Derrota eleitoral precipita substituição do secretário-geral do Partido Socialista francês
Mudanças foram orquestradas pelo Presidente François Hollande e o primeiro-ministro Manuel Valls. Harlem Désir sai e o cargo é entregue ao seu rival político Jean-Christophe Cambadélis.
A imprensa francesa designou a operação como um blitzkrieg: a indicação de Harlem Désir para a secretaria de Estado dos Assuntos Europeus pelo novo primeiro-ministro, Manuel Valls, resolveu do dia para a noite a rivalidade e luta intestina pelo poder dentro do Partido Socialista, que se prolongava há mais de dois anos.Com a ida de Désir para o Governo, a direcção política do PS ficou entregue de forma interina ao seu rival político Jean-Christophe Cambadélis, deputado eleito por Paris que “cobiçava” o cargo de primeiro-secretário dos socialistas desde 2012. A mudança foi precipitada pela derrota dos socialistas nas eleições municipais do final de Março e a passagem de testemunho foi já marcada para o conselho nacional do próximo dia 15.
Valls agiu rapidamente junto do Presidente François Hollande, para apressar o processo de substituição de Harlem Désir na liderança do PS: segundo relata oLe Monde, uma espécie de gabinete de crise, com todos os “pesos pesados” do partido, foi convocado para encontrar uma fórmula digna para o afastamento do secretário-geral, que depois da débacle eleitoral, reunia poucos apoios e simpatias dentro do aparelho.
A escolha de Cambadélis terá sido concertada entre o Presidente e o primeiro-ministro: estatutariamente, a direcção deveria ficar nas mãos do número dois do PS, Guillaume Bachelay, que integra o grupo de Laurent Fabius. Segundo especulam os comentadores políticos franceses, a escolha de Jean-Christophe Cambadélis é uma piscadela de olho à facção de Martine Aubry, a popular presidente da câmara de Lille que se afastou da liderança do PS depois de ter perdido as eleições primárias do partido contra François Hollande.
O deputado de 62 anos, frequentemente designado apenas como Camba, não escondia a sua ambição de ocupar o gabinete principal na Rue de Solférino, ao qual teria certamente chegado se a promissora carreira política de Dominique Strauss-Kahn não tivesse explodido com a prisão por violação de uma camareira num hotel de Nova Iorque. Mesmo assim, apresentou-se como candidato no congresso de 2012, em Toulouse – curiosamente, Manuel Valls foi um dos dirigentes que bloqueou a sua escolha, em favor de Harlem Désir.
No entanto, o processo de substituição de Désir está a ser contestado pela ala esquerda do partido, que sem pôr em causa as capacidades políticas de Jean-Christophe Cambadélis, critica os métodos agressivos de Manuel Valls, acusado de um ter preparado um “golpe de Estado numa mesa da cozinha”. “Os seus métodos são inaceitáveis para todos os militantes que prezam o funcionamento democrático do PS”, disse Marie-Noëlle Lienemann ao Le Monde.
Outros elementos do partido – incluindo aqueles que reclamavam uma inflexão política da linha seguida por Harlem Désir, que nunca foi capaz de se impor como líder – também revelaram um certo desconforto pelas mudanças cozinhadas por Hollande e Manuel Valls nos bastidores, e exigiram a convocação de um congresso extraordinário para consultar as bases e “legalizar” as mudanças na hierarquia socialista.
A “promoção” de Harlem Désir ao Executivo levanta ainda outro problema ao PS, que se vê forçado a refazer a lista de candidatos nas eleições europeias de 25 de Maio, que era encabeçada pelo secretário-geral do partido.