na qualidade de director da Valleysoft, Frederico Cardoso foi um dos pivôs da fraude eleitoral desse ano, e com isso foi recompensado com o cargo de chefe da Casa Civil do presidente da República. (…)
Esta Valleysoft, da qual Frederico Cardoso era sócio e gestor, formou consórcio com a infame empresa espanhola Indra para a provisão de soluções tecnológicas para o processo eleitoral. O custo inicial do contrato era de 61 milhões de dólares, mas foi logo inflacionado para 200 milhões de dólares.”
Mais um ministro que estará empenhadíssimo em combater a corrupção…
Mais um ministro que estará empenhadíssimo em combater a corrupção…
Uma nota final, ainda, sobre o ministro e director de gabinete do presidente João Lourenço, Edeltrudes Maurício Fernandes Gaspar da Costa. Anterior ministro e chefe da Casa Civil de José Eduardo dos Santos, Edeltrudes da Costa terminou a sua carreira ministerial envolvido no escândalo da usurpação de terras a uma pobre camponesa – Helena Teka – numa inefável situação que envolveu a morte de uma criança, violação sexual e variados desmandos. No Maka Angola, escreveu-se então:
“Porque não desiste de lutar para reaver a parcela de terreno de que reclama o direito de superfície, Helena Teka foi violada por militares, ameaçada de morte e recentemente informada de que será processada criminalmente por ‘burla’. O caso envolve o nome do ministro de Estado e chefe da Casa Civil do Presidente, Edeltrudes Costa, o comandante da Região Militar de Luanda, general Simão Carlitos “Wala”, o conselheiro do comandante da Marinha de Guerra de Angola, vice-almirante Pedro Chicaia, e outras altas patentes militares interessadas no terreno.”
O que pensar da nomeação de um homem metido nestas andanças?
Para este novo governo, foram repescados os velhos homens do aparelho e do regime. Então, que mudança é esta? O que é que está a ser corrigido?
É uma desilusão. Não há, como se diz na Bíblia, sequer “vinho novo sobre odre velho”, é tudo velho e apodrecido. Temos um governo de decadente continuidade.
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