quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

LUANDA: Em Angola Nada Se Move Sem Corrupção

NADA SE MOVE SEM CORRUPÇÃO


crime

Tem um “padrinho na cozinha”? Se não, convém sempre ter um pouco de “gasosa” à mão, para pagar a quem possa facilitar o acesso a serviços públicos ou privados. Muitas vezes, a vida em Angola só funciona com corrupção.

“Padrinho na cozinha” é uma expressão corriqueira em Angola. O termo significa ter uma pessoa conhecida num determinado órgão da administração pública ou em instituições privadas, que possa ajudar o cidadão que tem que recorrer aos bens e serviços do Estado. O “padrinho”, a pessoa com o desejado grau de influência, pode ser o pai, tios, primos ou simplesmente um amigo. O que importa é que o padrinho esteja em condições de ajudar onde o Estado e as suas regras falham.
A DW África falou com vários cidadãos angolanos, que confirmam que a corrupção é banal em escolas, hospitais e no sector de identificação civil.
Diamantino Simão, do município de Viana, e natural da província da Huíla, admite abertamente que beneficia do apoio de parentes. Foi o caso, há poucos dias, em Luanda: “Os meus familiares são funcionários públicos. Sempre que preciso de documentos, eles mesmos tratam por mim”.
Quem não tem familiares ou amigos em posições cruciais, recorre a outros métodos, igualmente ilegais ou mesmo criminosos, para resolver os problemas do dia-a-dia. À “gasosa”, por exemplo. O termo tem origem nos pedidos de dinheiro por parte de funcionários públicos para pagar um refrigerante a troco de um “jeitinho”. Passou a ser usado também quando é o cidadão a aliciar o funcionário ou o agente através do suborno, uma vez que a iniciativa varia de situação para situação.
Jorge da Silva, de Luanda, diz que já corrompeu funcionários públicos muitas vezes para ver os seus problemas resolvidos com celeridade. E nem sempre há a consciência de que se trata de práticas ilegais: “Na verdade, nós pensamos nas consequências quando o funcionário é que vem ter contigo. Mas quando você é que precisa, não pensa nas consequências”.
Para reforçar o combate à corrupção, Angola aderiu à Convenção Contra a Corrupção das Nações Unidas. Em 2010, o parlamento angolano aprovou ainda a Lei da Probidade Pública. Mesmo assim, o fenómeno não está controlado.
Para o jornalista Albino Sampaio falta uma cultura de denúncia por parte dos cidadãos. Para Sampaio, este seria um passo importante no sentido de resolver o problema: “Tanto faz se é nas instituições do ensino, na polícia ou em qualquer outra instituição”. Se é para as coisas funcionarem como deve ser “então é importante termos sempre a coragem de denunciarmos”.
O aumento dos casos de corrupção deve-se em parte também, à escassez de instituições do Estado que prestam os serviços procurados pelos utentes. É normal cidadãos perderem muitas horas em intermináveis filas em repartições públicas para resolverem as suas situações.
João Paulo, outro residente de Luanda, conta que foi tratar do registo criminal, mas deparou-se com uma fila de espera imensa: “Fui interpelado por jovens que diziam que havia uma via rápida para tratar do documento. E esta via rápida é a chamada gasosa”, ou seja, uma certa soma de dinheiro que garante que o caso seja processado com rapidez. “Também por causa da minha pressa colaborei com os jovens, apesar de eu saber que não está dentro da lei”, admite João Paulo.
Angola está entre os seis países considerados os mais corruptos do mundo pelo Índice de Percepção de Corrupção 2016 da organização não-governamental Transparência Internacional.
Para responder a esta situação, o maior partido da oposição, União Nacional para Independência Total de Angola (UNITA) propôs, no princípio deste ano, a criação de uma Alta Autoridade Contra a Corrupção. Até agora, não há indícios para que fundação de semelhante instituição esteja para breve.

Falamos bem mas fazemos mal

No dia 8 de Julho deste ano, gestores de bancos angolanos defenderam o que se esperava que defendessem há décadas. Isto é, a necessidade cada vez maior de as instituições financeiras do país cumprirem com as regras internacionais de transparência e livrar Angola do alto índice de percepção sobre o verdadeiro ADN do regime, a corrupção.
A posição, recorde-se, foi marcada no VI Fórum da Banca, promovido pelo jornal Expansão, subordinado ao tema “Compliance em Angola”.
É Angola no seu melhor. Isto é como quem diz! Domina o "ranking" dos países mais corruptos mas tem assento no Conselho de Segurança da ONU...
É Angola no seu melhor. Isto é como quem diz! Domina o “ranking” dos países mais corruptos mas tem assento no Conselho de Segurança da ONU…
No painel dedicado ao tema da conferência, o Presidente do Conselho Executivo do banco BAI e antigo governador do Banco Nacional de Angola, José de Lima Massano, disse que há ainda um esforço de aplicação plena do conjunto de normas e regras que o país deve seguir e de permanente actualização das mesmas.
Segundo José de Lima Massano, Angola não pode “descansar” se quiser estar em linha com as recomendações e aquilo que é hoje entendido como “as melhores práticas”.
“Nós somos ainda, aos olhos destas organizações, entendido como um país de alto risco, por vários motivos, por exemplo, o tema da corrupção, no índice de percepção da corrupção, da Transparência Internacional, Angola é considerado um país de alto risco. E essas instituições com tudo o que está aí a acontecer olham sempre para a nossa jurisdição com cautelas acrescidas”, referiu o gestor.
José de Lima Massano acrescentou como imperativo que Angola continue a registar avanços significativos nesta matéria ou terá “condições mais difíceis de exercer a actividade bancária”, num contexto em que a economia angolana “se relaciona com o exterior como um elemento quase que ainda de sobrevivência”.
Por sua vez, Emídio Pinheiro, presidente do Conselho Executivo do BFA, sublinhou o que também se sabe há muitos anos, ou seja que a imagem de Angola internacionalmente “é má”, o que considerou “um problema muito sério, porque é de percepções”.
“Isto não se resolve se não atribuirmos prioridade máxima, prioridade total”, frisou, acrescentando que a origem dos fundos “é onde os bancos têm que fazer um esforço maior com os seus clientes”.
“Porque é aqui que se despista um encobrimento de património, a fuga de impostos e é aqui que está presente a corrupção”, destacou Emídio Pinheiro.
Já a Administradora Executiva do banco angolano BIC, Graça Santos Pereira, disse que aquela instituição financeira tem feito muitas comunicações sobre operações suspeitas à Unidade de Informação Financeira de Angola e tem contas bloqueadas à ordem da Procuradoria-Geral da República.
“São coisas muito recentes, temos contas que estão já bloqueadas à ordem da Procuradoria e não sei o que lhes vai acontecer, mas se calhar não vai ser bem assim, não acontecer nada, é um processo muito recente”, avançou a gestora.
“Isto é um trabalho recente estamos a falar deste ano maioritariamente, mas temos contas bloqueadas à ordem da PGR há mais de seis meses. O desfecho, não sabemos, já tivemos umas bloqueadas e mandaram-nos desbloquear”, acrescentou Graça Santos Pereira.
Na abertura do fórum, pelo ministro das Finanças de Angola, Armando Manuel, o governante considerou o encontro muito apropriado para o momento actual que Angola vive, que é de fundamental importância que as instituições financeiras nacionais detenham, não apenas o conhecimento básico da legislação nacional e internacional, mas também o domínio das práticas e dos programas de ‘compliance’, para prevenir e detectar condutas ilegais.
“Enfatizo especialmente a imprescindibilidade das instituições financeiras nacionais deterem conhecimento e domínio da legislação e práticas estrangeiras, para que não sejam as entidades reguladoras de outros países a eventualmente indicar a necessidade de implementar este ou aquele reparo nas operações ou regulamentos envolvendo procedimentos financeiros a partir de Angola ou que tenham esta como destino”, disse o ministro.

E tudo vai ficar na mesma

Averdade é, seja qual for a via, são muitas as instituições internacionais que canalizam avultados montantes para Angola, embora saibam que grande parte desse dinheiro se destina a alimentar, alimentando-as também, à corrupção.
Não faltam organizações a colocar o reino de sua majestade o rei de Angola, José Eduardo dos Santos, a liderar o ranking mundial dos países mais corruptos. E qual é o resultado? Nenhum. Desconta-se o dinheiro para a corrupção e siga a caravana.
Como se explica que nos últimos anos tenham sido gastos muitos mil milhões de dólares na construção ou reparação de estradas, de pontes e saneamento que, contudo, poucos anos depois estão em ruinas?
Esses elevados montantes deveriam chegar para que todas as províncias tivessem excelentes estradas capazes de durarem mais de 30 anos. Afinal duram meia dúzia de anos, quando duram. Mas, é claro, ninguém é responsabilizado por termos as mais caras e, ao mesmo tempo, piores estradas.
No entanto, importa dizê-lo sempre (o Folha 8 di-lo há muitos anos), que é fácil responsabilizar os responsáveis porque os gestores públicos são bem conhecidos, os que receberam orçamentos bilionários e fizeram obras descartáveis, e enriqueceram vertiginosamente as suas contas, ao ritmo que a população foi empobrecendo.
Por outras palavras, os gestores acólitos do regime entram com a sua experiência e os angolanos com o dinheiro. Findas as negociatas, os gestores ficam o dinheiro e os angolanos com a experiência.
Reconheça-se que, por exemplo, já em 2009 o presidente da UNITA, Isaías Samakuva, afirmava que Portugal se “tornou num destino seguro de fortunas desviadas do erário público angolano”.
Sobre a corrupção em Angola, o líder da UNITA disse nessa altura que as transferências de avultadas somas para Portugal são “para comprar até empresas falidas para branquear dinheiro roubado ao povo de Angola”.
Folha 8 com DW e Lusa

LUANDA: As Parcerias Estrangeiras Com Corruptos Angolanos Feitos Empresários Pela Ditadura

AS PARCERIAS ESTRANGEIRAS COM OS CORRUPTOS ANGOLANOS


Como qualquer país, Angola precisa de investimento para se desenvolver e garantir a prosperidade do seu povo. Mas o país não terá investimento significativo enquanto os grupos económicos nacionais forem motivo de embaraço para os seus associados estrangeiros. É por isso que a corrupção e o desrespeito pelas leis são muito mais do que um problema de justiça ou de direito. São um problema directamente relacionado com a sobrevivência do povo angolano.
Vejamos o caso do Grupo Gema e a repercussão que as ilegalidades vindas a público no Acórdão do Tribunal Supremo, de 17 de Dezembro de 2015, podem ter nas relações com as poderosas corporações multinacionais americanas.
Uma das muitas actividades do Grupo Gema é o ramo automóvel: a sua subsidiária Vauco, em parceria com a construtora portuguesa Teixeira Duarte, representa a General Motors em Angola e é assistente oficial da Peugeot e da japonesa Honda.
O Grupo Gema tem duas estruturas accionistas paralelas. Ao Tribunal Supremo, confessaram-se, como sócios reais, António Pitra Neto, ministro da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social; Carlos Feijó, ex-chefe da Casa Civil do PR; Generoso de Almeida, então governador do Banco Nacional de Angola, à data de criação do grupo; José Leitão, ex-chefe da Casa Civil do PR e António Gomes Furtado, antigo governador do BNA.
A questão colocada é a seguinte: de acordo com a decisão do Tribunal Supremo, verificou-se que determinadas actas que concediam poderes ao presidente do Conselho de Administração, José Leitão, foram assinadas por um sócio, Pedro Januário Macamba, mas que essas assinaturas eram falsas. Dessa decisão parece decorrer que aqueles que se arvoram como detentores do capital social do Grupo Gema afinal não têm poderes para tal, ou obtiveram as suas participações de forma ilegal. Na mesma decisão, também sobressai que determinados agentes públicos de grande importância, ministros, governadores, etc., afirmam que são os donos do Grupo Gema, mas, como isso seria ilegal, aranjaram testas-de-ferro para disfarçar. A confirmar-se na investigação judicial que não pode deixar de ser aberta, isto significa que muitos negócios feitos pelo Grupo Gema são ilícitos.
É aqui que entra a relação entre a General Motors, empresa norte-americana de automóveis que vai alternando entre ser considerada a maior e a segunda maior do mundo, e o Grupo Gema.
A General Motors, através do Grupo Gema, realizou vários negócios com o Governo angolano: os tais que seriam proibidos devido à natureza de agentes públicos dos seus sócios. Ora, ao realizar esse tipo de negócios, a General Motors estará a violar a lei angolana e, possivelmente, a lei norte-americana. Neste caso, o Foreign Corrupt Practices Act, de 1977, relativo às boas práticas contabilísticas e societárias das empresas estrangeiras associadas, já para não falar de eventuais movimentos financeiros que podem ter acontecido.
Entre outros documentos, dispomos de documentação  emitida pela Vauco, que representa a Chevrolet e a Isuzu, subsidiária da General Motors, sobre a revisão de automóveis da frota do Conselho de Ministros. Trata-se da manutenção de automóveis vendidos pela empresa do Grupo Gema, representante da General Motors em Angola. Na altura, Joaquim António Carlos dos Reis Júnior era o secretário do Conselho de Ministros. Actualmente é deputado do MPLA.
O facto concreto apontado é que a empresa americana, sujeita à apertada vigilância da lei do seu país, tem como representante em Angola uma sociedade que opera à margem da lei, com sócios de fachada, o que permite a agentes públicos de topo fazerem negócios consigo próprios, ou, melhor dizendo, entre o governo onde estão e a empresa que detêm, ou, noutra versão possível, os que se dizem actuais sócios da empresa alcançaram esse estatuto através de meios ilícitos, como a falsificação de assinaturas.
É sabido pela legislação internacional e norte-americana que qualquer negócio com “Foreign Oficials” (os PEP da indústria financeira) implica uma due dilligence acrescida e critérios mais apertados de vigilância. Será que a General Motors cumpriu estes critérios legais?
E também é um facto que a GM tem conhecimento, desde 26 de Julho de 2016, das falsificações e questões de falsa titularidade accionista da sua representante em Angola, através da sua subsidiária na África do Sul, a General Motors South Africa (Pty) Ltd, na pessoa de Brian Hunter, General Manager Vehicle Sales, e não parece ter feito nada desde essa data.
A GM, ao ignorar os factos que lhe foram transmitidos, pode estar a violar normas norte-americanas, como o Foreign Corrupt Practices Act of 1977 (FCPA). Isto quer dizer que as companhias são obrigadas a manter uma vigilância adequada em relação ao cumprimento das normas contabilísticas societárias e de corrupção por parte das suas subsidiárias / representantes (Paragraph 78 m). Não são responsáveis por essas práticas, mas são responsaveis se não criarem os mecanismos adequados para controlar e vigiar eventuais práticas corruptas e ilegais das suas associadas locais.
A pergunta impõe-se: com tanta ilegalidade nas práticas dos alegados empresários angolanos a vir ao de cima, qual a empresa internacional que se arriscará a ser alvo de processos-crime e pesadas multas financeiras nos seus países?
Este é mais um problema a acrescer aos vários que Angola, hoje uma ditadura corrupta perante o mundo inteiro, arranjou.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

LUANDA: A Cobiça de Isabel e a Culpa do Pai Ditador

A COBIÇA DE ISABEL E A CULPA DO PAI

Com as costas largas que tem, Isabel dos Santos diz o que lhe vai na alma sem temer qualquer represália. É por causa desse conforto nas costas que ela não tem pejo em qualificar os seus antecessores na direcção da Sonangol como autênticos “bananas” em gestão, mas verdadeiros catedráticos em rapinagem.
Na última conferência de imprensa da nova administração da Sonangol, Isabel dos Santos imputou aos seus antecessores práticas que configuram verdadeiros crimes. De acordo com ela, uma avaliação efectuada pela nova administração detectou práticas de gestão questionáveis. Isabel dos Santos falou de “um conjunto de inconsistências entre a informação contabilística e a informação real da empresa, bem como uma falta de controlo sobre várias participações financeiras”. Em linguagem de gente simples, isso quer dizer que Joaquim David, Manuel Vicente – actual vice-presidente da República – e o seu sucessor Francisco de Lemos Maria eram chefes de gangues que se especializaram em dar golpes financeiros à mais importante empresa pública do país.
Se estivéssemos num país sério, onde os cidadãos preservassem a sua honra, os três visados já teriam vindo a público dizer das suas razões. Mudos como estão, dão azo a serem interpretados segundo a velha máxima: quem cala consente. Isabel dos Santos pode não o ter percebido ainda, mas as farpas com que cobre os seus antecessores têm de ser, necessariamente, extensivas ao seu pai. José Eduardo dos Santos é presidente deste país há longevos 37 anos. Joaquim David, Manuel Vicente e Francisco de Lemos Maria, os anteriores presidentes do conselho de administração da Sonangol, que Isabel agora tomou como seus inimigos de estimação, foram nomeados pelo presidente da República.
O facto de o presidente da República nunca ter fiscalizado o trabalho dos seus nomeados torna-o co-responsável por tudo. E Isabel dos Santos foi das principais beneficiárias da “desorganização organizada”, como dizia Samora Machel, propositadamente instalada na Sonangol. Foi a Sonangol que financiou, integralmente, a meteórica ascensão de Isabel dos Santos no mundo dos negócios.
É a Sonangol que abastece os sacos azuis com que a Presidência da República corrompe e alicia opositores, entidades religiosas, jornalistas e por aí adiante. É da Sonangol que saem os sacos azuis que fazem da Casa de Segurança do Presidente da República o maior concorrente dos concessionários nacionais de automóveis.
Portanto, se for honesta consigo própria, Isabel dos Santos concluirá que é uma das principais beneficiárias das “inconsistências entre a informação contabilística e a informação real da empresa”, que agora denuncia. Sem essas inconsistências, não haveria Unitel, BFA, BIC, Nova Cimangola, Imogestin, enfim, essa panóplia de empresas e negócios de que agora se gaba. Sem o dinheiro da Sonangol, obtido generosamente graças a essas “inconsistências”, Isabel dos Santos jamais poderia gabar-se de ter ocupado “cargos de gestão de topo em empresas cujo universo engloba milhares de colaboradores” ou do exercício de “cargos de administração em empresas de telecomunicações, instituições financeiras e empresas cotadas na bolsa europeia”. Ela deve tudo isso ao dinheiro da Sonangol. A absurda história da venda de ovos nem aos fanáticos do MPLA convence.
Também foi graças a essas inconsistências que o pai-presidente transformou Luanda na Meca de África, onde chefes de Estado africanos faziam fila indiana para adular José Eduardo dos Santos, a quem cinicamente atribuíam qualidades ímpares. A idolatria calculista rendia-lhes milhões e milhões de dólares. Desde que a teta do petróleo secou, ou quase, já quase ninguém vem a Luanda gabar a anteriormente cantada experiência de José Eduardo dos Santos na resolução de conflitos.
Por certo, à Princesa não ocorrerá que tenha caído do céu o dinheiro com que o pai-presidente promoveu a acumulação primitiva do capital a favor de meia dúzia de devotos.
Em suma, deixemo-nos de truques: Isabel dos Santos, o pai-presidente, Joaquim David, Manuel Vicente, Francisco de Lemos Maria partilham sérias responsabilidades pelo estado caótico em que se encontra a Sonangol. Em linguagem de gente comum, dir-se-ia que estão todos juntos e misturados. Se alguma vez houver coragem para investigar e apurar responsabilidades sobre as ditas inconsistências, o quinteto tem de responder em conjunto e solidariamente.
A campanha persecutória que Isabel move contra os seus antecessores, nomeadamente Manuel Vicente e Francisco de Lemos Maria, não tem nada que ver com um surto de ética, moralidade, transparência ou preocupação com o bem comum. Nada disso. A Princesa já não vai a tempo de se converter a esses nobres valores. A cruzada de Isabel contra os outros é movida pela cobiça. Isabel dos Santos não consegue conviver com a ideia de que haja outros angolanos com tanto ou mais dinheiro do que ela – e nesse aspecto, ao que se diz, Manuel Vicente não tem par, é o homem mais rico de Angola.
A Princesa foi acostumada à ideia de que o dinheiro de Angola é apenas para ela e para a família. É Essa a verdadeira causa dos constantes amuos de Isabel contra os seus predecessores.

LUANDA: Desfalques Na Sonangol P&P: Isabel Demite e Autonomeia-se

DESFALQUES NA SONANGOL P&P: ISABEL DEMITE E AUTONOMEIA-SE


A presidente do Conselho de Administração da Sonangol, Isabel dos Santos, demitiu ontem, 20 de Dezembro, toda a Comissão Executiva da Sonangol Pesquisa e Produção, a subsidiária da Sonangol dedicada à prospecção, pesquisa e produção de hidrocarbonetos. Dito de outra forma, despediu o núcleo duro da operação Sonangol.
No comunicado que fez sair a propósito desta exoneração-relâmpago, Isabel dos Santos anunciou que vai assumir directamente o comando da Sonangol Pesquisa e Produção (P&P), na qualidade de presidente da Comissão Executiva. Isto significa que a presidente da Comissão Executiva da Sonangol P&P passa a reportar à presidente do Conselho de Administração da Sonangol. Ou seja, Isabel dos Santos será doravante superior hierárquica de si mesma. Em 2012, a Sonangol P&P perdeu a capacidade de autonomia financeira e de decisão, tornando-se dependente do então presidente do Conselho de Administração Francisco de Lemos José Maria.
A acumulação de funções por parte de Isabel dos Santos faz lembrar certos ditadores em guerra que, à medida que iam perdendo batalhas, substituíam os seus generais e assumiam o comando directo das operações militares — até à derrota final.
Para justificar esta demissão-relâmpago, Isabel dos Santos acusa a gestão da empresa de ser a que tem mais debilidades e desvios financeiros.
O presidente exonerado, Carlos Saturnino, reagiu com violência à demissão e ao comunicado de Isabel, afirmando que “não é correcto, nem ético, atribuir culpas à equipa que somente esteve a dirigir a empresa no período entre a segunda quinzena de Abril de 2015 e 20 de Dezembro de 2016”. Ora bem, o que temos aqui? Temos um alto funcionário da Sonangol a acusar a filha do presidente da República de falta de ética. Afinal, não é só uma oposição motivada politicamente que o faz!
Quanto às razões de Isabel, há que notar que, se ela acredita de facto no que mandou escrever em comunicado, deveria ter encaminhado eventuais provas de má gestão à PGR para o devido tratamento judicial. É um imperativo que a lei lhe impõe. Não o fazendo, Isabel dos Santos estará a ser negligente, ou conivente, ou a difamar a gestão cessante.
Por outro lado, também se impõe que a actual líder da Sonangol preste informações sobre os montantes em falta. Não basta proferir acusações genéricas. Sem apresentação de provas, essas acusações não passam de calúnias.
Isabel confirma as makas
Recentemente, Isabel dos Santos deu uma conferência de imprensa para confirmar as várias informações prestadas pelo Maka Angola nos últimos meses acerca da Sonangol.
A presidente do Conselho de Administração da petrolífera confirmou que:
1) A empresa não tem dinheiro para cumprir os seus compromissos.
2) As contas oficiais e a contabilidade da empresa não são fiáveis.
3) Os negócios paralelos em que a empresa interveio são ruinosos.
Em resumo, a Sonangol não tem dinheiro, e não se sabe o montante exacto das suas receitas nem das suas dívidas. É uma empresa descontrolada.
Todo este cenário foi antecipado no Maka Angola. Vê-se agora claramente que a razão nos assistia e que não eram considerações políticas ou não patrióticas que nos levavam a informar o público do que se passava na Sonangol. Havia e há um forte interesse público na divulgação da real situação da Sonangol. E também não precisámos de exércitos de consultores e assessores pagos a peso de ouro para concluir o óbvio. Basta saber ler e ter um lápis para fazer contas.
Contudo, muitas perplexidades surgem nas reacções de Isabel dos Santos ao diagnóstico da situação.
A primeira é culpar as anteriores gestões, de Lemos Maria e Manuel Vicente, pelo caos instalado na Sonangol. Pode ser que tal seja verdade, contudo, há que anotar que era o pai-presidente quem exercia os poderes de superintendência sobre a empresa, sendo responsável por exercer os seus poderes de vigilância na área da política de investimentos, justamente aquela que foi tão criticada por Isabel. Se a política de investimentos da Sonangol foi errada (e foi, sem dúvida), tal deveu-se, em última análise, à acção ou omissão do pai-presidente. O presidente não pode querer acumular todos os poderes e depois, quando as coisas correm mal, dizer que a culpa é do Vicente. Não: a lei atribui especiais deveres de superintendência ao presidente. O responsável pelo caos, pelo descontrolo, é ele e mais ninguém.
A isto acresce um aspecto adicional. Se Isabel acredita mesmo que a culpa do “buraco” e “descontrolo” da Sonangol é de Lemos e Vicente, então é obrigada por lei a tomar medidas judiciais, que incluem a propositura de acções de responsabilidade contra os dois anteriores presidentes do Conselho de Administração. Acções judiciais essas que implicam preventivamente a tomada de providências de arresto de bens, para garantir eventuais indemnizações. Traduzindo: Isabel, para defender o interesse público, deve desde já promover o “congelamento” dos bens de Lemos e Vicente. Não basta falar para o ar. Há que agir.
Quer no caso de Vicente, quer no de Saturnino — o ora demitido presidente da CE da Sonangol P&P —, se há provas de má-gestão, há que fazer intervir o Ministério Público com dados concretos.
Uma segunda perplexidade liga-se aos cabazes de Natal. Qual é o racional económico que justifica gastar milhões de dólares em cabazes de Natal numa empresa que não tem dinheiro? Nenhum, a não ser financiar os supermercados de Isabel dos Santos. Por aqui se vê que não fala a sério quando se refere a uma gestão rigorosa e à necessidade de medidas urgentes. Oferecer perus de Natal não será certamente a prioridade de uma empresa petrolífera.
A terceira perplexidade resulta da informação acerca da intenção de reforçar o peso da Sonangol no BCP português. O investimento da Sonangol no banco BCP em Portugal foi dos mais ruinosos que esta empresa realizou. As suas menos-valias (prejuízos) potenciais rondavam, em Julho deste ano, 1.5 biliões de euros. Grosso modo, o valor que a Sonangol agora precisa para honrar os seus compromissos até ao fim do ano. Então, pergunta-se: o BCP foi até ao momento o pior investimento, o mais ruinoso para a Sonangol, e esta pretende continuar a investir mais? Para quê?
A falta de concretização das acusações a Vicente, Lemos e Carlos Saturnino, os cabazes de Natal e o reforço do investimento no BCP são exemplos das contradições do discurso de Isabel.
A realidade é que o caminho chegou ao fim e que a Sonangol será a ruína de D. Isabel.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

LISBOA: Parabéns Pelo Doutoramento Camarada Marcolino Moco

PARABÉNS Doutor MARCOLINO MOCO



Angola recebe mais um PhD. Marcolino Moco, defendeu no dia 12 de Dezembro de 2016, pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, a tese de doutoramento: “Contribuição para uma apreciação jus-internacional da integração regional africana”.

Marcolino José Carlos Moco foi Primeiro Ministro de Angola. É licenciado e mestre em Direito pela Universidade Agostinho Neto. Entre o mestrado e o doutoramento foi professor e director da Faculdade de Direito na Universidade Lusíada de Angola.
Natural da Província do Huambo, aldeia de Chitue, no Ekunha – antiga Vila Flor. Descende de uma importante linhagem de chefes tradicionais, um dos quais foi Tchítue, fundador da aldeia onde nasceu. O seu título é com certeza dedicado ao seu pai, um dos sobas mais influentes do grupo etnolinguístico Ovimbundu, falecido há duas semanas.
Na foto em anexo, Marcolino Moco com o júri, depois de “aprovado por unanimidade, com dois votos de distinção – Reitoria da Universidade de Lisboa, 12 de Dezembro de 2016.

LUANDA: Petróleo, Corrupção & (Muito Boa) Cª (MPLA/JES & Família

PETRÓLEO, CORRUPÇÃO & (MUITO BOA) Cª (MPLA)


petrol

Angola aumentou a produção de petróleo de Outubro para Novembro em 124,8 mil barris diários, alcançando a Nigéria na liderança dos produtores de crude em África, indica o último relatório mensal da Organização de Países Exportadores de Petróleo (OPEP).

De acordo com dados do relatório baseados em fontes secundárias da OPEP, Angola e Nigéria igualaram-se em Novembro nos 1,692 milhões de barris de petróleo produzidos por dia.
Angola registou a maior subida de produção entre os países analisados no relatório da OPEP, enquanto a Nigéria também aumentou a actividade, com mais 62,7 mil barris diários.
A Nigéria tinha destronado em Outubro Angola como maior produtor africano de petróleo, ao fim de sete meses de liderança, devido à diminuição, na altura, no espaço de um mês, de 165 mil barris de crude por dia na produção angolana.
O documento deste mês acrescenta que o acordo alcançado entre os países produtores de petróleo, para reduzir a produção e fazer aumentar os preços, vai obrigar Angola a cortar 78 mil barris de crude por dia a partir de 1 de Janeiro, para um limite de 1,673 milhões de barris diários.
A produção na Nigéria tem sido condicionada por ataques terroristas, grupos armados e instabilidade política interna, sobretudo no primeiro semestre, mas desde agosto que tem vindo progressivamente a aumentar.
Angola enfrenta desde final de 2014 uma profunda crise económica, financeira e cambial decorrente da forte quebra nas receitas petrolíferas. Em menos de dois anos, o país viu o barril exportado passar de mais de 100 dólares para vendas médias, no primeiro semestre deste ano, de 36 dólares por barril, segundo dados do Ministério das Finanças.
Segundo a mesma informação, o país produziu em média, no primeiro semestre do ano, 1,77 milhões de barris de crude por dia.
Recorde-se que 9 das 10 maiores empresas exportadoras de Angola são petrolíferas, com vendas no primeiro trimestre deste ano a somarem 297,8 mil milhões de kwanzas.
No primeiro trimestre de 2016 a única empresa a figurar entre as 10 maiores exportadores de Angola fora do sector petrolífero foi a estatal Sociedade de Comercialização de Diamantes de Angola (Sodiam), que vendeu ao exterior 31,6 mil milhões de kwanzas em pedras preciosas já lapidas.
Esta empresa, filial da Endiama, concessionária do Estado para o sector diamantífero e responsável pela comercialização dos diamantes angolanos, registou um aumento de 92% face ao volume exportado no primeiro trimestre de 2015, o único caso de crescimento entre as 10 maiores exportadoras nacionais, subindo ao segundo posto.
O primeiro lugar da lista é ocupado pela maior empresa do regime, também pública, a Sociedade Nacional de Combustíveis de Angola (Sonangol) EP, que exportou entre Janeiro e Março o equivalente a 125,9 mil milhões de kwanzas, uma quebra homóloga de 54% que reflecte a forte descida na cotação do preço de petróleo no mercado internacional nos primeiros três meses de 2016.

Corrupção? Que ideia!

Um político corrupto causa mais estragos para um povo do que uma bomba atómica. As suas actividades nefastas são mais silenciosas, não podem ser vistas a olho nu muitas vezes, mas os danos são mais severos no longo prazo.
Não é uma mera metáfora, basta olhar o caso do Japão que sofreu com 2 bombas atómicas na primeira metade do século XX, mas que em poucos anos conseguiu tornar-se e manter-se como um país desenvolvido e umas das principais potências económicas com alto nível de educação e desenvolvimento tecnológico.
Agora olhemos os países de África. Muitos deles possuem regiões que parecem viver ainda no século XIX. Esses países sofrem com as bombas atómicas diariamente e elas têm nome: corrupção. E Angola parece ser o país mais bombardeado do mundo actualmente e essas bombas têm um combustível que as move: o petróleo.
Praticamente toda a receita de Angola advém das actividades petrolíferas e todos sabem que a Sonangol tem privilégios de exploração e de parcerias na comercialização desse combustível fóssil. E todos também sabem que a Sonangol é a fonte de diversos esquemas de corrupção para financiar toda a alta cúpula política e económica do país e que não está nem um pouco preocupada com o bem-estar do povo angolano.
Mesmo com a guerra civil que durou décadas e ceifou a vida de milhares de cidadãos, se Angola tivesse uma sólida democracia com políticos realmente comprometidos com o desenvolvimento do país, a situação hoje seria bem diferente. Catorze anos após a guerra civil, o país ainda se encontra com índices alarmantes de pobreza, desnutrição, mortalidade infantil e analfabetismo. Em 14 anos muita coisa já era para ter mudado na prática se o dinheiro público não fosse desviado para alimentar ainda mais a riqueza de meia dúzia de pessoas.
A falta da democracia verdadeira, ou seja, do respeito pelas manifestações da população civil, do estímulo a uma imprensa livre e principalmente à liberdade de expressar opiniões políticas diversas, somada ao frágil sistema económico de Angola provoca efeitos muito negativos no país. Não dá pra chamar de democracia um país que tem um presidente há 37 anos seguidos, sem nunca ter sido nominalmente eleito, e que prende e espanca os cidadãos que fazem oposição política.
A isso chama-se ditadura, uma ditadura que eles insistem ter traços de democracia, mas que é uma ditadura mesmo assim. E também não dá para dizer que Angola tem uma sólida economia, quando o país depende em 97% do petróleo para gerar recursos financeiros, mas a indústria petrolífera só emprega cerca de 0,5% da população. A corrupção é quem faz a ponte entre esses dois elos: indústria petrolífera alimentando a desigualdade no país, beneficiando somente a elite política angolana. Cada recurso que deveria ser usado para a construção de escolas, hospitais e obras de infra-estrutura, mas que são desviados para os bolsos dos políticos e empresários, é uma bomba atómica.
A revelação milhões de documentos provando uma teia de corrupção e lavagem de dinheiro a nível global chocou o mundo. O alto esquema de lavagem de dinheiro ocasionando o enriquecimento ilícito de vários políticos e empresários por meio de ramos offshores (como a indústria petrolífera) só mostrou o quanto os bilionários deste planeta são gananciosos e fazem qualquer coisa para burlar a lei.

“Panamá Papers”… Luanda

Oescândalo que ficou conhecido como “Panamá Papers”, pois teve como peça-chave a empresa panamiana, Mossack Fonseca, teve a sua investigação conduzida ao longo de um ano pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (International Consortium of Investigative Journalists, ICIJ), pelo jornal alemão “Süddeutsche Zeitung” e por mais de uma centena de outros órgãos de comunicação social.
Dentre os nomes a serem divulgados de presidentes e ministros nas primeiras divulgações da investigação aparece somente um político dos países africanos de língua portuguesa. Alguém adivinha quem é? Se você pensou em José Maria Botelho de Vasconcelos, ministro do Petróleo de Angola, você acertou. E ele não foi apenas meramente citado não, na investigação o “rei do petróleo angolano” é destacado como um dos principais agentes no esquema de corrupção pelo cargo que ocupa e por sua vasta rede de influência no mundo petrolífero.
O facto é importante porque legitima o que vários jornalistas e activistas de Angola dizem há anos: o actual governo de José Eduardo dos Santos é altamente corrupto e utiliza a cadeia do petróleo para drenar recursos em benefício próprio. As investigações no país, como as dos jornalistas William Tonet e Rafael Marques, são tidas pelo governo como intrigas da oposição ou ilegítimas, mas uma investigação como a do “Panamá Papers”, revelando ao mundo o que verdadeiramente ocorre em Angola, corrobora maciçamente com o que os angolanos e observadores estrangeiros vem afirmando ao longo dos anos: o petróleo do país deixou de financiar a guerra civil para enriquecer uma nova elite corrupta.
E não é somente o “braço direito” do presidente Eduardo dos Santos que parece estar envolvido nas revelações do Panamá Papers, pois o Fundo Soberano de Angola (FSDEA) que é gerido pelo seu filho, José Filomeno de Sousa dos Santos, também está ligado à essa teia de corrupção global. O FDSEA, que tem as suas receitas provenientes da Sonangol (aí está novamente a indústria petrolífera), já era alvo de inúmeras suspeitas de lavagem de dinheiro, nepotismo e irregularidades financeiras.
Nas investigações divulgadas há um claro indício de lavagem de dinheiro, onde milhões e milhões de dólares foram investidos no Banco Kwanza sem praticamente nenhum sistema de transparência ou auditoria, e essas quantias foram repassadas a destinatários até então desconhecidos.
Até quando essa situação vai permanecer? É uma pergunta de extrema importância que os cidadãos angolanos devem ter em mente, pois as bombas atómicas vão continuar caindo até que algo seja feito. O fortalecimento das instituições públicas e dos preceitos da democracia é um passo importante. Já que a elite político e económica de Angola não se preocupa com o povo, parece que vamos ter um longo caminho até que a situação acabe.

LUANDA: Tribunal Supremo Impotente e a Impunidade de José Leitão

TRIBUNAL SUPREMO IMPOTENTE E A IMPUNIDADE DO LEITÃO


Faz amanhã um ano que o Tribunal Supremo deliberou contra uma série de altas figuras políticas, mas sem quaisquer consequências práticas para os prevaricadores, vingando a impunidade.
A 17 de Dezembro de 2015, foi emitido um acórdão do Tribunal Supremo que decidia um processo judicial de Pedro Januário Macamba contra o Grupo GEMA – Empresa de Participações Financeiras e Empreendimentos, S.A.
O Grupo Gema é um vasto conglomerado empresarial, parceiro da multinacional SABMiller na Coca-Cola Luanda Bottling. É accionista da Ucerba, que detém metade das acções das maiores cervejeiras do país, a Cuca, a Nocal e a Eka. Através da sua subsidiária Geminas, faz parte do consórcio de exploração do Bloco 18/06, operado pela multinacional brasileira Petrobrás, com a sociedade sino-angolana Sonangol Sinopec International (SSI) e da Sonangol. No sector da construção civil, associou-se a uma das maiores empresas portuguesas do ramo, a Edifer, na EdiferAngola, e lidera o Empreendimento Comandante Gika, o maior investimento imobiliário no sector privado. A sua subsidiária do ramo automóvel, a Vauco, representa a General Motors em Angola e é assistente oficial da Peugeot e da japonesa Honda.
No processo judicial aqui em causa, Pedro Januário Macamba alegava que a sua assinatura contida numa acta do Grupo GEMA – Empresa de Participações Financeiras e Empreendimentos S.A. era falsa e que não outorgara quaisquer poderes a José Leitão, presidente do conselho de administração do Grupo GEMA e antigo chefe da Casa Civil de José Eduardo dos Santos.
A primeira decisão do tribunal comum declarou que a assinatura era falsa, confirmando a acusação de Pedro Macamba. O Grupo Gema recorreu para o Tribunal Supremo.
E foi nesse recurso que veio ao de cima a situação de absurda ilegalidade em que o Grupo tem actuado ao longo dos anos.
O Grupo Gema confessa no seu recurso, a folhas 67, que os seus verdadeiros sócios são:
– José Leitão, que ocupou sucessivamente, de 1988 a 2003, os cargos de secretário do Conselho de Ministros, director do Gabinete do PR (ministro junto da Presidência), e chefe da Casa Civil do PR (ministro junto da Presidência).
– António Pitra Neto, ministro da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social, tendo ocupado outros cargos relevantes.
– Carlos Feijó, secretário do Conselho de Ministros à data da fundação do grupo; exerceu, a posteriori, o cargo de assessor para os Assuntos Regionais e Locais de José Eduardo dos Santos e de chefe da Casa Civil do PR.
– António Gomes Furtado detém vários cargos, como governador do Banco Nacional de Angola (BNA), presidente do conselho de auditoria do BNA, assessor do primeiro-ministro para os Assuntos Económicos.
– Generoso de Almeida era, à data da fundação do Grupo Gema, o governador do Banco Nacional de Angola. Depois dirigiu vários bancos estatais.
O conselho de administração do Grupo Gema afirmava despudoradamente que os nomes nas suas actas e escrituras só lá apareciam porque “os reais accionistas estavam ligados à governação do país ou desempenhavam altos cargos partidários, situação que era incompatível com qualquer tipo de actividade empresarial” (sublinhado nosso). Mais, acrescentavam que era esse o motivo por que as deliberações tomadas pelos verdadeiros accionistas tinham de ser posteriormente assinadas por meros representantes — como Pedro Januário —, sendo pagos para isso.
Muito sucintamente, foi esta a argumentação factual. Curiosamente, o Tribunal Supremo não se deixou convencer, tendo confirmado a decisão do Tribunal de primeira instância.
Apesar de ter confirmado a falsidade da assinatura de Pedro Januário mediante a qual se atribuíam poderes a José Leitão, o Tribunal Supremo não deu os dois passos seguintes a que era legalmente obrigado: a extracção de certidão do processo e o seu envio ao procurador-geral da República, para investigação do crime de falsidade, talvez praticado por José Leitão ou alguém a seu mando. Competiria depois ao Ministério Público e ao Serviço de Investigação Criminal (SIC) investigar.
Mas há ainda uma outra participação que o Tribunal Supremo deveria ter feito: a dos factos indiciadores de fraude à lei que o próprio conselho de administração do Grupo Gema confessou, ao explicar a sua verdadeira constituição e modo de funcionamento.
A falsificação
Do processo do Tribunal Supremo resulta que a assinatura de Pedro Januário Mucamba foi falsificada numa acta da sociedade, posteriormente reconhecida notarialmente. Essa acta beneficiava os “reais sócios”. Temos aqui uma falsificação cujos beneficiários são os cincos reais sócios, em especial José Leitão, os quais teriam portanto motivo para falsificar a assinatura de Pedro Januário Mucamba. Havendo indício da prática de um crime de falsificação, confirmada pelo Tribunal Supremo, é imperativa a investigação pelo Ministério Público.
A Associação de Malfeitores
O Grupo Gema foi constituído por várias pessoas que não podiam constituí-lo para realizar actos que não podiam realizar. Em concreto, foi constituído por políticos da alta hierarquia angolana, com o propósito de realizar negócios com o Governo de que também faziam parte.
Tendo plena consciência da ilegalidade dos seus actos, os políticos socorreram-se de testas-de-ferro/homens de palha, os quais eram pagos para assumirem formalmente as funções de donos/ sócios do Grupo.
Os factos confessados expressamente pelos cincos “reais sócios” constituem uma fraude à lei. Temos vários detentores de postos governativos que fundam secretamente uma empresa quando não o podem fazer, e que poderão fazer negócios consigo mesmos, violando a lei e actuando em permanente conflito de interesses.
Perante estes dados, não restam dúvidas de que há indícios de ter sido criada uma associação para cometer crimes, facto comprovado pela necessidade que os “associados” sentiram de esconder as suas identidades. Estaremos, portanto, perante o eventual cometimento do crime previsto e punido pelo artigo 263.º do Código Penal — Associação de malfeitores.
Além deste crime genérico indiciado, em relação a negócios e a contratos concretos, atendendo às datas em que as referidas pessoas exerceram funções políticas, a maioria fica sob a alçada da então Lei dos Crimes Cometidos por Titulares de Cargos de Responsabilidade, da Lei das Infracções contra a Economia; depois de 2003, sob a alçada das disposições relevantes do Código Penal; e após 2010, para quem for o caso, também sob a alçada das regras da Lei da Probidade Pública. Os crimes indiciados serão os de corrupção e peculato.
Ao menos quanto ao crime de associação de malfeitores e falsificação existem indícios directos e indirectos no Processo n.º 1423/2014, e o estrito conhecimento de tais factos deveria ter levado o Tribunal Supremo a comunicá-los ao Ministério Público, para posterior investigação — e confirmação ou não — da prática desses crimes.
É dever de qualquer agente público, muito mais de um magistrado, dar conhecimento da eventual prática de crimes ao Ministério Público.
Quanto aos prevaricadores que se acoitam no Governo para cometer crimes impunemente, é tempo de os levar a tribunal, como no Brasil.