sexta-feira, 10 de março de 2017

LUANDA: Tribunal Supremo "Oferece" Casa Com Piscina

TRIBUNAL SUPREMO “OFERECE” CASA COM PISCINA


Imagine que adquire por Escritura Pública ao Estado um terreno maltratado, onde existe um barracão a cair aos pedaços. Imagine que durante anos trata desse terreno como seu, constrói uma bela casa e uma piscina. Imagine, ainda, que passados uns anos o mesmo Estado vem dizer que o acto na base do qual lhe tinha vendido o terreno é nulo, e por isso tem de devolver tudo a outra pessoa.
Onde antes havia umas terras baldias com uma cabana semidesmantelada, agora está uma mansão com piscina. [ver fotos Antes e Depois] Qual o sentido de devolver o terreno com aquilo que lá se construiu? Adquire-se um barraco ao Estado, constrói-se uma bela casa, e depois o Estado vem dizer que tem de deixar tudo. Não faz sentido para nenhum cidadão razoável.
No entanto, é o que parece resultar de uma decisão tomada a 15 de Dezembro de 2016, no âmbito do processo 2203/15, pelos juízes do Tribunal Supremo Manuel Dias da Silva, Joaquina do Nascimento e Molares de Abril.
Vamos contar a história.
Em 1952, Sigrid Helga Margot Karh Brock adquiriu o terreno objecto da contenda que estava descrito na Conservatória do Registo Predial sob o artigo 8.104. Sigrid Brock saiu de Angola antes da independência.
Em 1999, o Estado angolano entendeu que o terreno cumpria os requisitos legais para ser confiscado, e por acto publicado em Diário da República, datado de 1 de Outubro de 1999, procedeu ao referido confisco.
É na sequência desse confisco que o Estado procede à venda do terreno a Marta Isabel Justo dos Ramos, através de uma Escritura Pública de Compra e Venda exarada em 17 de Dezembro de 1999.
Até 2010, Marta não teve conhecimento de qualquer acto relevante referente a esse terreno, e procedeu ao seu melhoramento e à construção da casa, piscina, relvado, etc., actuando sempre como se a propriedade fosse sua.
Contudo, sem que tal fosse feito público através de qualquer registo, como impõe a lei e o bom senso, em 21 de Março de 2003 foi decidida pelo Tribunal Supremo, no decurso do processo 45/2000, a anulação do confisco. A acção correu apenas entre Sigrid Brock e o Estado, não tendo Marta tomado conhecimento da mesma, nem tendo a acção sido registada.
Apenas em 2010, Marta Ramos, estupefacta, toma conhecimento de que o registo de propriedade a seu favor tinha sido cancelado.
Desde então, iniciou-se uma saga jurídica a que a justiça angolana não foi capaz de dar resposta adequada.
Marta Ramos colocou duas acções judiciais, uma contra a Conservatória do Registo Predial e outra contra os Registos e Notariado, que desde 2010 aguardam decisão. Sigrid Brock interpôs uma acção executiva, tendo como título executivo o aludido acórdão. Esta acção foi indeferida.
Finalmente, surgiu a acção de reivindicação de propriedade realizada por Sigrid Brock. Esta acção teve início no Tribunal Provincial de Luanda, 2.ª secção cível, e correu sob o número 374-13-A. Foi decidida em 10 de Abril de 2015, pela juíza Tatiana Margarida Moreira de Assis Aço, a favor de Sigrid Brock, determinando-se a entrega do imóvel a esta.
A juíza considerou a causa tão simples, que a resolveu por Saneador-Sentença, não levando sequer a julgamento para produção de prova. A lei permite-lhe isso, mas apenas em casos simples e óbvios. Não é verificadamente o caso. Trata-se, ao invés, de um caso complexo, que atravessa variada litigância e que chama à colação institutos de direito complicados. Não se tira uma casa a uma pessoa sem a ouvir em julgamento e ponderar bem os argumentos. É uma questão de justiça.
Lendo a sentença, verifica-se que esta é muito rudimentar e simplista, esquecendo-se de vários princípios e normas jurídicos, seja o princípio da confiança alicerçado pelo princípio do Estado Democrático de Direito previsto na CRA, seja o artigo 291.º do Código Civil, que protege os direitos adquiridos.
Um leitor desinteressado diria que a juíza só teve olhos para os argumentos de Sigrid…
Depois desta sentença desconcertante, houve recurso para o Tribunal Supremo, cujo resultado foi o acórdão que mencionámos no início deste texto, mandando Marta Ramos entregar o terreno com a casa e piscina feitas por ela à Sigrid Brock.
O terreno à data da sua aquisição por Marta Ramos.
Há aqui um problema de materialidade muito importante que foi ignorado pelos tribunais: à data da compra ao Estado angolano, o que existia no terreno não é de todo o que está a ser objecto aparente da decisão.
Ora, podemos pensar que o direito é absurdo, mas na realidade o direito tem uma lógica intrínseca de justiça: é a sua aplicação pelos juízes que se torna absurda e leva a resultados estapafúrdios.
Situações como a que foi aqui descrita estão claramente previstas na lei e competiria aos tribunais conhecer a lei e aplicá-la devidamente.
O artigo 291.º do Código Civil dispõe claramente que a declaração de nulidade ou a anulação do negócio jurídico que respeite a bens imóveis (como é o caso) não prejudica os direitos adquiridos sobre os mesmos bens, a título oneroso, por terceiro de boa-fé, se o registo da aquisição for anterior ao registo da acção de nulidade ou anulação (n.º 1), e que os direitos de terceiro não são reconhecidos se a acção for proposta e registada dentro dos três anos posteriores à conclusão do negócio (n.º 2). Dispõe-se por fim que é considerado de boa-fé o terceiro adquirente que no momento da aquisição desconhecia, sem culpa, o vício do negócio nulo ou anulável (n.º 3).
Face aos factos que conhecemos, neste momento, Marta Ramos tinha registado a sua aquisição onerosa de bem imóvel em 1999; a acção de anulação do confisco que originou a venda por parte do Estado a Marta Ramos não foi registada nos três anos após a escritura de 1999; e a cidadã desconhecia qualquer problema com o terreno que adquiriu ao Estado.
Assim sendo, Marta devia ter sido objecto da protecção dada pelo artigo 291.º do Código Civil.
Além do mais, a moderna doutrina administrativista, como definida por Luís Cabral de Moncada, é clara em afirmar que “o particular está, as mais das vezes, desarmado: não sabe se o acto é ou não nulo e fica impressionado com a autoridade da Administração e com a presunção de legalidade de que os seus actos beneficiam”. E, sendo assim, consagra a possibilidade geral de atribuição de efeitos a situações de facto decorrentes de actos nulos por força do simples decurso do tempo e de harmonia com os princípios gerais do direito. Tal leva o administrativista Mário Esteves de Oliveira a dizer quão falaciosa é, do ponto de vista jurídico prático, a ideia de que o acto nulo não produz efeitos.
Obviamente, a situação aqui descrita encaixa-se perfeitamente nestas considerações.
A declaração de nulidade do confisco não deveria ter afectado os direitos que de boa-fé Marta Ramos tinha adquirido. A isto chama-se o princípio da confiança, base essencial do Estado Democrático de Direito.
Claro que, se Sigrid Brock tivesse visto o seu terreno confiscado pelo Estado de forma ilegal, e estando Marta Ramos protegida por lei, o que havia a fazer era o Estado indemnizar Sigrid Brock pelo prejuízo que lhe causou. Esta seria a solução justa.
Em vez disso, assistimos a uma actuação dos tribunais que apenas procura retirar qualquer responsabilidade do Estado e, em última análise, dos ministros que fazem despachos asininos, e colocam os particulares a combater entre si. Errado.
O Estado tem de assumir o erro dos seus agentes e pagar a quem de direito. E os tribunais têm de conhecer a lei e aplicá-la.
Por tudo isto, comportou-se muito mal o Tribunal Supremo na sua decisão de 16 de Dezembro de 2016.

LISBOA: Estados Unidos Acham que Portugal Serve de Placa Giratória para Lavagem de Dinheiro de Dirigentes Angolanos

Estados Unidos acham que Portugal serve para lavagem de dinheiro de dirigentes angolanos

Fonte: LUSA
Reedição: Planalto de Malanje Rio Capopa

Estados Unidos acham que Portugal serve para lavagem de dinheiro de dirigentes angolanos
Portugal deve continuar a preocupar-se com os "avultados investimentos suspeitos" de cidadãos angolanos em imóveis de luxo, empresas e instituições financeiras, segundo um relatório do Departamento de Estado norte-americano.
Segundo o `Relatório de Estratégia Internacional de Controlo de Narcóticos 2017, o Governo português deve continuar a monitorizar os investimentos angolanos em Portugal em diversas áreas como imóveis de luxo, instituições financeiras e empresas.
Há suspeitas, segundo o relatório, de que "Portugal funciona como uma placa giratória (hub) para a lavagem de dinheiro ilícito por parte da classe dirigente angolana".
Os esforços de monitorização por parte das autoridades das influências políticas e económicas de vários grupos chineses com interesses em Portugal também aumentaram.
O relatório, que traça o perfil de quase 90 países no que se refere aos circuitos de lavagem de dinheiro proveniente da droga, define Portugal como um dos países de trânsito do tráfico de droga.
A extensa costa do país, as vastas águas territoriais e as relações privilegiadas com os países da América do Sul e da África lusófona faz de Portugal uma porta de entrada para a cocaína sul-americana e um dos pontos de transbordo para drogas que entram na Europa desde a África Ocidental.
As autoridades portuguesas detetaram também fundos de atividades ilícitas colocados no sistema financeiro, especialmente vindos do contrabando de tabaco
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segunda-feira, 6 de março de 2017

LUANDA: A Sonolência Cúmplice do PGR

A SONOLÊNCIA CÚMPLICE DO PGR

Com o seu bigode farfalhudo e a face rechonchuda, o procurador-geral da República (PGR), general João Maria de Sousa, assemelha-se muitas vezes a um felídeo sonolento.
E a dormir deve estar, tendo em conta a sua nula reacção às revelações bombásticas de alegados crimes cometidos em Angola que têm surgido em processos judiciais em Portugal.
Aquilo que aqui vamos reportar não são conversas da avó na quitanda, nem sequer notícias anónimas em jornais de maior ou menor reputação. São informações provenientes de processos judiciais em curso em Portugal e que não estão em segredo de justiça.
Referimo-nos a dois processos em concreto: o processo contra o vice-presidente de Angola, Manuel Vicente, denominado Operação Fizz; e o processo contra o antigo primeiro-ministro de Portugal, José Sócrates, denominado Operação Marquês. No primeiro já foi feita acusação, pelo que não há segredo de justiça. E no segundo o segredo de justiça já foi levantado por ordem do juiz “amigo” de Angola, Rui Rangel.
Nestes processos, têm aparecido vários depoimentos ou resultados de investigações do Ministério Público que indiciam a prática de crimes graves em Angola. Em qualquer país realmente interessado em fazer prevalecer a justiça, perante os factos elencados pública e notoriamente nestes processos, o PGR estaria obrigado por lei a abrir um processo-crime para a respectiva investigação.
Não o fazendo, o general João Maria de Sousa torna-se cúmplice, por omissão, de eventuais crimes altamente prejudiciais ao país.
O primeiro conjunto de crimes: BESA
Ricardo Espírito Santo Salgado, antigo proprietário do Grupo BES (Banco Espírito Santo), conhecido em Portugal como DDT (Dono Disto Tudo) e também dono do BESA (Angola), afirmou em depoimento prestado às autoridades judiciárias portuguesas o seguinte:
“Álvaro Sobrinho [ex-presidente do BESA] devia ter ido logo para a cadeia. O homem devia ter sido preso em Angola”, mas “ninguém lhe tocou. Isso é inconcebível!”, resumiu. “Portanto, eu só posso concluir que houve mais pessoas em Angola que beneficiaram com o prejuízo do BESA”, rematou.
Nas suas afirmações, Salgado explicitou que Sobrinho deixou que “desaparecessem” mais de cinco biliões de dólares do banco em Angola, levando-o à falência. Sobrinho terá cometido crimes em Angola, entregando fraudulentamente empréstimos a importantes dirigentes angolanos, e por isso foi protegido.
As informações que constam nos processos judiciais a decorrer em Portugal obrigam o PGR angolano a investigar a actuação de Sobrinho, a actuação das pessoas a quem ele entregou dinheiro “roubado” do BESA, e a das pessoas que o protegeram. São factos aparentemente reais que ocorreram em solo angolano. A divulgação do depoimento de Salgado é suficiente como indício para se abrir uma investigação.
Porque não o faz o general João Maria de Sousa? Não acreditamos que tenha recebido qualquer favor ou empréstimo de Sobrinho ou do BESA?
O segundo conjunto de crimes: Portmill
Um segundo grupo de crimes prende-se directamente com Manuel Vicente e resulta da acusação proferida contra ele pelas autoridades portuguesas.Nela se afirma que “a sociedade Portmill era utilizada pelo arguido Manuel Vicente no desenvolvimento dos seus negócios privados”. Explica o jornal Expresso: “A relação de Vicente com a Portmill, comprovada agora pelo Ministério Público, tem um alcance maior do que parece. A compra dos 24 por cento do BESA pela Portmill foi feita à custa de um empréstimo concedido em Dezembro de 2009 pelo Banco Angolano de Investimentos (BAI), cujo vice-presidente era o próprio Manuel Vicente e cujo maior accionista era a Sonangol, sendo um exemplo claro de como o número dois do Governo de Angola lidava com potenciais conflitos de interesses que pudesse ter e como os seus negócios pessoais se confundiam com os negócios da petrolífera angolana.” E acrescenta: “No caso da aquisição de 40 por cento da Movicel ao Estado angolano em agosto de 2009, Manuel Vicente, como um dos donos ocultos da operadora móvel do Estado, passou a estar numa dupla posição de vantagem. Porque fazia parte da administração da Unitel, a líder do mercado das comunicações móveis, de que a Sonangol é acionista, tinha informações privilegiadas que podia usar em seu proveito como acionista pessoal da segunda maior operadora angolana.”
Aqui temos mais um conjunto de factos que constituirão crimes financeiros de vária ordem e gravidade. E o que faz o sonolento PGR? Continua a dormir.
Qual a sua obrigação legal? Abrir inquéritos-crime sobre cada uma destas graves alegações. Até pode chegar à conclusão de que não se confirma a prática de nenhum crime e arquivar as investigações. O que não pode é fingir que não se passa nada.
Há que não esquecer: o silêncio do PGR é, em si mesmo, um crime por omissão.
Acorda, procurador!

sexta-feira, 3 de março de 2017

LUANDA: Prémio Oceanos Alarga Âmbito de Acção

PRÉMIO OCEANOS ALARGA ÂMBITO DE ACÇÃO


oceanos

A organização do Prémio Oceanos anunciou hoje em São Paulo, no Brasil, que em 2017 irá aceitar obras de autores de língua portuguesa com livros publicados em qualquer país, aumentando a abrangência a escritores de outros continentes.

Antes das mudanças agora anunciadas, as obras premiadas precisavam de ter sido publicadas no Brasil para poder concorrer.
Organizado pelo Itaú Cultural, o prémio literário Oceanos também passou a ter uma nova curadora, a crítica literária e jornalista portuguesa Ana Sousa Dias.
“Agora, a ideia de contemplar livros de literatura em língua portuguesa de todos os cantos do mundo possibilita que as literaturas brasileira, portuguesa e africanas concorram em igualdade de condições e que a sólida literatura portuguesa contemporânea esteja representada de forma ampla, assim como as literaturas africanas”, destacou um comunicado distribuído pelos organizadores do prémio.
O director do Itaú Cultural, Eduardo Saron, frisou que com este novo formato de gestão implementado pelo instituto, com a curadora coordenadora Selma Caetano, “o Oceanos realiza um verdadeiro intercâmbio da literatura em língua portuguesa aumentando a abrangência cultural e a sua repercussão no mundo”.
Na última edição do Prémio Oceanos o vencedor foi o escritor português José Luís Peixoto com o romance “Galveias”.
As inscrições para o Oceanos começam às 00:00 de sexta-feira e devem ser feitas através da página na internet do Itaú Cultural: www.itaucultural.org.br/oceanos2017.
O prémio aceita inscrições de livros de poesia, prosa de ficção, dramaturgia e crónica. É possível inscrever obras no formato digital e podem concorrer livros publicados exclusivamente nesta versão.
A escolha dos vencedores continua a ser realizada em três etapas sendo a primeira iniciada pela curadoria, que indicará um júri de avaliação formado por 40 estudiosos de literatura. Este júri avaliará todas as obras devidamente inscritas e vai eleger entre elas 50 semifinalistas.
Na segunda etapa, um júri intermédio, formado por seis jurados eleitos na etapa anterior, avalia as obras semifinalistas e elege as 10 finalistas.
No último momento, um júri final, composto pelos mesmos seis jurados, escolhe os quatro vencedores.
Em 2017, o Oceanos irá distribuir 230 mil reais (69,3 mil euros), divididos da seguinte forma: 100 mil reais (30,3 mil euros) para o primeiro lugar, 60 mil reais (18,2 mil euros) para o segundo, 40 mil reais (12,1 mil euros) para o terceiro e 30 mil reais (nove mil euros) para o quarto colocado.
Legenda: Matilde Campilho, José Eduardo Agualusa e Mia Couto foram finalistas do Prémio Oceanos 2016

LUANDA: " Querido Líder" Assume as eleições estão Ganhas

“QUERIDO LÍDER” ASSUME 
– ELEIÇÕES ESTÃO GANHAS


ja-mpla

O Governo do MPLA, através de um despacho presidencial, confirma que a vitória eleitoral deste ano está mais do que garantida. Isto porque, a poucos meses das eleições, criou uma comissão com 17 ministros que vai ter dois anos para rever e alargar, até 2050, a estratégia de desenvolvimento de longo prazo, que será aprovada já pelo novo chefe de Estado que resultar das eleições de Agosto.

Por Orlando Castro (*)
Faria algum sentido, a seis meses das eleições e em plena campanha eleitoral, o Governo criar essa comissão, dando-lhe dois anos para rever e alargar a estratégia de desenvolvimento, se não tivesse a certeza de iria ganhar?
Esta estratégia foi aprovada pelo Governo angolano em 2008, então com o objectivo de reduzir a pobreza e “transformar Angola num país próspero e moderno”, a partir do qual foi elaborado o Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) 2013-2017, que compreende 229 programas de acção e 1.227 medidas de políticas transversais e sectoriais, entre os domínios económico, de infra-estruturas, institucional e social.
Só a população angolana deverá duplicar a actual, passando dos atuais cerca de 27 milhões para quase 65 milhões, em 2050, segundo a mais recente projecção do Governo, que aponta, por outro lado, que a esperança média de vida suba apenas de 62 anos (2014) para 68 anos, ao virar a metade do século.
A revisão e extensão da estratégia de longo prazo, que integra a Lei de Bases do Regime Geral do Sistema Nacional de Planeamento, foi tema do congresso do MPLA, em Agosto de 2016, e a comissão interministerial surge da necessidade de fazer uma “revisão intercalar”, conforme define o despacho presidencial.
“A comissão ora criada tem como principal atribuição coordenar a revisão e extensão da Estratégia de Desenvolvimento de Longo Prazo ‘Angola 2025’ para o horizonte 2050”, lê-se no despacho assinado por José Eduardo dos Santos.
Será que a Oposição, nomeadamente a UNITA e a CASA-CE assinaram algum termo de “rendição” aceitando que em caso de vitória (hipótese só equacionável se acreditarmos que é exequível meter o rio Kwanza numa garrafa de Cuca) vão aceitar a existência de uma comissão que vai ter dois anos, a partir de agora, para alterar a estratégia de desenvolvimento?
Esta comissão, coordenada pelo ministro do Planeamento, integra ainda os ministros da Administração do Território, Finanças, Indústria, Comércio, Economia, Urbanismo e Habitação, Geologia e Minas, Energia e Águas, Transportes, Ambiente, Saúde, Educação, Agricultura, Pescas, Administração Pública e Cultura, além do governador do Banco Nacional de Angola.
Ao todo são 17 ministros – mais de meio Governo – que têm, a contar deste mês, um prazo de 24 meses para apresentar um relatório final ao Titular do Poder Executivo, que já não será José Eduardo dos Santos, já que o presidente do MPLA e chefe de Estado desde 1979 não se recandidata às eleições gerais de Agosto próximo.
Então alguém acredita que José Eduardo dos Santos, a seis meses das eleições, põe meio Governo numa Comissão com 24 meses de vida para trabalhar para um Titular do Poder Executivo que – em tese meramente académica e infantil – pode ser Isaías Samakuva ou Abel Chivukuvuku?
Esta comissão terá dotação própria para os trabalhos e poderá ainda recorrer à contratação de assessoria técnica especializada com peritos nacionais e estrangeiros.
Como um, no mínimo, mau patriota, José Eduardo dos Santos é uma vez mais o grande protagonista de uma farsa marcante da história de Angola. Até agora o “querido líder” tratava-nos como matumbos mas não o dizia. Finalmente, embora ainda de forma maquilhada, não tem dúvidas em tornar público o que pensa dos seus escravos.
Por alguma razão, 41 anos depois da independência e 15 após a paz total, o legado que José Eduardo dos Santos nos deixa (se é que vai mesmo deixar) é um país que lidera o ranking mundial da corrupção e que é líder destacado da mortalidade infantil em todo o mundo mas que, ao mesmo tempo, se vangloria da fidelidade e estupidez dos seus escravos.
O “querido líder”, o “escolhido de Deus”, o mais alto representante de Deus na terra, José Eduardo dos Santos, continua assim a gozar com a chipala dos angolanos.
A envergadura de estadista estratosférico é tal que, presumivelmente, a Coreia do Norte prepara-se para instituir o dia 28 de Agosto (dia do seu nascimento) como “Dia Internacional Eduardo dos Santos”. Homenagens similares estão previstas para as maiores democracias do mundo, começando no Zimbabué, passando pela Arábia Saudita, China, Cuba, Irão e Guiné Equatorial e terminando na Síria. Por confirmar está o Estado Islâmico.
O reino de sua majestade José Eduardo dos Santos é uma cleptocracia (regime político corrupto) e os seus dirigentes são uma elite indiferente ao resto da população. É por isso que, como escreve Ricardo Soares de Oliveira no livro “Magnificent and Beggar Land: Angola Since the Civil War”, o Ocidente adora um cleptocrata.
Mesmo pelos padrões dos Estados petrolíferos, o reino de sua majestade José Eduardo dos Santos é quase risivelmente injusto. Os oligarcas deixam gorjetas de 500 euros nos restaurantes da moda em Lisboa, enquanto cerca de uma em cada seis crianças angolanas morrem antes de terem cinco anos.
Esta pequena, mas poderosa, cleptocracia é aceite como uma parte integrante do sistema ocidental, sendo os expatriados que fazem a economia angolana mexer, desde as consultoras que ajudam a definir a política económica até aos bancos que financiam os negócios do clã de sua majestade o rei Eduardo dos Santos.
Os oligarcas do reino habitam a economia do luxo global das escolas públicas britânicas, dos gestores de activos suíços, das lojas Hermès, etc..
A clique dirigente do reino de sua majestade José Eduardo dos Santos consiste largamente numas poucas famílias de raça mista da capital, que considera que os cerca de 21 milhões de angolanos negros no mato ou musseques são imperfeitamente civilizados, e com pouco desejo para os educar.
Por trás de cada magnata angolano há uma equipa de gestão maioritariamente portuguesa que não se preocupa com as consequências da sua gestão. Por isso os estrangeiros bombam petróleo, fazem luxuosos vestidos e constroem aeroportos sem sentido no meio do nada.
Os membros do clã de sua majestade o rei Eduardo dos Santos fazem luxuosas viagens à Europa e passeios entre capitais europeias recorrendo a aviões privados.
O dinheiro dos governantes e o dinheiro do Estado é a mesma coisa. Todo ele é roubado ao Povo. Mas como o dinheiro não fala, empilham-no nos bancos da Europa (e não só) e gastam-no como lhes dá na real gana: compram quadros, cirurgias plásticas, casas de praia e empresas.
Os angolanos de primeira não olham a preços. Procuram qualidade e peças com o logo visível. É comum uma loja de luxo facturar, numa só venda, entre 150 e 300 mil euros, pagos por transferência bancária ou cartão de crédito.
Por outro lado, no país dos angolanos de segunda, 45% das crianças sofrem de má nutrição crónica e uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos.
Na joalharia de luxo, os angolanos de primeira (todos afectos ao regime) também se destacam, tanto pelo valor dos artigos que compram como pela facilidade com que os pagam. Chaumet, Dior e H. Stern? Sim, pois claro. O preço não é problema. Quanto mais caro melhor. Comprar uma pulseira por 200 mil euros é como comer um pires de tremoços.
Refeições? Que tal trufas pretas, caranguejos gigantes, cordeiro assado com cogumelos, bolbos de lírio de Inverno, supremos de galinha com espuma de raiz de beterraba e uma selecção de queijos acompanhados de mel e amêndoas caramelizadas, com cinco vinhos diferentes, entre os quais um Château-Grillet 2005?
(*) Com Lusa

LUANDA: Tribunal Constitucional: O Chouriço e as Eleições

TRIBUNAL CONSTITUCIONAL: O CHOURIÇO E AS ELEIÇÕES


Está publicada no site do Tribunal Constitucional a decisão deste, tomada a 6 de Dezembro último, relativamente ao pedido de fiscalização sucessiva da constitucionalidade de alguns artigos da nova Lei do Registo Eleitoral Oficioso, requerida pelos grupos parlamentares da UNITA e da CASA-CE, em especial, a decisão legal de entregar o registo eleitoral ao Ministério da Administração do Território (MAT).
A decisão está errada e não recomenda o Tribunal como garante de um processo eleitoral livre e justo.
A questão essencial sobre que se debruça o alto Tribunal radica na definição do conteúdo e alcance do artigo 107.º da Constituição, na definição das competências da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) e na competência para realizar e organizar o registo eleitoral.
Ou, em português simples, a questão é simplesmente uma: se o Ministério da Administração do Território (auxiliar do Titular do Poder Executivo) está ou não a fazer um trabalho de registo eleitoral que devia ser levado a cabo pela CNE (organismo independente).
A resposta do Tribunal Constitucional desilude.
Os Juízes Conselheiros citam a norma constitucional:
“Artigo 107.º
1. Os processos eleitorais são organizados por órgãos de administração eleitoral independentes, cuja estrutura, funcionamento, composição e competências são definidos por lei.
2. O registo eleitoral é oficioso, obrigatório e permanente, nos termos da lei.”
Da sua leitura conclui-se que os processos eleitorais são organizados por órgãos de administração eleitoral independentes, e que a sua estrutura, o funcionamento, a composição e as competências são definidos por lei.
Logo, na visão do Tribunal, é à Lei ordinária e não à Constituição que compete definir quais sejam as funções da CNE. Ou seja, a Lei é livre de definir ou não o registo eleitoral como competência da CNE ou do MAT. Esta é a primeira conclusão do Tribunal.
A isto acresce a consideração feita pelos Juízes de que a própria Constituição admite um conceito lato de processo eleitoral, prevendo a participação de vários intervenientes, desde o presidente da República, que convoca e marca as eleições, ao próprio Tribunal Constitucional, que tem competências na área do contencioso eleitoral.
Nesta sequência, os Juízes desenvolvem a teoria das fases do processo eleitoral angolano, enumerando uma sequência de cinco: registo eleitoral, convocação de eleições, apresentação de candidaturas, processo eleitoral strictu sensu e contencioso eleitoral. Ora, assim sendo, concluem que cada uma destas fases pode ter intervenientes diferentes.
E, segundo os Colendos Juízes, à CNE compete apenas a quarta fase, a que chamaram processo eleitoral em sentido restrito, a qual engloba sorteio de candidaturas, fiscalização de campanha eleitoral, elaboração dos cadernos eleitorais, georreferenciação eleitoral e indicação das mesas de voto, contagem de votos, atribuição de mandatos e declaração de vencedores.
Afirmam com intensidade: “Não se pode tentar forçosamente enxertar no n.º 1 do artigo 107.º as demais fases do processo eleitoral, porque este resultado interpretativo não encontra no texto e na teleologia da norma o mínimo de correspondência verbal.” Mais afirmam que as normas do artigo 107.º são programáticas, isto é, são normas de orientação constitucional, cuja materialização é imputada ao legislador ordinário, competindo a este fazê-lo nos termos e efeitos determinados pela Constituição.
A argumentação sobre este ponto termina com um apelo não especificado às regras de hermenêutica constitucional, assente numa compreensão global do texto (!).
No que diz respeito ao registo eleitoral em concreto, o Tribunal acrescenta ainda que a Lei assegura a “universalidade do registo, confere aos cidadãos garantia jurisdicional de efectividade do seu direito ao registo e assegura a transparência de todo o processo do registo eleitoral através da respectiva fiscalização pelos partidos políticos e supervisão pela CNE.”
E a isto se resume a argumentação do Tribunal Constitucional para considerar que a entrega do registo eleitoral ao MAT é constitucional.
Discordamos de todos os argumentos.
Não é verdade que a Constituição dê plena liberdade à Lei ordinária para definir as funções da CNE.
A norma constitucional é clara: os processos eleitorais são organizados por órgãos de administração eleitoral independentes. À Lei ordinária apenas compete definir a estrutura, o funcionamento, a composição e as competências.
Isto quer dizer que as atribuições destes órgãos estão definidas constitucionalmente e que a organização dos processos eleitorais é uma delas. Temos que utilizar dois conceitos simples de direito administrativo: atribuições e competências.
As atribuições do órgão administrativo eleitoral independente (a CNE) estão definidas pela Constituição. A Lei ordinária apenas tem liberdade para definir as competências.
É necessário, portanto, fazer a distinção entre atribuições – fins ou interesses que a lei incumbe as pessoas colectivas públicas de prosseguir e realizar – e competências – conjunto de poderes funcionais que a lei confere aos órgãos para a prossecução das atribuições das pessoas colectivas públicas.
Logo, a Constituição determina que a organização dos processos eleitorais seja função de um órgão de administração eleitoral independente. À Lei apenas compete especificar o exercício dessas atribuições. A Lei não pode esvaziar ou amputar as atribuições atribuídas constitucionalmente. Existe, por consequência, uma vinculação constitucional, não uma discricionariedade legal.
Um segundo ponto levantado pelo Tribunal Constitucional diz respeito ao conceito de processo eleitoral. Ao criar a tese das cinco fases do processo eleitoral, o Tribunal está a recorrer à teoria do chouriço: pega num chouriço inteiro e vai cortando-o aos pedaços, retirando cada um dos pedaços. No fim, o tamanho do chouriço reduz-se a 1/5 do inicial.
Um grande chouriço transformou-se numa linguiça ínfima! Esta teoria esvazia a protecção constitucional ao processo eleitoral, limitando-o a uma pequena parte.
O conceito de processo eleitoral em cinco fases não resulta da mais moderna doutrina, nem da Constituição angolana.
Nos termos da doutrina internacional mais recente, vertida em vários relatórios da ONU e dos Institutos Internacionais especializados em eleições, o ponto essencial básico defendido é que as eleições são ganhas ou perdidas por votos. Como resultado, quem é c
apaz de se inscrever e, posteriormente, votar, pode afectar directamente o resultado de uma eleição. Assegurar a integridade do registo dos eleitores é fundamental, num processo que deve ser bem concebido e implementado, e adequadamente monitorizado pelos partidos políticos e pela sociedade civil. Significa isto que o registo é um elemento essencial, e não uma fase despicienda, de qualquer processo eleitoral, pois vai determinar o seu resultado final. O processo eleitoral é um contínuo que tem que ser gerido de forma integrada do princípio ao fim, para garantir a sua fiabilidade. Se é separado, nunca sabemos o que foi feito na parte anterior, e a fiabilidade e confiança no processo são minadas.
Por sua vez, a Constituição angolana não faz qualquer distinção de fases e atribuição de cada uma a diferentes órgãos. Isso é imaginação jurídica de grau elevado, com o devido respeito.
Seguindo o apelo do Tribunal a uma hermenêutica global, o que se vê é uma declaração geral constitucional, de acordo com a qual os processos eleitorais são conduzidos por um órgão independente. E as excepções a esse princípio são especificadamente escritas na Constituição, tal como as relativas aos poderes de convocação de eleições por parte do presidente ou de resolução contenciosa por parte do Tribunal Constitucional.
Isto quer dizer o seguinte: há uma regra geral, e todas as excepções estão claramente previstas. Caso contrário, devia entregar-se o processo eleitoral ao completo arbítrio da legislatura de cada dia. Portanto, tudo aquilo relativo ao processo eleitoral que não esteja atribuído especificamente pela Constituição a outro órgão está então obrigatoriamente sob alçada do órgão independente: a CNE.
Em resumo, o processo eleitoral inclui o registo eleitoral e resulta da leitura atenta da Constituição, que define um princípio geral: o processo eleitoral será organizado por um órgão administrativo independente, sendo apenas permitidas as excepções também previstas na Constituição, e não outras. O comando constitucional não confere completa liberdade ao poder legislativo, pelo contrário: este, no exercício dos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 107.º da CRA, tem que respeitar as atribuições determinadas ao órgão eleitoral independente.
Pelo exposto, discordamos em absoluto com a decisão do Tribunal Constitucional, que aplicou a teoria do chouriço à organização do processo eleitoral.